Diversão e Arte

Exposição traz a Brasília obras do holandês Piet Mondrian

As obras ficarão expostas até 4 de julho, de quarta a segunda, das 9h às 21h, no CCBB

Nahima Maciel
postado em 21/04/2016 07:30
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Pode parecer bizarro para quem está acostumado a ver o nome de Piet Mondrian associado às pinturas geométricas com cores primárias, mas o artista holandês fez sucesso como pintor de paisagens. É claro que a fase neoplástica foi responsável por projetar o nome do artista, mas também é curioso conhecer o percurso até as composições consideradas ícones das vanguardas europeias do século 20. Por isso, as obras reunidas em Mondrian e o movimento De Stijl, em cartaz a partir de hoje no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), são uma oportunidade rara de compreender como o artista chegou ao neoplasticismo que conquistou o mundo.

Com cerca de 100 obras emprestadas pelo Museu Municipal de Haia, dono do maior acervo do artista, e por colecionadores privados, a exposição traz pinturas de Mondrian e de seus contemporâneos, além de mobiliário, filmes, design e projetos de arquitetura. São trabalhos assinados por artistas cuja atuação girava em torno da De Stijl, revista de arte editada por Theo van Doesburg e cabeça do movimento que pretendia transformar o mundo com a arte inserida no cotidiano.

;Havia um consenso de que a cultura era um instrumento de mudar o mundo. E se você quer mudar o mundo, não faz isso apenas com um quadro na parede, você tem que cercar a pessoa para que comece um novo pensamento;, explica Pieter Tjabes, curador e sócio da Art Unlimited, produtora da exposição. ;Na visão deles, isso era necessário porque a Europa estava numa guerra terrível, destruindo os alicerces de uma civilização. Os artistas tinham suas respostas.;

Nas primeiras décadas do século 20, o pintor viveu da venda de paisagens. Três delas estão no CCBB e revelam o tipo de pesquisa que sempre interessou o artista: a economia de traços, o ritmo geométrico vertical e, sobretudo, a superficialidade e a falta de profundidade. É importante saber que o Mondrian era membro da Sociedade Teosófica e adepto dessa filosofia que reúne misticismo, elementos de diversas religiões e uma crença nos elos perdidos entre o homem e o ambiente no qual vive.

Origem
Nascido numa família protestante em 1872, o artista acreditava na busca pela essência das coisas à qual se ancora a teosofia. Esse pensamento ajuda a compreender a trajetória que o levou à abstração. Em 1912, Mondrian se muda para Paris para viver in loco a experiência das vanguardas cubistas e abstratas. Mas foi preciso um processo para o artista colocar o primeiro pé na abstração. Em uma de suas últimas pinturas figurativas, Campanário em Zeeland (1911), ele retrata uma catedral cuja torre começa a ser timidamente desconstruída. Um pouco antes, ele havia experimentado o pointilismo e começado a clarear as cores outrora ocres de sua paleta.

Em Paris, Mondrian começou a limpar o traço e a figuração se diluiu em um cubismo tímido que logo se transformou em geometria pura. Mas as obras neoplásticas, marcadas pelo uso das cores primárias, só aconteceriam nos anos 1920. O artista era obcecado pelo estudo das cores e formas. Amadurecia muito uma fase antes de se arriscar em outra. Chegou a escrever artigos sobre como as cores primárias eram essenciais muito antes de ousar empregá-las nas pinturas.

;Nada é rápido com ele. Para aderir à própria teoria, ele demora. Ele escreve que o uso da cor primária é importante, mas ele não usa, tem medo, acha que o público não está pronto para isso. Aí, ele vê na obra de um amigo e vai se acostumando com a ideia. Depois de três anos, ele consegue;, conta Tjabes, que escolheu três pinturas neoplásticas para a mostra.

Cores e formas
As obras ficarão expostas até 4 de julho, de quarta a segunda, das 9h às 21h, no CCBB
Na sala reservada às telas mais famosas do artista, o visitante poderá ouvir jazz, música que ele considerava moderna e nada sentimental. Mondrian chegou a ter uma coleção importante de discos de jazz, hoje guardada no museu de Haia. O termo neoplasticismo, ele tirou da obra de um matemático e as cores primárias, para ele, encontravam uma ressonância cerebral única. Enquanto o vermelho e o amarelo expulsam o olhar da tela, o azul é capaz de absorvê-lo e fazer o visitante mergulhar no quadro. Já a linha e o ângulo retos eram vistos como elementos de uma linguagem universal. O artista entendia essa combinação como um caminho para a essência da linguagem e para uma verdade universal.

