postado em 16/07/2015 07:30
O diagnóstico se repete: não há dinheiro. A frase se aplica a todos os setores do Governo Distrito Federal e com a área cultural não se difere. O débito e as dívidas herdadas da administração anterior parecem impedir, até o presente momento, ações maiores que possam, de fato, provocar repercussões positivas junto à sociedade ou à classe artística. Esse é o discurso reinante.
"Não há grana este ano. Optamos em fazer uso do curto orçamento, que nem de longe reflete a necessidade da secretaria, para sanar dívidas", afirma Guilherme Reis, secretário de Cultura do DF. Diante de um panorama financeiro crítico, surge a expectativa por intervenções e políticas culturais que possam ser implementadas sem depender diretamente de disponibilidade de caixa. Uma premissa adotada pela secretaria, segundo Guilherme: "Fizemos o aniversário de Brasília, com Hamilton de Holanda, Rosa Passos e Ellen Oléria, sem recorrer a gastos excessivos. Realizamos um encontro com galeristas de renome nacional, lançamos o projeto Asas, que carrega cultura à penitenciária feminina, levamos 7 mil alunos para assistir ao Bolshoi, a Orquestra Sinfônica está nas ruas, tocando por todo o DF. Tudo isso a um custo próximo ao zero", exemplifica.
No que diz respeito ao Fundo de Apoio à Cultura (FAC), o secretário se orgulha ao comentar dois casos recentes, que foram beneficiados pelo fundo: "A participação vitoriosa do violonista e guitarrista Pedro Martins no Festival de Montreux e a seleção de dois longas-metragens brasilienses para integrar o Festival de Cinema de Gramado." Mas será que isso basta para a capital do país?
Contrates
"As perspectivas são frustrantes. A cidade está culturalmente sucateada, falida. Infelizmente, os primeiros cortes orçamentários públicos são em cultura, saúde, lazer e esporte, o que sabemos, por meio de exemplos estrangeiros, serem justamente os pilares de uma possível evolução", critica, sem medir palavras, o ator e cenógrafo Roustang Carrilho. Na capital da República, a cultura ainda hoje é vista como algo supérfluo, como acrescenta Leonardo Barreto, doutor em ciência política pela Universidade de Brasília (UnB), em entrevista ao Correio (leia abaixo).
A atriz Karinne Ribeiro não transparece qualquer satisfação com a gestão da Secretaria de Cultura. "Tivemos projeto aprovado pela LIC (Lei de Incentivo à Cultura), mas, a cada instante, a secretaria nos impõe uma série de ressalvas. Uma burocratização sem fim. Nada acaba saindo do papel", conta. A artista diz que a classe "está exausta, em crise" e exproba a tentativa de diálogo da entidade com o meio artístico e com a cidade. "Eles se dizem abertos à conversa, o que soa produtivo, mas me parece uma fachada para dar a entender que esteja tudo bem. Mas não está tudo bem."
Ela se refere, em parte, ao projeto Diálogos Culturais, por meio do qual a secretaria visita as principais regiões administrativas na expectativa de ouvir as demandas e anseios de cada localidade. Uma iniciativa aprovada pelo diretor e ator Marcelo Nemmevê: "Apesar dos tempos áridos, percebo uma vontade da secretaria em nos escutar, o que nunca aconteceu no governo anterior. Eu prefiro manter uma postura positiva". Opinião partilhada pelo músico Fábio Pedroza, baixista da banda Móveis Coloniais de Acaju, que se revela otimista em relação ao período por vir. "A ideia de termos um artista (Guilherme Reis), uma pessoa que já esteve do lado de cá, à frente da secretaria, nos traz uma segurança. O momento é de colocar a casa em ordem", opina. A questão, no entanto, permanece: quanto tempo levará essa faxina geral?
Três perguntas/Leonardo Barreto (doutor em ciência política pela UnB)
Se pudesse colocar em algumas palavras, como definiria política cultural?
Política cultural é uma área de políticas públicas cuja relevância e papel ainda são pouco consolidados no Brasil. De uma maneira geral, ela é vista com um "bem supérfluo", ou seja, quase sempre está lá atrás na fila quando se trata de receber recursos, pois compete em desigualdade de condições com outros campos considerados "essenciais", tais como política social, urbana ou militar. A prova é que em vários estados e municípios é muito comum encontrar a cultura como subárea de outras pastas, como esporte ou educação, por exemplo.
É legítimo, historicamente, apontarmos a política cultural como coadjuvante no panorama político de Brasília?
Historicamente, é possível afirmar que a cultura tem sido um "patinho feio" no rol de áreas de políticas públicas do DF. O primeiro problema é de cunho estrutural e está associado a essa visão da cultura como algo frívolo, se refletindo na baixa dotação orçamentária da pasta.
Ou seja, a cultura ainda não é tratada como prioridade...
A cultura não foi tratada com relevância estratégica pelos governos passados e, como políticas públicas são processos cumulativos, o resultado é um cenário muito difícil para o atual governador (veja a enorme quantidade de espaços públicos fechados sem previsão de reabertura, como o Teatro Nacional). Reverter esse cenário em um ambiente de ajuste fiscal é ainda mais difícil, tendo em vista nossa visão histórica de tratá-la como "bem supérfluo".
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