postado em 18/06/2015 07:34
Eventualmente, o Fundo de Apoio à Cultura (FAC) provoca acirrados debates entre os artistas da cidade e o poder público. Os exemplos são infindáveis e históricos. O mais recente deles envolve o deputado distrital Bispo Renato (PR). Por meio de um projeto de lei complementar, o deputado propõe que 15% do fundo sejam utilizados especificamente para favorecer projetos cristãos, o que provocou uma reação imediata por parte da classe artística, que foi recebida em uma audiência pública na Câmara Legislativa para opinar sobre o assunto.No fim do mandato do ex-governador Agnelo Queiroz, em dezembro de 2014, alguns artistas chegaram a se acorrentar no Palácio do Buriti para garantir que pagamentos devidos fossem reconhecidos e projetos aprovados fossem empenhados. No início deste ano, o Governo do Distrito Federal fez uso do fundo para sanar dívidas com outras áreas, provocando nova indignação.
Atualmente, os valores do FAC relacionados ao ano de 2014 estão sendo gradativamente honrados. "Tudo segue conforme o calendário", comenta Guilherme Reis, secretário de Cultura do DF. Ele aproveita para destacar que "todos os segmentos estão sendo recebidos e ouvidos pela Secretaria". De acordo com o secretário, o edital de 2015, programado para julho, "não avançará como deveria, mas já terá relevante progresso". Nos próximos dias, Guilherme Reis deverá anunciar novas medidas na área cultural.
Mas, afinal, para que serve o fundo? A quem ele se dirige? O diretor de teatro Jonathan Andrade é categórico: "A sociedade precisa participar desse debate. É ela a mais interessada. O FAC nos permite promover arte justamente para o público, para a plateia. O FAC pertence, antes de tudo e de todos, à comunidade, ao brasiliense."
//Artigo
Cultura em processo
TT Catalão*
O FAC - Fundo de Apoio a Cultura se apresenta como a principal criação coletiva entre Estado e sociedade no caminho das políticas públicas de cultura em Brasília. Seria a principal ponte de acesso a recursos sem padrinhos (sob a máxima transparência de critérios); fortaleceria expressões e linguagens que não contam com a "estratégia de marketing" (e seus valores) de empresas; criaria bases para estruturar a sustentabilidade de ações que, em tese, diminuiria a dependência de grupos e/ou pessoas e fortaleceria um circuito de mostras, trocas, programas continuados de formação e compartilhamentos locais, regionais, nacionais e internacionais.
Como está em processo permanente de aperfeiçoamento (com inúmeras etapas de lutas para consolidá-lo desde os anos 80) o FAC não está pronto e nunca ficará. Seu modelo já foi bem mais tímido para absorver expressões e linguagens. Estive desde o início, desde a criação do Conselho de Cultura do DF (que foi fundado para políticas normativas e marcos conceituais capazes de criar marcos legais e legítimos - debatidos com a comunidade, não só com as corporações de ofício).
Nesse longo caminho de ajustes, até os itens da abrangência estética do FAC e sua regulamentação sofreram mudanças na absorção de, digamos, outras linguagens como a cultura popular e os que atuam com expressões mais experimentais. Foram necessárias duas audiências públicas (uma na salinha Alberto Nepomuceno do Teatro Nacional) outra na Câmara Legislativa DF para ampliarmos as possibilidades de participação dessas áreas que, todas reunidas, fossem além das artes com diálogos ativos com a educação.
Essa seria a perspectiva a não ser perdida no aperfeiçoamento do FAC como uma das ferramentas na política pública de cultura (não é, só ele, "a" ferramenta): aprimorar radicalmente a transparência dos critérios; garantir seus recursos como verba "carimbada"; ampliar a participação da sociedade na elaboração dos novos editais cada vez mais simples e menos enigmático (só para iniciados); fortalecer ações para incentivar trocas em rede e circuitos sem perder nunca a dimensão estética das linguagens, o conjunto da diversidade extraordinária de Brasília e as narrativas simbólicas da cultura em seu plano imaterial. É o imaterial a alma de toda e qualquer coisa, para que a idolatria da coisa, em seu domínio de eventos, não esgote os escassos recursos sem considerar que vivemos tempos de uma agenda permanente para saber o que é ou não seja estruturante - e essa tarefa é imensa demais para ficar só como agenda de Estado ou de Governo: tem que abrir a roda para girar o fluxo de um organismo com circulação oxigenada dentro da máquina e fora do corpo, na pele de quem faz, realmente, a Cultura: nós!
*jornalista, poeta, ativista cultural, com passagens na gestão pública
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