Diversão e Arte

Por meio do afeto, o grupo Aisthesis inova na pesquisa de linguagem

Os integrantes embarcam para Portugal, onde recebem as provocações da bailarina Vera Mantero

postado em 30/10/2016 07:35
Os integrantes embarcam para Portugal, onde recebem as provocações da bailarina Vera Mantero
Eles poderiam não ter feito nada. Pode-se dizer, com certa segurança, que cada um deles estava bem resolvido em seus respectivos ofícios. Gozam de repercussão e reconhecimento. Mas, nem por isso, estavam acomodados. Dispostos a aprofundar os desdobramentos da arte, as possibilidades de criação e as provocações de corpos inquietos, o diretor, dramaturgo e ator Jonathan Andrade; o professor e pesquisador Glauber Coradesqui; a coreógrafa e professora Giselle Rodrigues; a bailarina, atriz e pesquisadora Kenia Dias; e o ator e diretor Francis Wilker Carvalho compõem a amálgama autointitulada Aisthesis. Teatro, dança e performance em uma orgia acadêmica celebrada em plena faculdade do sentir.

Após longo período de pesquisa e experimentações, o grupo quer se abrir cada vez mais para o público e compartilhar essas construções coletivas. A próxima estação será Portugal, onde se encontram com a coreógrafa e bailarina Vera Mantero, referência na dança. E dali, para a rua.

;A primeira fase do projeto, iniciado em 2014, teve esse caráter de pesquisa, de conceito, onde experimentamos algumas questões radicalmente;, explica Glauber Coradesqui, um dos mais colaborativos nomes na pesquisa em artes cênicas da cidade. Nas experimentações, o coletivo acolhia discussões, debates, intercâmbio de ideias que pudessem suscitar reflexão sobre a arte cênica e a expressão física. Mais do que recorrer à teoria, o grupo se permitia sentir o outro, por meio da dança, do corpo livre, de abraços e de afetos. Nas palavras da professora e bailarina Giselle Rodrigues, integrante do Aisthesis e cânone da dança nacional (embora ela refute essas atribuições): ;Aisthesis é uma festa que quebra protocolos estabelecidos em encontros coletivos. Dá espaço a manifestação de desejos, afetos, criancices, intimidades, esquisitices;.

Os encontros geraram não somente (auto)conhecimento e conteúdo de pesquisa, mas também materiais convidativos para quem estivesse de fora, como registros em vídeos e textos provocativos. Eventualmente, eles acolheram o público e aumentaram essa roda de sensações através de sessões abertas, onde qualquer um poderia opinar, criticar ou sugerir. Onde qualquer um poderia dançar, gritar, berrar, chorar e fazer uso da arte como ferramenta de canalização pessoal. E assim foi feito, ao encontro do que o projeto propunha, como o diretor e ator Francis Wilker lembra: ;O Aisthesis tem uma dimensão de democratização do ato criador. Todo mundo tem vez, tem voz, pode compor junto... Um espaço sem hierarquias demarcadas;.
Os integrantes embarcam para Portugal, onde recebem as provocações da bailarina Vera Mantero"A potência do Aisthesis está no tanto que desafia a gente ao encontro com o outro"
Jonathan Andrade, ator, diretor e dramaturgo



Ainda por vir

Vencida essa etapa inicial, a ordem é deixar de lado a esfera acadêmica e se apropriar das ruas, convocando público e pensando em desdobramentos práticos. Glauber, inclusive, consegue pensar em algumas iniciativas recentes que tiveram a influência direta do projeto. ;O espetáculo Fio a fio, de Giselle e Édi Oliveira (que fez parte da fase primária do grupo), traz a força de nossos experimentos, que foram ali incorporados. A Kenia, por exemplo, percebeu que nossa troca de mensagens pelo celular era um diário de bordo coletivo e está se debruçando sobre esse material;, lista.

Não há imposições. Pelo contrário. Eles querem reinventar o Aisthesis, principalmente por meio do contato com o espectador, que ainda não teve ampla oportunidade de conhecer o projeto. ;Ganhar as ruas no sentido metafórico e real é gerar mais e mais encontros com esses e essas que tradicionalmente chamamos de público ou espectador. É abrir espaço, é romper qualquer barreira que separe a possibilidade da troca;, convida Francis.

E será Portugal um dos primeiros palcos dessa segunda fase, na qual eles flertam com o espaço urbano, e com quem o habita. E, por lá, entra a figura da bailarina Vera Mantero, que já esteve com o grupo em Brasília e que, agora, recebe-o em casa. ;Em Portugal, a ideia é conquistarmos a radicalidade tão necessária nos laboratórios e experimentos, apontando para outras possibilidades de composição e organização do material inventado. Uma imersão de corpos do teatro, da dança, da performance, da dramaturgia... Faremos uma mistura de corpos e referências!”, aposta Kenia.

Enquanto isso, eles investem em uma das mais contundentes vertentes da empreitada coletiva, o contato com professores da rede pública do Distrito Federal. Por meio de exposições, aulas e debates, os integrantes do Aisthesis percorrem as escolas e levam a experiência da inter, trans e multidisciplinaridade aos docentes, sugerindo um novo olhar sobre o repertório, a estética e a dinâmica da sala de aula. E mal sabem os alunos que serão eles os mais importantes espectadores do Aisthesis.

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