Diversão e Arte

Romance mapeia os últimos meses de vida de Rimbaud

Lúcia Bettencourt mistura ficção e poesia em O regresso - A última viagem de Rimbaud

Severino Francisco
postado em 05/12/2015 07:34

A literatura não foi a mesma depois dos versos do poeta francês

Jean-Arthur Rimbaud só escreveu dos 17 aos 20 anos, mas inventou uma nova linguagem para a poesia, capaz de falar de alma para alma, misturando os sons, os perfumes e as cores: ;A estrela chorou rosa ao céu de tua orelha;. O poeta se faz vidente por meio de um longo, imenso e calculado desregramento de todos os sentidos: todas as formas de amor, de loucura, de êxtase e de dissipações. As linhas de força da literatura e da vida se entrelaçaram de maneira indivisível. Essa encruzilhada é o tema de O regresso ; A última viagem de Rimbaud, de Lúcia Bettencourt (Ed. Rocco), livro que mistura ficção e poesia.

Aos 6 anos, Rimbaud anunciou que quando crescesse seria aventureiro. E cumpriu a sina. A partida, a fuga e a errância sempre foram obsessões de sua vida. As pernas robustas de camponês o levaram a intermináveis caminhadas de Charleville a Paris. Nietzsche parece fazer um elogio a Rimbaud ao afirmar que só são saudáveis os pensamentos que temos andando.

O poeta francês eternizou as suas errâncias em poemas como Minha boêmia. Ele estabelece uma ruptura com a visão idealizada dos poetas e da poesia clássica. As musas não se situam mais em um olimpo distante e ele não toca um instrumento convencional. Rimbaud senta a beleza no colo e tange os elásticos de sua botina de andarilho como lira. Arranca a beleza da circunstância mais trivial: ;Lá ia eu, as mãos nos bolsos esfarrapados/Meu paletó também tornava-se ideal/Eu ia sob o céu, Musa! E era seu súdito fiel/Puxa vida! Que amores esplêndidos eu sonhava/Meu único par de calças tinha largos furos./; Pequeno Polegar do sonho, espalho rimas/pelo caminho.Meu albergue é a Ursa Maior./; Minhas estrelas no céu fazem um doce frufru./E eu ouvia sentado à beira do caminho/durante as noites de setembro, em que sentia o gosto/do orvalho na minha fronte, como um vinho vigoroso/ Onde, rimando em meio a imensidões fantásticas,/como uma lira, eu tangia os elásticos/das minhas botinas estropiadas, um dos pés junto do coração.; Barco bêbado Em O regresso, a viagem dramática de Rimbaud da África rumo à França, atravessando desertos, em cima de uma maca especial, desenhada pelo poeta, carregada por negros africanos, como se fosse um barco bêbado, é o pretexto para rever a vida e a obra. Em consequência do ímpeto desregrado de andarilho, Rimbaud teve um problema no joelho que degenerou em câncer: ;Mas, em verdade me digo, a gente só compreende a viagem quando regressa;, diz o poeta narrador. ;Pois é só no regresso que se surpreende a essência da viagem. Mesmo que ainda não entendamos nada, mesmo que a esfinge nos tenha desafiado e nós nos tenhamos calado por não saber a resposta;.

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