Diversão e Arte

Mostra de filmes traz ao CCBB raridades sobre os rebeldes da geração beat

Longas e curtas narram histórias sobre o movimento que se destacou pela contestação

Nahima Maciel
postado em 11/07/2016 07:30

Cena de

Os escritores beatniks são mais conhecidos pela literatura, mas o impacto causado por essa geração de contestadores foi tão grande que ecoou em quase todas as linguagens artísticas. Pensando nisso, a produtora e curadora Roberta Sauerbronn achou que uma mostra de cinema com o tema renderia bons momentos. Não foi fácil reunir os 34 filmes de Geração Beat, que tem início hoje no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), mas o esforço trouxe muitas surpresas. ;É um universo que conversa muito com o rock, a cultura pop dos anos 1960 e 1970, um universo no qual sou viciada desde garota;, avisa.

Produtora acostumada a sets de filmagem e festivais, Roberta sentia falta de compilações que reunissem tanto filmes adaptados dos livros que gostava quanto documentários e cinebiografias. Depois de se embrenhar em arquivos públicos e pessoais, ela descobriu, além das adaptações, uma boa leva de documentários e cinebiografias raros, além de filmes nos quais os beats participaram como atores ou colaboradores para os roteiros. ;Esse grupo era muito articulado culturalmente nos Estados Unidos e tinha amigos no cinema;, conta a curadora. Jack Kerouac, por exemplo, escreveu roteiros e William S. Burroughs gravou uma banda sonora para um filme mudo. Faz parte da mostra um conjunto de 14 curtas que Roberta elege como preciosidades. ;São filmes de difícil propagação, tive que ir a acervos e aos diretores pessoalmente;, conta.

Reedições
Como parte da programação, a curadora também convidou o poeta e crítico Claudio Willer para uma master class sobre os principais autores dessa geração. Para Willer, o espírito de contestação dos beatnik está bem vivo e basta um passeio pelas redes sociais para comprovar. Especialista no movimento, Willer escreveu Geração beat e Os rebeldes: geração beat e anarquismo místico, além de ter traduzido Uivo, Kaddish e outros poemas, de Allen Ginsberg. Ele acredita que o interesse nos beats ganhou novo fôlego nos últimos anos. Willer cita algumas reedições, caso de Almoço nu, de Burroughs, e uma edição de bolso de Na estrada, de Kerouack, publicada pela L. ;A crítica está entendendo de modo melhor a geração beat. O que significa tudo isso, esse crescimento não só de leitores, mas de pesquisadores? Em primeiro lugar, que a beat é literariamente substanciosa, que suas obras não se reduzem ao impacto momentâneo, ao modismo, como queriam alguns;, garante.

; Para entender
Formado por escritores e poetas, o movimento beat se caracterizava pela contestação. Essa geração vivia em grupos, se deslocava muito e questionava os valores sociais impostos por uma sociedade, à época, bastante conservadora. Na década de 1950, os Estados Unidos eram palco de extrema vigilância política com o macartismo, marcado pela repressão aos comunistas e desmantelamento da espionagem soviética. Os beats levantavam a voz contra o macartismo e pregavam a exploração dos sentidos na produção artística. As viagens psicodélicas eram um símbolo dessa geração que protagonizou um dos auges da contracultura.

Geração Beat

Mostra com 34 filmes. Curadoria: Roberta Sauerbronn. De hoje a 1; de agosto, de quarta a segunda, às 19h e às 21h, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB ; SCES Trecho 2). Master class com Claudio Willer: quarta, 13 de julho, às 18h. Entrada gratuita, mediante retirada de ingresso uma
hora antes do evento. Confira a programação completa aqui.

; Alguns destaques da mostra


Haxan
O filme mudo de 1922 está na fronteira entre o documental e a ficção. Extremamente experimental, o filme sueco encantou William S. Burroughs, que fez para ele uma banda sonora comentada na qual lê poemas e faz comentários. ;Uma das vertentes de interesse dos beatniks eram as culturas orientais e o misticismo;, explica Roberta Sauerbronn. Ocultismo é um dos temas de Haxan.

Longas e curtas narram histórias sobre o movimento que se destacou pela contestação

Viagem mágica
Dirigido por Alex Gibney e Allison Ellwood, o documentário em 16 mm é uma raridade e acompanha uma viagem dos escritores Ken Kesey e Neal Cassidy com o grupo Merry Panksters, que promovia o uso de ácido para ativar a criatividade. Timothy Leary estava na viagem. A trupe atravessou os Estados Unidos de uma costa à outra, sempre acompanhada de uma câmera, mas as imagens só foram recuperadas e transformadas em ocumentário há cinco anos.

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Com amor, Carolyn
Datado de 2011, o documentário é a versão de Carolyn para a viagem narrada em Na estrada. ;É um filme de memórias;, avisa Roberta. Segundo ela, Carolyn teria feito o documentário para esclarecer algumas histórias que considera equivocadas sobre seu relacionamento com Kerouack, de quem foi amante, e Neal Cassidy, com o qual acabou se casando.

Ballad of the skeletons
O curta de cinco minutos é, na verdade, um videoclipe realizado por Gus Van Sant em 1997. Fã dos beats, o cineasta utiliza uma série de imagens para encenar poemas de Allen Ginsberg.

Chappaqua ; Almas entorpecidas

Dirigido por Conrad Rooks, um ;mito underground; segundo Claudio Willer, o longa narra a história de um escritor que troca Nova York por Paris para se desintoxicar, mas acaba perambulando, alucinado, por ruas e bares da cidade-luz. No elenco estão William S. Burroughs e Allen Ginsberg, além do saxofonista e compositor de jazz Ornette Coleman.

Longas e curtas narram histórias sobre o movimento que se destacou pela contestação

; Entrevista / Claudio Willer

O que havia no contexto social e político daquela época que propiciou o surgimento desses autores?
O termo Geração Beat foi criado por Jack Kerouac, em 1948, em uma conversa com o narrador John Clellon Holmes. Ele pretendia intitular Na estrada como Beat generation ; nessa obra, escrita em março de 1951, ele já se refere a seus amigos como ;geração beat;. A escolha foi por comparação e contraste com a Lost generation, ;Geração perdida; da década de 1920, de Hemingway e Fitzgerald. Mas, como observei em um dos meus ensaios, enquanto a Lost generation, em face do ambiente repressivo nos Estados Unidos, preferiu exilar-se, os beats enfrentaram esse ambiente, tentaram ocupar os Estados Unidos, promoveram uma rebelião. Tentaram e, em certa medida, conseguiram, penso.

Por que é importante ler os beatniks?

Em primeira instância, pelas mesmas razões para ler literatura de qualidade, em geral: amplia o repertório simbólico, enriquece a percepção. Pelo que traz de matéria para reflexões sobre a relação entre literatura e vida. E, é claro, pelos ensinamentos que advém da rebelião que promoveram.

Qual o legado dos beats para a literatura e para poesia?

Sabe a história daquele rapaz, o Robert Zimmermann, que leu Na estrada e após a leitura saiu de casa e se transformou em Bob Dylan? Pode ser multiplicada em uma infinidade de casos. Influência literária, todos os Hunter Thompson e tantos outros. Nas artes visuais, no cinema (como verão na mostra), na música (perguntem ao Lou Reed....à Patti Smith.... a...), em performances, multimeios e outras experimentações.

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