Irlam Rocha Lima
postado em 27/02/2016 07:30
O samba está comemorando seu primeiro centenário. Desse longo ciclo, Paulo César Batista de Faria, o Paulinho da Viola, viveu intensamente a metade ; tomando como referência o LP Samba na madrugada, recém-lançado na versão CD, que o músico, cantor e compositor gravou com o companheiro de geração e parceiro Elton Medeiros, em 1966, pela RGE.
Um pouco antes, ele havia participado do musical Rosa de Ouro, criado por Kléber Santos e Hermínio Bello de Carvalho; e integrado o conjunto A Voz do Morro, ao lado de Zé Keti, Nelson Sargento, Anescar do Salgueiro, Jair do Cavaquinho, entre outros. Todos o chamavam Paulo César, até que o jornalista e pesquisador Sérgio Cabral o batizou artisticamente dando-lhe o nome de Paulinho da Viola.
Com uma discografia de 21 títulos e incontáveis clássicos, Paulinho viu a fama e o sucesso surgirem no começo da década de 1970, quando lançou Foi um rio que passou em minha vida, samba que compôs para reverenciar a Portela, nome também do disco que lançou naquela época.
Quando veio a Brasília pela primeira vez, o sambista já tinha 10 anos de carreira e fez show no Teatro da Escola Parque. Depois voltou à capital em incontáveis ocasiões e se apresentou em diferentes locais. Um deles foi o Clube do Choro, na reabertura da sala que acabara de ser reformada, em 1997.
Autor de vários temas do chorinho, tido como gênese da música popular brasileira, o compositor carioca será o grande homenageado do projeto deste ano do Clube do Choro. A série, com abertura em 11 de março, prossegue até a primeira quinzena de dezembro.Paulinho fará participação especial no show do Choro Livre, liderado por Reco do Bandolim.
O filho de Benedicto Cesar Ramos Faria ; integrante da formação original do lendário regional Época de Ouro ; conviveu na infância e adolescência com grandes chorões, entre os quais Pixinguinha e Dilermando Reis. Aliás, em 1976, quando o chorinho andava meio esquecido, ele teve a companhia do grupo criado por Jacob do Bandolim, no antológico show Sarau, no Rio de Janeiro, que obteve grande repercussão e levou o público a ;redescobrir; o choro.
>> Entrevista
Na sua avaliação, o samba, que em 2016 celebra um século de existência, tem se renovado?
O que vejo é que a cada dia tem mais gente envolvida com esta história, principalmente os jovens. Há quem cultua a forma mais tradicional de fazer samba, mas existem outros que têm proposta um pouco diferente, priorizando, por exemplo, o partido-alto, o verso de improviso e um outro tipo de instrumentação, inclusive na forma de paletar o cavaquinho. Isso teve origem na década de 1980, com músicos que frequentavam o Cacique de Ramos, como Zeca Pagodinho, Jovelina Pérola Negra e o pessoal do Fundo de Quintal.
Que contribuição deram os sambistas que surgiram após a turma do Cacique?
As mudanças vêm ocorrendo com a chegada de jovens sambistas, que trazem novas ideias. Dá para perceber que alguns deles, embora reverenciem o samba, não fazem o samba tradicional, mas sim com um jeito contemporâneo. O ritmo das gravações de agora mostra isso. O que importa, porém, é que, renovado, o samba está vivo e forte.
E como você vê as alterações que aceleraram o andamento do samba-enredo?
Essas alterações são bem perceptíveis não apenas no andamento, mas também no ritmo, na forma de tocar, com uma percussão bem forte, diferente do que se via e ouvia no samba-enredo nos anos 1970 e 1980. O samba é muito complexo e permite variações e as escolas de samba foram incorporando muita coisa. Da Praça Onze à Marquês de Sapucaí, passando pela Rio Branco e a Presidente Vargas, as mudanças foram acontecendo. Nas escolas, os grandes sambas-enredo foram substituídos pelo visual, isso em decorrência dos espaços que os desfiles passaram a ocupar. Joãosinho Trinta me disse certa vez que seu carnaval tinha que ser para cima, para ser visto e apreciado pelas pessoas, devido ao posicionamento delas nas arquibancadas e nos camarotes do sambódromo.
No carnaval deste ano, em que a Portela classificou-se em terceiro lugar, você não participou do desfile. Houve algum motivo?
Em 2015 eu tive muitos compromissos e viagens e fui pouquíssimas vezes à Portela. Conversei com Monarco e falei para ele que não poderia participar do desfile, pois tinha alguns shows agendados durante o carnaval. Na véspera, vim a Brasília para um show fechado, e na semana seguinte fui convidado para fazer uma apresentação de abertura do carnaval, no Largo do Pelourinho, em comemoração ao centenário do samba. O show reuniu uma multidão vibrante. Depois voltei para o Rio e, como estava cansado, preferi ficar em casa. Não fui também a Madureira para o desfile do bloco Timoneiros da Viola, criado há quatro anos para me homenagear.
No fim do ano passado foi lançado no formato CD o Samba na madrugada, que você gravou com Elton Medeiros em 1966 e saiu, originalmente, em LP. Você vê esse disco como um marco em sua obra?
O Elton e eu formamos no Voz do Morro, que contava ainda com músicos, compositores e cantores originários do musical Rosa de Ouro, produzido pelo Hermínio Belo de Carvalho. Esse espetáculo foi responsável por promover o retorno de Aracy Cortes e o lançamento de Clementina de Jesus. Aí fomos convidados pela RGE para gravar o Sama na madrugada, lançado em 1966. Depois saiu em CD e, mais recentemente, um novo relançamento.
Por falar em disco, há plano de lançar algum álbum neste ano?
Olha, tenho trabalhado bastante. Fiz o show dos 50 anos de carreira em algumas capitais, mas não pude levar a outras. Tenho composto também, mas não tanto quanto gostaria. Fiz um samba intitulado Um cara bacana, para o Elton (Medeiros), que ele gravou no disco comemorativo dos 80 anos. Fiz também Bloco do amor, para a Beatriz (Faria), minha filha, que fará parte do primeiro CD dela. Mas pretendo lançar um disco de composições inéditas neste ano. Há, ainda, outros dois gravados ao vivo no Teatro Cecap, em São Paulo, há algum tempo, cujo resultado gostei bastante, que ainda não foram lançados.
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