Diário de Pernambuco
postado em 14/08/2015 16:15
Caboclos de lança em luto: morre o presidente do mais antigo maracatu do país, o Cambinda Brasileira. José Manoel da Silva, o Mestre Zé do Carro, faleceu na madrugada desta sexta-feira (14/8), aos 63 anos, em Nazaré da Mata, a 65km do Recife. Zé do Carro sofria de problemas renais há um mês, tempo em que chegou a ficar internado no Hospital das Clínicas, no Recife, para tratamento. O último desejo de Zé do Carro foi atendido: ele queria que o velório fosse realizado na sede do maracatu que presidia desde 1991, no bairro do Sertãozinho, em Nazaré. O sepultamento está marcado para as 16h, no cemitério público do município, conhecido como a Terra do Maracatu, por ser berço de 20 grupos.
Na página oficial do Cambinda no Facebook, o sinal de luto e o aviso: "Comunicamos oficialmente o falecimento do nosso presidente e mestre caboclo, Zé de Carro. Homem forte e influente em nossa cultura, o céu hoje recebe mais uma estrela. Pedimos a todos oração, o velório será logo mais na casa do Maracatu Cambinda Brasileira, próxima à quadra de Bernardo".
O cineasta Tiago Melo (Azougue), que se aproximou de Zé do Carro ao escalá-lo apra um filme sobre o Cambinda, rodado no ano passado, conta que o mestre recebeu alta médica há pouco mais de uma semana. "Ele voltou a Nazaré e na terça-feira passada foi internado novamente", lembra. O cantor Siba, que já morou em Nazaré da Mata para estudar o maracatu rural, expressou pesar no Facebook: "Lamentamos a perda de uma pessoa importantíssima para a tradição do Maracatu de Baque Solto em Pernambuco.Vai em Paz, Zé do Carro". O cineasta Nilton Pereira também escreveu tributo: "RIP Zé de Carro. O grande general do Maracatu Cambinda Brasileira subiu e se encantou. A Zona da Mata Norte perde um dos maiores comandantes da nação maracatuzeira. Que descanse em paz e ilumine o caminho de seus caboclos guerreiros".
Sabedoria e criatividade
Nascido no engenho Gambá, em Tracunhaém, o Mestre Zé de Carro não sabia ler. Assinava o seu nome e só. Durante anos trabalhou nos canaviais cortando cana. Poderia ser apontado como homem ignorante, rústico. Muito pelo contrário. Repleto de sabedoria e uma criatividade sem igual para compor versos, Zé de Carro também surpreendia pela habilidade de desenhar e ajudar na confecção das tradicionais roupas dos caboclos de lança.
"Tem que cortar o tecido, fazer os riscos, os desenhos e colocar as lantejoulas uma a uma. Isso com a paciência e a rapidez que a prática do tempo dá para a gente", explicou em entrevista ao Diario, em 2011. Zé do Carro, mestre do carnaval desde 1969, deixa a esposa e mais três filhos, além de uma nação de maracatu com 180 integrantes, de luto. Ele herdou a presidência do Cambinda do pai, João do Padre. "Fiz um trato com o dono, que levaria o maracatu até a morte. Antes dele morrer, ele me confiou essa responsabilidade", revelou em entrevista à Fundarpe, em 2012.
Em nota divulgada no Facebook, a Prefeitura de Nazaré da Mata lamentou o falecimento do caboclo. "O Maracatu perde hoje um apaixonado por nossa cultura, talentosíssimo, uma referencia para o Baque Solto, um ícone de nossa Cidade. Um homem dedicado ao Maracatu, que com sua gola colorida e chapéu amarelo, realizou apresentações extraordinárias que permanecem na memoria de todos nós."