Nahima Maciel
postado em 27/10/2016 22:27
Sob gritos de "Fora Temer", aplausos de pé e frente a um auditório lotado, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos recebeu a homenagem feita pela III Bienal Brasil do Livro e da Leitura. Considerado um dos maiores pensadores contemporâneos de esquerda, Boaventura falou sobre os movimentos forçados de populações no mundo e a crise dos refugiados na Europa.
Para o sociólogo, há um preconceito colonialista na Europa atualmente frente aos refugiados. Ele criticou a maneira como o continente lida com a crise. "Continua a haver pessoas que não são pessoas, um sistema de humanidade que só cria desumanidade", disse.
Para Boaventura, houve pouca mudança entre o capitalismo colonialista que gerou a escravidão nos séculos 16, 17 e 18 e a concentração do capital hoje. "O Mediterrâneo nesse momento é um cemitério líquido", garantiu, durante a palestra nesta quinta (27/10), ao comparar a região com o Atlântico. Ele lembrou que ceca de 3 milhões de escravos morriam e ficavam no oceano durante as travessias dos navios negreiros.
O sociologo contou que hoje tenta fazer uma sociologia de escuta para tentar compreender o cenário. "Tenho essa ansiedade de poder fazer ligações (históricas) porque fazer sociologia hoje é fazer essa escuta profunda", disse.
O sociólogo também falou sobre racismo e discriminação das mulheres. A violência policial contra negros no mundo inteiro, lembrou Boaventura, é uma continuação da lógica colonial e leva ao questionamento sobre o que é realmente o progresso.
A violência contra a mulher também pautou a fala do português. "Como é possível que as mulheres continuem a ser tão violentadas na nossa sociedade?", disse.
Sobre a greve das mulheres na Argentina após o assassinato da estudante Lucía Perez, Boaventura comentou: "Imagina se as mulheres têm consciência de seu poder em nossos países. Eles param"
As guerras como instrumento de controle de recursos naturais foi um dos temas da palestra. "É uma violência para continuar a ter acesso aos recursos naturais", garantiu.
Sobre a democracia, Boaventura lembrou que ela foi pensada sem levar em consideração os grandes deslocamentos internacionais dos dias de hoje.
Um novo tipo de deslocamento está acontecendo, segundo Boaventura, do qual pouco se fala. "Há coisas novas, que são os refugiados ambientais, pessoas forçadas a sair de suas terras pela seca. Não é guerra, é a mudança climática que está obrigando as pessoas a sair de suas terras", garantiu. A estimativa é de que haja 2 milhões de refugiados ambientais até 2030.
O sociólogo é um dos principais articuladores do Fórum Social Mundial.