Diversão e Arte

O livreiro Chiquinho acumula autógrafos de Cora Coralina, Saramago e outros

Grafias de Cora Coralina, Ferreira Gullar e Eduardo Galeano compõem as estantes literárias do dono da tradicional banca na UnB

postado em 15/05/2016 07:39
Chiquinho, na livraria que mantém na UnB: relação apaixonada com os livros
Títulos consagrados da literatura brasileira são acompanhados de declarações únicas nas prateleiras de Chiquinho, livreiro ilustre da Universidade de Brasília. Em uma banquinha modesta no ICC norte, chamada Livraria do Chico, o livreiro guarda mais de 500 obras, que além das páginas publicadas carregam a admiração dos escritores pelo piauiense de jeito carismático. Entre recados como, ;Para Chiquinho, vendedor de livros e colecionador de simpatias;, de Liv Sovik, e ;Ao querido Chiquinho, valente livreiro;, de Nélida Piñon, as dedicatórias marcam muito além das folhas de rosto dos livros. Simbolizam as experiências de vida de um homem que buscou em capas históricas a fonte do saber e a vontade de conhecimento. ;O maior encanto da minha profissão é entender a obra e o autor. Virar amigo dos dois;, conta o livreiro.

Grafias de Cora Coralina, Ferreira Gullar e Eduardo Galeano compõem as estantes literárias repletas de sentimentos, que, para Chiquinho, são prateleiras de guardar memórias. ;Por meio dos autógrafos tenho uma forma de guardar memória e ter legitimidade. Em tempos on-line, só o livro autografado fala como documento;, acrescenta o livreiro. No olhar de Chiquinho, o encontro e a visita dos escritores são sempre sagrados. ;Posso dizer que tive a sorte do acaso com os autores;, argumenta.

Lembranças

Com ar saudoso, Chiquinho se lembra da prosa ao lado de cada poeta e deixa no coração o gosto das conversas. ;Em 1982, fui á casa de Cora Coralina e fiquei um tempo conversando com ela: que despertou meu interesse em conhecer as ideias por trás dos livros. A Coralina foi um marco inicial da minha proximidade com os escritores;, diz o livreiro. Em forma de verso, a doceira se inspirou no sobrenome de Chiquinho, Carvalho, para lhe fazer uma homenagem. ;Francisco Joaquim Carvalho. Meu amigo, cuide bem do Carvalho. É árvore que vence os séculos, de boa sombra e troncos fortes. Seja você sempre robusto e de boa sombra como o Carvalho do seu nome;, escreveu a poeta em páginas, hoje, amareladas do livro Poemas do beco de Goiás e estórias mais.

;Cuidado, vamos segurar os livros com cuidado;, a cada folha manuseada delicadamente, ele mostra o carinho pelos títulos. ;Carrego esse caminho e oportunidades como uma dádiva;, explica. Além do contato com Cora Coralina, ele destaca o dia em que conheceu Ariano Suassuna. ;O encontrei quando veio fazer uma palestra em Brasília, esperei a palestra terminar e fui falar com ele. Quando cheguei lá, ele se lembrou de mim, porque apareci falando dele uma vez na televisão; E ele lembrou! Quase desmaiei de felicidade;, comenta emocionado. Segundo o livreiro, o mais importante da vida é cultivar memórias que nos fazem bem e já que a leitura proporciona isso, os livros existem como psicólogos da alma.


Autógrafos

Presente em bienais e palestras de grandes escritores, Chiquinho teve acesso aos nomes tão aclamados. Em uma dessas aventuras literárias, conheceu José Saramago, a quem mostrou sua admiração. ;Ele recebeu uma homenagem na UnB e na época fui vender livros na frente do auditório;, conta. Como lembra o livreiro, quando o editor de Saramago chegou à palestra, ele o cumprimentou e expressou a admiração pelo escritor. ;Eu o acompanhei e ele me apresentou a Saramago; na hora, eu tive uma sorte incrível, porque ele tirou uma foto comigo e autografou o meu exemplar de Todos os nomes;, completa.

Já quando estava na Bienal do livro no Rio de Janeiro, o livreiro conheceu Ferreira Gullar. ;Quando o encontrei em uma palestra na Academia Brasileira de Letras, tive a sorte de estar com o livro Poema sujo na mão;, ressalta. Segundo Chiquinho, o momento foi rápido, mas inesquecível. Na Bienal que teve em Brasília no ano de 2014, foi a vez de cumprimentar Eduardo Galeano. ;Pedi ajuda para a produção e fui o único que conseguiu encontrar com ele no hotel;, lembra emocionado. Ao chegar ao hotel, o assunto da prosa foi literatura clássica e construção editorial. ;A gente também conversou muito sobre Darcy Ribeiro, que era grande amigo de Galeano;, argumenta Chiquinho.

Para Chiquinho, conhecer Nádia Battella Gotlib foi outro momento marcante. ;Acho que ela escreveu a melhor biografia de Clarice Lispector. O texto é original e expressa a vida e obra de Clarice de um jeito bem conciso;, comenta. O encontro foi em um seminário que a escritora fez na Universidade de Brasília. ;Esbarrei com ela e me senti lisonjeado;, brinca o livreiro. Chiquinho também conta da vez que foi a Parati e recebeu a dedicatória de Lilia Schwarcz na obra Brasil: uma biografia. Na primeira folha do livro, ela dedicou: ;Para Chiquinho, que nos dá um exemplo com sua livraria;.

Poder da literatura

;Com o tempo, fui descobrindo que esses autógrafos, pra mim, são o documento da minha vida;, comenta Chiquinho. Grato pelo ofício de livreiro, ele diz que a profissão carrega momentos maravilhosos, mas também é preciso enfrentar dificuldades. ;Algumas livrarias foram fechando e chegaram as grandes redes. Para mim, que vivi essa mudança, tive a oportunidade de conhecer o mercado editorial;, explica o livreiro, que está há 41 na UnB, mas desde 1979 no ofício. Começou trabalhando em uma livraria no Conic, depois foi para o Venâncio 2000 e em 1982 passou a vender livros de mão em mão nas salas de aula da Universidade de Brasília. ;Ia muito ao departamento de história e fui pegando amizade com os professores, além da biografia das aulas; até conseguir um espaço fixo, em 1989;, completa.

Receber todos os que visitam seu espaço com sorrisos e conversas agradáveis ficou carimbado como marca registrada de Francisco Joaquim Carvalho. Ele acompanha as diferentes gerações que passam pelos corredores da faculdade e a cada livro vendido ou prosa descontraída conhece os encontros e desencontros do lugar. ;A UnB foi um destino que bateu na minha porta e me trouxe amizades sólidas, que pra mim é a dádiva de todos os dias;, conta. Para muitos alunos, Chiquinho é a alma da universidade e fortalece o vínculo com o conhecimento. A Livraria do Chico é um ponto de vivência, onde se compartilha saberes das ciências às artes e se encontra a fonte do conhecimento do jeito mais simples possível.

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