Nahima Maciel
postado em 14/11/2015 07:32
Há algo de inegavelmente trágico e dramático na obra de Iberê Camargo. Não chega a ser explícito, mas também não escapa a olho algum. As cores escuras, a matéria depositada em camadas sobre a tela e, eventualmente, os temas, tudo conduz o olhar para um mundo habitado por sombras e por uma solidão impossível de esconder nas 120 obras de Iberê Camargo: um trágico nos trópicos, exposição em cartaz a partir de hoje no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Com curadoria de Luiz Camillo Osório, a mostra é a maior já realizada em Brasília com obras do pintor nascido há mais de 100 anos em Restinga Seca, pequena cidade no coração do Rio Grande do Sul.
[SAIBAMAIS]Montada com obras pertencentes à Fundação Iberê Camargo e a coleções públicas e privadas e premiada como a melhor exposição retrospectiva de 2014 pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA), a mostra foi organizada para celebrar o centenário do nascimento de Iberê e já passou por São Paulo e Rio de Janeiro. Com obras produzidas entre 1950 e 1990, a seleção de Osório reúne um pouco de praticamente toda a produção do artista, que morreu em Porto Alegre, em 1994. São pinturas, gravuras, desenhos e até matrizes capazes de sintetizar toda a formação da linguagem pictórica explorada desde a viagem à Europa, em 1948, para estudar pintura com De Chirico e André Lothe, até o auge, nos anos 1980 e 1990, quando o nome de Iberê Camargo se configurou como um dos mais importantes na pintura brasileira do século 20.
A trajetória do artista começa com a construção das naturezas mortas e as representações de simbologias da infância, como as fiadas de carreteis que aos poucos se dissolvem no fundo da tela até se transformarem em pintura abstrata muito gestual e matérica, marca da produção dos anos 1960 e 1970. Com um aspecto encardido, sombrio e muito expressivo, Iberê cria um mundo de abstração informal com intensa carga de cor. São os magmas ou núcleos, pesadas massas de tinta nas quais o movimento é tão imponente que faz pensar imediatamente na presença do artista.
Nos anos 1970, a abstração cede espaço para uma mão mais gráfica. Como se acordasse de uma profunda melancolia, Iberê se volta para a figuração. Os carreteis reaparecem, assim como os ciclistas e os corpos nem sempre bem delineados, às vezes precariamente pintados, deformados e um pouco trágicos, porém marcantes como presença humana, especialmente na década de 1980. É o período que o curador Luiz Camillo Osório chama de ;apoteose trágica; do artista. ;É o conjunto final, ele com esse enfrentamento da morte, da finitude e ao mesmo tempo com muita intensidade. Não tem melancolia, tem uma cor sombria, porém, ao mesmo tempo tem uma intensidade ali que é muito afirmativa;, descreve o curador. Foi no fim dos anos 1980 que o pintor descobriu o primeiro câncer e começou a lidar de uma maneira mais concreta com a proximidade da morte.
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