Diversão e Arte

Obras literárias têm intolerância como temática central

Três livros ressaltam os desafios de culturas pouco conhecidas pelos brasileiros

Nahima Maciel
postado em 26/05/2016 07:00 / atualizado em 19/10/2020 12:39

Paul Fischer: história absurda do ditador  norte-coreano que sequestrou um cineasta 

Talvez por serem mundos quase inimagináveis, tão fechados, que é sempre muito difícil saber o que acontece para além de suas fronteiras, cheios de códigos quase indecifráveis para democracias ocidentais, o Afeganistão e a Coreia do Norte despertam espanto e curiosidade. E há mais em comum entre eles do que se pode imaginar. São ambos abrigos de sociedades machistas, ocupantes de posições privilegiadas nos rankings de corrupção e difíceis de penetrar. Essas características, no entanto, não definem seus habitantes, na maioria das vezes povos oprimidos, cuja luta diária é capaz de escrever muito mais páginas de um diário do que o pacato cotidiano das democracias ricas do Ocidente. Só por isso já vale a pena reservar algumas horas para três livros cuja leitura é daquelas difíceis de largar.

COREIA DO NORTE
Yeonmi Park era uma menina de 13 anos e pesava menos de 30kg quando desceu a ribanceira do Rio Yalu e cruzou a fronteira entre a Coreia do Norte e a China. Atravessadores ajudaram, mas quiseram estuprar a menina em pagamento. A mãe não deixou e se ofereceu ela mesma para o estupro. Na China, as duas descobriram que o outro lado da fronteira não era o mundo cheio de esperança imaginado durante anos. Ao contrário, era praticamente igual ao país natal, com a diferença que, agora, seus corpos eram comerciáveis. Nas mãos de outros atravessadores, mãe e filha viraram mercadoria no comércio de casamentos chinês.

Uma noiva norte-coreana novinha e com muitos anos de trabalho pela frente é um bem valioso nas mãos da máfia chinesa e Yaonmi viveu de marido em marido durante quase dois anos até atravessar novamente a fronteira da China, mas, desta vez, em direção à Mongólia para depois ser enviada como refugiada à Coreia do Sul, o destino sonhado de todo fugitivo do Norte. Foi preciso um longo período de readaptação, de retomada da autoconfiança, de perda do medo do outro antes que ela decidisse escrever Para poder viver — A jornada de uma garota norte-coreana para a liberdade, relato em primeira pessoa sobre os dois anos em busca do caminho para a liberdade.

A saga de Yeonmi é, obviamente, uma tragédia, mas são os trechos nos quais a autora narra o cotidiano na Coreia do Norte os responsáveis pela parte mais interessante da leitura. Falta tudo no país de Kim Jong-Un, de comida e liberdade de expressão a saúde e educação. Nem com dinheiro é possível comprar esses itens, porque ali eles não existem mesmo. Mas isso o Ocidente bem sabe. O peculiar do relato está na maneira como a jovem descreve a ingenuidade de seu povo. Filha de um casal do interior, é sobre o campo norte-coreano que ela fala, um lugar onde reina o desconhecimento da existência de um mundo além-fronteiras, como se a Coreia do Norte fosse o único país no mundo. É verdade que, na fronteira com a China, existe um vaivém de informações, um tráfico de produtos como fitas de vídeo e música, mas não é o suficiente para informar sobre a realidade do outro lado. E muita gente se aproveita disso. O comércio de noivas norte-coreanas é um fato que muitos refugiados insistem em denunciar, embora recebam pouco retorno do governo chinês, que não quer se indispor com o vizinho aliado.

As meninas ocultas de Cabul

Em busca de uma resistência secreta no Afeganistão. De Jenny Nordberg. Tradução: Denise Bottmann. Companhia das Letras, 416 páginas. R$ 59,90

Para poder viver
A jornada de uma garota norte-coreana para a liberdade. De Yeonmi Park. Tradução: Paulo Geiger. Companhia das Letras, 312 páginas. R$ 39,90

Uma produção de Kim Jong-Il
De Paul Fischer. Tradução: Alessandra Bonrruquer. Record, 434 páginas. R$ 49,90

 

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