Diversão e Arte

Artistas das cidades do DF buscam espaços públicos alternativos

Bandas e músicos tentam movimentar a cena musical em volta do Plano Piloto

postado em 02/09/2015 07:30

Darshan

Em uma cena tão ou mais movimentada que o Plano Piloto, artistas e produtores das cidades do Distrito Federal e do Entorno buscam espaços públicos para mostrar o trabalho, uma vez que casas de shows não suprem a demanda tanto dos músicos como do público ; numa tentativa de movimentar a cultura das próprias cidades. Cada vez mais projetos surgem como alternativas de incentivo às pessoas ou bandas que fazem trabalhos autorais. Iniciativas como o Isso aqui é DF, F.O.D.A. Pública (Festa de Ocupação Dinâmica de Área Pública), Vai tomar no cover, Taguatinga tem concerto, entre outros, buscam agitar e mostrar a força dos artistas fora da região central da capital do país.

Ítalo Oliveira, integrante da banda Bife a Bolonhesa e do movimento Isso aqui é DF, explica que a falta de uma mobilidade maior do público de Brasília para as cidades-satélites, a fim de estimular um intercâmbio de experiências entre plateia e artistas, é uma das principais dificuldades para a cena fora do Plano Piloto. ;O pessoal não desce para ver shows longe do centro. Sentimos falta desse movimento por aqui: nós trazemos bandas para cá, mas o inverso não acontece. Os convites para tocar no Plano são bem escassos.; Itin, como é conhecido, afirma que o Isso aqui é DF surgiu, a princípio, apenas para divulgar o trabalho de artistas e eventos locais. Atualmente, o projeto possui uma extensa bagagem de eventos realizados, com inúmeras apresentações de bandas de todo o Distrito Federal e de outros estados.

Para Nina Puglia, do F.O.D.A. Pública, não adianta colocar a culpa só em bares e casas de show. ;O público precisa se interessar em conhecer produções novas feitas na cidade. Soma-se a isso uma população conservadora, que muitas vezes tenta impedir eventos culturais e/ou chama a polícia para fechar estabelecimentos onde acontece música ao vivo. É compreensível que qualquer pessoa queira desfrutar de paz e tranquilidade em casa, mas outras querem se encontram e se divertem ouvindo uma boa música;, explica, ao destacar a necessidade de bom senso mútuo.

Bife a Bolonhesa

Invisíveis
Além disso, há a chamada ;invisibilidade; dos grupos dessas regiões para o público do Plano Piloto. ;Os motivos para isso são os mais diversos, desde a falta de habilidade para se autodivulgar, até a falta de apoio em termos de políticas públicas, passando pela falta de dinheiro, de lugar para tocar, etc;, explica Nina. ;O público do Plano Piloto vai aos eventos musicais com um intuito maior de ver e ser visto do que de conhecer bandas novas. O das outras cidades se envolve mais, vibra mais e é mais aberto a novidades e a performances mais ousadas;, acrescenta.

Oliver Alexandre, da banda Darshan, defende uma ;reeducação; do público, que ainda não valoriza a música local e autoral. ;Casas podem surgir em peso, mas, se não houver uma reeducação cultural, não haverá público; logo, não haverá oportunidades, pois as casas precisam obter renda, que não conseguimos proporcionar sem tocar os tão adorados covers.;

A adoção de uma atitude segregacionista, na qual grupos do Plano e de outras áreas não se misturam, também é apontada como uma das dificuldades para o cenário musical das regiões fora da capital. ;As bandas do DF têm que parar com esses discursos separatistas, focados na condição social de cada um. Muitas vezes as bandas que tocam no Plano são as que participam mais dos eventos maiores;, conta Oliver.

The Egoraptors

Ocupar a cidade
Uma das alternativas das bandas fora do Plano Piloto para conquistarem o público e ganharem mais repercussão é tocar em eventos criados para fomentar a cena musical da cidade ou mesmo na rua. Um deles é o Vai tomar no cover, que surgiu da escassez de locais para as apresentações.

;A cena autoral deu uma morrida nos últimos tempos, tanto no Plano como fora. A gente não conseguia tocar em lugar nenhum, então surgiu essa ideia de pegar um gerador e ir tocar na rua. No início, achei que não ia dar certo, que a polícia ia bater na gente;, conta, entre risos, Tynkato Israel Lara, integrante das bandas Lista de Lily e The Egoraptors. ;Mas existe uma lei que permite que você faça intervenções nas ruas, então começamos a comparecer a eventos e tocar nossa música como forma de intervenção.;

;A principal dificuldade na área de projetos é, sem dúvida, a burocracia para conseguir alvarás e autorizações. O jeito é se utilizar da lei de ocupação de espaço público, assim como o F.O.D.A. Pública faz, que é uma iniciativa de levar cultura para espaços públicos do DF;, conta Gabriela Ilha, da banda Vintage Vantage. ;A abertura de casa de shows não é suficiente, a preferência desses espaços mudou. As bandas têm se motivado muito mais em fazer e produzir eventos abertos, ao ar livre e gratuitos;, comenta.

