postado em 30/03/2015 08:02
Em meio à pior crise hídrica em mais de 80 anos em São Paulo, o documentário A lei da água ; Novo Código Florestal chega aos cinemas para enriquecer o debate. Dirigido por André D;Elia (de Belo Monte: Anúncio de uma guerra) e com produção executiva de Fernando Meirelles, o filme destrincha os pontos mais polêmicos do Código Florestal ; como a anistia de 29 milhões de hectares desmatados ilegalmente no país, a diminuição das áreas de proteção nas encostas íngremes e topos de morros, manguezais, matas ciliares e nascentes. Graças ao financiamento do próprio público, o filme será exibido em sessão única hoje em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Curitiba, Porto Alegre e Belo Horizonte.
[SAIBAMAIS];Começamos a fazer uma pesquisa segmentada por veículos ; mídia impressa, internet, televisão. Montando a estrutura do roteiro, vi que a água permeava todo o assunto, principalmente se levar em consideração o foco do filme, que é levantar a questão econômica;, destaca D;Elia.
O longa dá voz à comunidade científica, deixada de lado no momento de modificar o Código Florestal. ;No final da votação do código, os ruralistas conseguiram vender a ideia de que houve um equilíbrio entre a vontade deles e dos ambientalistas;, lembra Fernando Meirelles. ;Não houve equilíbrio, foi modéstia deles: a bancada ruralista venceu por 7 a 1. Eles saíram felizes e o Brasil saiu perdendo.;
Outro ponto enfatizado é o fato de que a proteção do meio ambiente não prejudica a produção agrícola. Pelo contrário, como lembra Antônio Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o maior insumo da agricultura é a água, que depende da preservação das florestas. ;O agricultor que há anos viu seus riachos secarem, que está endividado, já entende que deve sim preservar água. Muitos proprietários estão restaurando suas nascentes porque acham que água é importante, não porque a lei manda;, afirma D;Elia.
Marcas da água
Dirigido pela documentarista Jennifer Baichwal e pelo fotógrafo Edward Burtynsky, a produção canadense Marcas da água, que estreou nessa semana nos cinemas, desvia-se do discurso político direto e aborda a água como elemento plástico: uma força épica que nos molda e que também é moldada pelo homem. A proposta se evidencia já nas cenas iniciais do filme: a tela é invadida pela água, representada como um turbilhão abstrato de energia, que logo materializa-se em veias pela terra. A inquietude dessas imagens contrasta com a monotonia das paisagens secas, minimalistas.
A estética da água é explorada ao longo do filme por meio das impressões que ela deixa nas pessoas e nas superfícies. Para isso, os diretores viajaram por diferentes partes do mundo: desde o rio Ganges na Índia, onde milhões de hindus se banham em um ritual religioso, fazendas de alga marinha na China, até o leito ressecado do lago Owens, em Los Angeles, extinto por conta da construção de um aqueduto no início do século 20, e que hoje é fonte de poluição por poeira.
Durante a produção, os cineastas visitaram 10 países e reuniram cerca de 200 horas de gravações. A edição do material levou quase um ano. As incríveis imagens aéreas foram feitas de aviões, helicópteros e gruas.
Três perguntas // Fernando Meirelles
Qual o diferencial da estratégia de distribuição por financiamento coletivo para um filme com essa temática?
Como este é um filme de interesse específico, se simplesmente entrasse em cartaz provavelmente pouca gente iria assistir. No sistema de crowdfunding, a pessoa recebe informações sobre o filme e se ficar interessada compra seu ingresso antecipadamente. Se até o dia da sessão houver um público mínimo, a sessão acontece. Se não houver, ela é cancelada e o dinheiro não é cobrado. Desta maneira podemos ir atrás do público interessado. Para o cinema é uma garantia de que a sessão terá público. Já fechamos sessões em várias cidades. Em São Paulo, estamos abrindo a terceira.
De que maneira o cinema pode influenciar o debate político?
A influência do cinema nas nossas convicções políticas nem sempre é tangível, mas neste caso é. Este filme foi feito justamente com o propósito de melhorar a qualidade do debate político nesta área. Sabemos que a grande maioria dos deputados e senadores que aprovaram o novo Código Florestal desconheciam o lado científico do que estavam votando, apenas acompanharam suas bancadas atendendo o comando dos ruralistas. Mesmos os líderes nesta matéria, como o senador Moreira Mendes (PSD-RO), deixam claro no filme que não entendem nada sobre a importância das florestas para um equilíbrio ambiental, o que acaba afetando as suas próprias lavouras. Prefiro atribuir suas falas no filme à ignorância neste assunto do que achar que eram apenas a expressão de cinismo.
Como foi a sessão no Congresso?
O filme teve uma ótima resposta, muitos parlamentares pediram para fazer sessões nas assembleias de seus estados e já está sendo marcado no Amazonas, Pará, Alagoas, Rio Grande do Sul. Na Bahia já aconteceu. Fora isso, o filme tem sido exibido em escolas, cooperativas e em eventos ligados à agricultura. O número de pedidos de exibições com debate após a sessão está bem maior do que o que esperávamos e do que estamos conseguindo atender. Isso é boa notícia.
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