Rebeca Oliveira
postado em 05/12/2015 07:30
;As pessoas só protegem o que sabem que existe.; Com a sentença em mente, o fotógrafo de natureza e conservação Leonardo Merçon deixou de pagar as contas pessoais, alugou um barco e saiu de Vitória com destino a 10 cidades em Minas Gerais e Espírito Santo. Merçon, que também é presidente do Instituto Últimos Refúgios, partiu de casa com um grupo composto por ele e mais duas pessoas. Ao longo de três semanas, registrou o antes e o depois da maior tragédia ambiental que abalou o país nos últimos meses: o rompimento das barragens da mineradora Samarco (Vale e BHP Billiton) em 5 de novembro, levando uma onda de caos por onde passaram as 62 milhões de toneladas de lama, que deixou pelo menos 13 mortos, uma dezena de desaparecidos e milhares de desabrigados. As viagens feitas por ele viraram o projeto fotográfico Lágrimas do Rio Doce, que em breve será disponibilizado também em formato de documentário.
Até agora, Merçon fez duas expedições fotográficas. A primeira aconteceu quatro dias após o rompimento das barragens, destruindo o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG). A priori, a previsão do grupo era acompanhar a chegada da lama no Espírito Santo, onde vivem. Diante da demora inicial, o fotógrafo e equipe decidiram subir o Rio Doce de barco. Por um momento, chegaram a pensar que a lama tinha se dissipado. Até chegarem a Governador Valadares, um dos municípios mineiros mais atingidos pelos restos do acidente na mineradora. A bordo de uma embarcação simples, Merçon e os colegas registravam tudo que podiam. Ele recorda: foi difícil fotografar com os olhos mareados diante da situação de desespero da população.
Expedição
O fotógrafo viu a cor da água do Rio Doce mudar de verde-esmeralda para um marrom sem vida. Peixes pulavam para fora da água, desesperados. Alguns pescadores colhiam os animais mortos e tentavam vender por míseros R$ 5 por quilo, para garantir o sustento da família. As primeiras imagens foram visualizadas por mais de cinco milhões de pessoas, o que ajudou o Instituto Últimos Refúgios a realizar a segunda expedição, quando acompanharam a chegada da lama tóxica no mar. A morte não se restringia a peixes. Capivaras, lontras, jacarés, cavalos e até aves também morreram. Pessoas também ficaram doentes por beber a água proveniente do rio. A lama segue o curso do mar, e continua, diariamente, matando mais histórias. ;Passei a prestar atenção nas comunidades. Quis mostrar o crime que estava sendo cometido, e não consegui dissociar os lados pessoal e emocional;, afirma o fotógrafo.
Uma das imagens mais icônicas tem nas lágrimas de um pescador uma síntese que viveram os ribeirinhos ao ver seu sustento se perder em litros de água avermelhada e cheia de poluentes. Em Aimorés, em Minas Gerais, Benilde Madeira foi flagrado em uma das fotografias mais tocantes. Os olhos cheios d;água carregavam um misto de lamento e desespero. ;Naquele momento, ele falava sobre o filho dele, que havia perguntado sobre quando ele pescaria um dourado de novo no rio, e ele não sabia a resposta;, recorda Merçon. ;Em todos os pescadores, percebi que não havia só tristeza, mas raiva. Esse não é o primeiro problema que estão enfrentando. Eles já tinham dificuldades com os empreendimentos que usam os rios, como as hidrelétricas e outras empresas que o polui. E com o próprio governo e o defeso, que não havia sido pago;, acrescenta.
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