Nahima Maciel
postado em 28/04/2016 07:30
José Zanine Caldas nunca frequentou escola de arquitetura, arte ou design, mas carregou no currículo o peso de ser um dos nomes mais importantes dessas áreas no cenário brasileiro. Autodidata, Zanine foi pioneiro ao integrar madeira sustentável na produção de mobiliário e na projeção de casas no Brasil, e é essa história que o público poderá conhecer durante a exposição Madeira Sustentável ; Arquitetura e Design, em cartaz a partir de hoje no Casa Park.
Com curadoria de Humberto Macedo e participação do filho do arquiteto, o designer Zanini de Zanine, a mostra reúne 10 maquetes, reedições de móveis realizados entre os anos 1940 e o início do século 21 e o documentário Zanine ; O ser do arquitetar, dirigido por André Horta. A ideia é fazer um passeio por todas as áreas exploradas pelo arquiteto. Além disso, haverá também uma exposição dedicada ao uso de madeira na arquitetura brasileira do século 21.
Desenhista e projetista de talento, José Zanine Caldas montou, nos anos 1940, um ateliê de maquete no Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), que mais tarde se tornaria o Iphan. Envolvido na pesquisa de madeira e de design, fundou, nessa mesma época, a fábrica Móveis Artísticos Z, sediada em São José dos Campos (SP). O passo foi pioneiro na industrialização de móveis criados com madeira sustentável e design orgânico que aproveitava as formas originais do material e entrou para a história do design de móveis brasileiros.
No fiM da década de 1950, Zanine foi trabalhar em São Paulo com Alcides da Rocha Miranda, na Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAU/USP), antes de desembarcar em Brasília. A fama de maquetista chegou a Oscar Niemeyer e Lucio Costa, que contrataram o arquiteto autodidata para realizar as maquetes da capital nascente. Foi no Planalto Central que Zanine começou a dar asas ao talento. Como não tinha formação acadêmica, foi rejeitado pelo CREA, mas, com apoio de Lucio Costa, se tornou doutor honoris causa e recebeu o título da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Também foi convidado por Darcy Ribeiro para integrar o corpo docente da Universidade de Brasília (UnB), da qual acabou expulso, em 1964, com uma leva de professores perseguidos pela ditadura militar. Apenas em 1986 Zanine voltaria a integrar o quadro de professores.
Dos 10 projetos cujas maquetes são apresentadas na exposição no Casa Park, quatro foram realizados em Brasília. Conhecido por usar muita madeira e criar, principalmente, casas, o arquiteto chegou a projetar quase um bairro inteiro na Joatinga, no Rio de Janeiro. ;Ele foi a primeira pessoa que trabalhou com madeira brasileira sustentável no Brasil. Pegava a madeira que as pessoas consideravam de segunda. Isso deu certa identidade ao trabalho dele;, explica o curador Humberto Macedo.
Mobiliário
Entre os móveis selecionados para a reedição estão a poltrona Z e a Cuca, cuja principal característica é o espaldar alto. Segundo Zanini de Zanine, filho do arquiteto, são móveis bem característicos da época em que foram criados e típicos da fábrica montada em São José dos Campos. ;No fim da década de 1940 foi estruturada essa fábrica baseada na produção em série de uma linha de mobiliário em madeira e compensado naval com maquinário industrial avançado para época;, explica Zanini. No total, serão reeditadas seis peças, que estarão à venda durante a exposição e passarão a ser produzidas em série para comercialização.
Para montar o documentário Zanine ; O ser do arquitetar, André Horta foi em busca de entrevistas com amigos e profissionais que trabalharam com o arquiteto, além da fala do próprio Zanine. Ziraldo, Oscar Niemeyer e o também designer Sérgio Rodrigues estão no filme com depoimentos. O próprio arquiteto aparece em uma entrevista no programa de Jô Soares. ;O objetivo do documentário é o público sair do filme achando que o conheceu;, avisa Horta.
Ele conheceu o arquiteto em 1994, quando foi fotografar as casas da Joatinga. Em uma conversa com Zanine, percebeu que o homem era ainda mais interessante que sua arquitetura. ;Ele era mais importante que a arquitetura dele. Depois de conhecê-lo você entendia melhor a arquitetura dele. E ele não foi apenas um arquiteto, foi paisagista, designer, projetista;, lembra. Horta gosta de descrever Zanine como um doutor barroco, que aprendeu observando a natureza: ;Ele dizia que a madeira nasce quando a árvore morre. E a madeira dura mais que a árvore;.
Madeira Sustentável ; Arquiteturae Design
Visitação até 8 de maio, de segunda a sábado, das 10h às 22h; e domingo, das 12h às 20h, na Praça Central do Casa Park.
Zanine ; O ser do arquitetar
Documentário de André Horta. Hoje, às 19h, na Praça Central do Casa Park.