Explorar os espaços culturais de outras cidades e ir sem preconceito até eles também é uma das alternativas para a valorização dos artistas locais. ;Falta ousadia mesmo, uma caretice total não ter a atitude de conhecer outros espaços e ficar na mesmice, limitados a uma programação a partir de nomes ;reconhecidos;. Taguatinga e Ceilândia têm eventos, como o Taguatinga tem Concerto (no Teatro de Arena do Taguaparque) ou na Casa do Cantador (no P Sul) com o projeto Aqui tem da turma do Clube do Som, que são espaços fantásticos com uma programação superbacana, mas vemos um público ainda tímido a prestigiar;, afirma César de Paula, produtor e músico, um dos responsáveis pelo evento Taguatinga tem concerto.

Bandas pra conhecer e ouvir

Darshan (Sobradinho)
The EgoRaptors (Taguatinga)
Vintage Vantage (Ceilândia)
Plus Ultra (Taguatinga)
Besouro do rabo branco (Taguatinga)
DNP (Ceilândia)
Distintos filhos (Taguatinga)
Bife à bolonhesa (Taguatinga)
Vênus e as máquinas (Taguatinga)
Valdez (Taguatinga)
Hard drugs society (Taguatinga)


César de Paula

Cinco perguntas para César de Paula, produtor do Taguatinga tem concerto

Como enxerga as diferenças na cena musical no Plano Piloto e nas outras cidades? Acredita que o cenário seja mais vibrante fora da região central?
Acredito que Brasília e todo Distrito Federal têm uma produção vibrante, com suas particularidades, mas muito criativa e ousada, muito além do prestígio que o público tem conferido ao que fazemos na cidade. Mas é fato, no entanto, que nas chamadas ;cidades-satélites;, periferia ao Plano Piloto, temos uma produção hoje muito mais amadurecida e voltada para a realidade local, que têm consciência de seu protagonismo, que não precisa ;pedir a benção; pra ninguém, que não deixa a desejar na qualidade e na proposta artística. Não sei se seria mais vibrante, não gosto dessa ideia de desagregar quando podemos somar.

Quais são as principais dificuldades para emplacar projetos nos espaços destinados a música?

A cena cultural vive longe dos holofotes do centro, mas é importante que haja um intercâmbio, não é pra dividir, não vejo que tenha que haver uma competição, ao contrário, todo mundo ganha quando prestigiamos o trabalho dos artistas, seja na periferia, seja no Plano Piloto. Acredito muito na democratização dos editais. O Estado não tem que gerir nem direcionar, mas permitir que a verba pública destinada à cultura priorize os projetos realizados por pequenos e médios produtores, por artistas independentes.

Algumas bandas dizem que o público parece ser mais fiel, que compram mais a ideia de apoiar a cena musical/cultural nas cidades-satélites. Qual a sua visão a respeito disso?
Parece-me mais fiel, mas ainda segmentado. Prestigiam porque se habituaram a frequentar tal espaço. Me pergunto se não seria o caso de ousar mais, de fazer um intercâmbio e conhecer outros projetos, outros sons, outras propostas. Tenho a impressão que as pessoas fazem mais uma competição do que uma irmandade. Isso é um erro, todo mundo perde assim, quando na verdade agregar faria com que todos ganhassem, o público, o artista, o produtor, enfim, a cidade como um todo.

Existe um intercâmbio de experiências entre as bandas que tem a origem e a atuação limitada ao Plano e com os grupos das cidades-satélite? Como é a relação entre esses dois grupos?
Pra falar a verdade creio que Brasília e o DF como um todo tem aquilo que já mencionei, quer dizer, competimos mais do que agregamos. Mas vejo também que essa postura tem mudado com as novas gerações. Entretanto, se fôssemos mais unidos a cena cultural da cidade seria muito mais sedimentada, muito mais forte, visceral. Somos um tanto egoístas, mas isso vem aos poucos mudando, e tenho observado grandes e profícuas parcerias.

Quais são os maiores empecilhos e os maiores benefícios que apontaria da cena musical/cultural fora do Plano Piloto?
Os empecilhos são os espaços e aparelhos culturais desativados ou com pouca ou quase nenhuma estrutura para atender a demanda do que se produz aqui. O lado positivo da cena local é que aqui se faz, reúne uma turma, faz um coletivo de equipamentos e a coisa acontece. Antes os eventos aconteciam sem verba mesmo, e ainda acontece, algo de atitude e vontade de fazer, de tocar, fazer um som. Mas essa postura do ;faça você mesmo; não pode justificar a ausência de políticas públicas na periferia.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação