Ziraldo Alves Pinto, mineiro de Caratinga, gosta de escrever uma história pelo fim. Monta o enredo com o esmero de um artesão, ;sem se esquecer de assoviar jamais;. Reverenciado como um dos principais escritores e ilustradores brasileiros, mestre Ziraldo traz a Brasília um time de personagens criados no fim dos anos 1950, a Turma do Pererê, em cartaz até 27 de novembro. A exposição Pererê do Brasil narra a trajetória de Pererê e seus amigos que viviam (e ainda vivem) da mítica Mata do Fundão. Das tradicionais HQs aos quadrinhos animados digitalmente, o universo genuinamente brasileiro criado por Ziraldo estará nas galerias da Caixa Cultural. Ao Correio, Ziraldo fala sobre o processo criativo e garante que criança é criança em qualquer lugar do mundo.
A Turma do Pererê foi criada no fim dos anos 1960, período do pós-guerra em que os ;heróis; americanos começavam a a invadir nossas bancas de jornal. O Pererê foi uma reação a isso?
Há algum tempo, fazíamos histórias em quadrinho no Brasil. O Pererê surgiu numa época de reação ao imperialismo. Era um momento romântico. Para se ter uma ideia dessa ingenuidade, a Rede Globo queria incluir o Pererê e sua turma na programação, mas com o patrocínio da Coca-Cola, e eu não aceitei. Podia ficar rico, mas não aceitei (risos). Além de brasileiros, a maioria dos personagens tinha uma atitude antiamericana. Era um momento em que também surgia a bossa nova, o poema processo, o teatro político, essa brasilidade toda. O Pererê é resultado disso.
Como é seu processo criativo hoje? Você continua assoviando enquanto desenha?
(Risos) De onde você tirou isso? (risos). A minha filha fez um prefácio de um livro meu dizendo que eu enchia a casa com o barulho do meu assovio e com o arrastar dos chineles (risos) do corredor até o estúdio. Eu assovio o dia todo. É um toque, né? (risos). Mas assoviar não tem nada a ver com o processo criativo. É muito difícil explicar. É uma questão de embocadura. Demora um pouco, mas quando você pega a embocadura você vai embora. Veja o exemplo do poeta Manoel de Barros, a sintaxe dele é uma embocadura presente em todo os seus versos. Ou seja, não existe inspiração, existe embocadura (risos).
Nos dias de hoje você acrescentaria qual personagens à Turma do Pererê?
Não acrescentaria nenhum. Inventaria histórias, simplesmente. Aliás, eu vou criar novas histórias, pois temos um projeto de renascer os personagens do Pererê. Certa vez, meu irmão, Ziralzi, conseguiu vender o Pererê para uma editora francesa. Gostaram da cena tropical, mas a única exigência que eles fizaram foi colocar duas pernas no Pererê (risos). Os cinco bichos amigo dele são todos ligados às histórias brasileiras da carochinha: a onça, o tatu, o macaco, o jabuti e o coelho. Com esses cinco fiz um universo particular. Criei um temperamento para cada e depois foi fácil desenvolver a trama (uma questão de embocadura).
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