Diversão e Arte

Lygia Fagundes Telles pede ao jovem leitor: 'Me leia. Não me deixe morrer'

A autora compartilhou com a plateia sua história de vida e foi chamada de "a melhor contista da América"

Agência Estado
postado em 13/11/2015 18:03

A escritora Lygia Fagundes Telles tem saído pouco de casa, mas faz questão de ir às reuniões da Academia Paulista de Letras, no Largo do Arouche, para conversar com os outros acadêmicos e relembrar sua trajetória. "Ela perde dinheiro ficando conosco", brincou José Renato Nalini, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo e membro da APL, referindo-se à Academia Brasileira de Letras - mais prestigiosa, ela ainda paga jetom a seus imortais que frequentarem as reuniões em sua sede, no Rio.


Aos 92 anos, ela foi homenageada na quinta-feira (12/11) e ouviu os amigos contarem histórias sobre ela e falarem sobre sua obra. Não pouparam elogios: "A melhor contista da América", "profética", "corajosa", "deliciosa", "terna", "doce", "singela", "humilde". O mais repetido: "Generosa". Feliz, ela ouviu pacientemente. Da mesa, agradeceu e mandou beijo aos colegas quando eles terminavam o discurso. Reparava em quem saía e chegava.


José Renato Nalini contou que tinha uma poodle "temperamental", mas que quando Lygia ia à sua casa, ela logo pulava no colo da escritora e ficava quietinha. "Os animais a amam, e ela conversa com as árvores", ele disse. Ao que ela emendou: "E elas me respondem".


Gabriel Chalita, presidente da Academia Paulista de Letras e um dos idealizadores do Encontro Mundial de Invenção Literária, que começou na quinta e vai até domingo - e prestou a homenagem à autora -, lembrou que quando ele lançou seu primeiro livro, sobre mulheres que mudaram o mundo, ligou para ela, se apresentou, mandou um convite para o lançamento, e, quando chegou ao local do evento, ela, que nem o conhecia, já estava lá "Eu tremia tanto de emoção", revelou. Essa generosidade foi destacada, também, pelas escritoras Renata Pallottini e Anna Maria Martins.

E então foi dada a palavra para a homenageada, que até preparou um texto, mas, na hora, dizendo que ele estava muito longo, preferiu improvisar. Ela começou contando sobre as dificuldades que encontrou, em casa e fora, por querer estudar Direito. Era 1941, e os cursos eram dominados por homens. "Eu queria mostrar que a mulher, no Brasil, não precisava ser rainha do lar. Queria dizer que ela pode segurar a tocha da coragem e do desejo de mostrar a igualdade entre homens e mulheres", disse. Ouviu de sua mãe que ela ficaria "solteirona, velha e desdentada". E respondeu: "Mamãe, deixa, eu me arrumo".


Ela foi contando, contando, às vezes se repetindo, até que Chalita cochicha algo em seu ouvido. "Ele está dizendo que já está bom", divide com a plateia. Pensa em se apressar, mas segue o fio da meada. "Foi bonita a luta. E foi uma luta muito heroica e desesperada para mostrar que a mulher brasileira pode, ao lado do homem, ter um lugar ao sol. Que ela pode ousar tudo sem perder a sua dignidade".


Lygia encerrou com um apelo. "Faço um convite ao jovem leitor: Me leia. Não me deixe morrer."

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