Além das pinturas, uma galeria ficou reservada para o mobiliário e outros objetos de design. Lá fica a cadeira Vermelha azul, criada pelo arquiteto Gerrit Rietveld, o nome por trás da arquitetura proposta na De Stijl. Uma versão gigante do móvel, assim como uma reprodução de uma pintura de Mondrian, foi disposta na entrada da exposição para que os visitantes possam fazer fotos. A interatividade e o tom didático estão na mostra de propósito. O público poderá, por exemplo, tentar reconstituir a geometria de Boogi Woogie, uma das pinturas mais conhecidas do artista, reproduzida em um painel magnético. A galeria de vidro foi transformada em caixa de luz com reproduções de três quadros do artista e pode ser vista de longe, à noite, graças à iluminação. São estratégias de Tjabes para facilitar a compreensão do público não iniciado, mas também para divulgar a mostra. Ele espera que as fotos com a cadeira e as reproduções tomem as redes e ajudem a despertar o interesse do público.


Mondrian e o movimento De Stijl

Exposição de Piet Mondrian e outros artistas. Curadoria: Pieter Tjabes. Visitação até 4 julho, de quarta a segunda, das 9h às 21h, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB - Setor de Clubes Sul, Trecho 2)


Três perguntas / Pieter Tjabes

Qual o lugar do neoplasticismo tanto na história política da Europa na época quanto na história da arte?
Esse movimento surgiu porque os artistas estavam em busca de uma linguagem verdadeiramente contemporânea e não achavam isso nem no cubismo nem no fauvismo, que tinham muitas preocupações estéticas. O De Stijl surge com uma proposta de reestruturação da sociedade, que é muito diferente de um cubismo, que simplesmente queria fazer obras de arte. Não existe uma casa cubista, por exemplo. O De Stijl é um jeito de pensar uma sociedade nova, é muito utópico. Surge durante a Primeira Guerra. A Holanda era um país neutro e os artistas estavam meio confinados lá dentro. E tudo era escasso: a informação, a comida, é uma época de reflexão. Os horrores da guerra chegavam para todo mundo e a reação era ;o que nós vamos fazer depois disso;? Os dadaístas falam que vão destruir tudo para ver o que recuperar dos destroços para criar uma nova cultura. O Stjil pensa diferente, eles queriam oferecer ao mundo uma linguagem e uma forma de pensar que se aplicasse em tudo. Se tudo fosse efetuado, então o mundo mudaria.

A exposição é muito didática e interativa. Por que esse formato?
Duas coisas. Uma é que eu sou didático. Sou professor, adoro dar aula e a arte é uma maneira de você fazer as pessoas enxergarem a vida e a sociedade de forma muito agradável. O outro é que o CCBB atende a um público muito amplo, a todas as camadas da população, então temos sempre que pensar nesses grupos. Temos que agradar a quem já conhece e a quem não sabe nada, o que é muito difícil. Ofereço para o público uma informação dirigida. Se você quer saber mais, tem documentários, tem outros textos que explicam mais, audioguias. Se você não quer ler, vai só ver as obras. Desta forma, sendo objetivo, claro, você atinge todos os públicos. O lúdico tem uma função tremenda no Brasil. Ele atrai um público que não tem costume de visitar exposição. Ele seduz. É quase como se fosse uma cenourinha para um público que não está acostumado. E essa cenourinha circula na internet, tem as fotografias engraçadas e isso faz com que as pessoas venham à exposição. Pode até não entender nada, mas teve contato. Entrou e não foi barrado. Não pagou. É um espaço democrático, todo mundo entra e tem que se sentir em casa, então o lúdico faz com que uma grande fatia do público que não tem esse costume se sinta em casa.

Por que o jazz?
Mondrian adorava. Ele adorava dançar e tinha horror a música sentimental. Ele escreve que essa música é compatível com o tempo dele, é moderna. E ele vai comprando discos. Ele cita literalmente essa dança, o charleston. Lá, quero criar um ambiente no qual você entra em outro mundo, um mundo sensorial, de cores, no qual você é cercado e invadido pelos princípios do De Stijl.



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