O mundo precisa de amor. Ainda e sempre. Sobre essa premissa, o cantor Silva lança um projeto em que, inteiramente, fala do mais nobre sentimento pelo viés de um infinito muito particular: o de Marisa Monte. Em Silva canta Marisa, o capixaba criou releituras de 11 músicas de uma das mais importantes vozes da música brasileira. No disco, ainda há a inédita Noturna, composta pelos dois.
O ano prestes a acabar foi tenso, em diferentes esferas. O álbum surge em um momento oportuno, mas nasceu pouco antes, em 2015. Depois de participar de um programa de tevê (Versões, do canal BIS) cantando músicas de Marisa, Silva foi convidado para transpor o projeto para dois shows em São Paulo. O resultado impressionou o cantor, o público e a homenageada. O caminho natural foi registrar tudo em um disco. ;Depois das apresentações ao vivo, ela entrou em contato comigo por e-mail pedindo para nos conhecermos pessoalmente. Fui até a casa dela, no Rio de Janeiro, e compomos juntos. Foi um encontro muito maior do que eu esperava;, relembra Silva. Sem a obrigação da hora cronometrada, comum em estúdios, a amizade se consolidou.
A criação do álbum deságua em corrente que o artista já seguia na carreira. Nos últimos discos, Vista pro mar (2014) e Júpiter (2016), o cantor passou por um processo de valorização da voz, algo que, no EP de estreia, homônimo, de 2011, ficava em segundo plano, como se fosse mais um instrumento. ;No final da adolescência eu cantava muito em casa, mas tinha vergonha de cantar em público. Mesmo quando lancei o primeiro disco, eu me via como um instrumentista, por ser formado em música clássica;, relembra. ;Percebi que pessoas mais novas não conheciam músicas tão importantes, como Ainda lembro. Por mais eu que ache que Marisa não precise que eu faça isso por ela, tão conhecida como é, de alguma forma há quem vá ouvir e querer conhecer o ;original;;, comenta.
Silva canta Marisa
Novo disco do cantor Silva. Slap, 12 faixas. Preço: R$ 25,90.
Duas perguntas | Silva
Você começou a carreira no circuito indie e agora lança projeto sobre Marisa Monte, cantora extremamente popular. Foi uma estratégia para expandir o público?
Não chegou a ser uma estratégia. Claro que sabia que o disco me possibilitaria isso, que expandiria o público, mas a intenção foi simples: registrar as versões que tinha gostado de fazer para o programa, e só virou um disco por conta do meu contato pessoal com a Marisa. Gostei tanto dela como pessoa ; e já era fã desde os 12 anos como artista! Fiquei feliz de ela ser tão legal, e quis registrar esse momento que estou vivendo. Tenho certeza que me abre portas para pessoas de outras gerações. Sou um artista que veio do mundo indie, era tudo um nicho. Senti que, em Júpiter, meu público ficou mais variado com pessoas de outras idades indo aos shows. Acho interessante não ficar restrito a um só publico.
Faz 10 meses que você lançou Júpiter. Qual a ;pressa; em apresentar um novo projeto?
Essa questão do mercado é muito louca. Ao mesmo tempo em que vemos que há uma democratização e os álbuns chegam mais rápido às pessoas, essa velocidade faz com que, depois de alguns meses, o CD pareça velho. É muito mais fácil de ser ouvido, está no Youtube, no iTunes, no celular, a capacidade de enjoar é maior, numa análise não muito profunda. Quando eu gosto de um disco, ele está em todas as minhas mídias. Penso bastante sobre isso no sentido da velocidade, por isso acho que, hoje, não dá para demorar tanto a lançar discos. Além do mais, fazer um álbum é a coisa que mais gosto. A experimentação sonora, criar um conceito, ir atrás disso... Diverte-me e me faz bem.
CRÍTICA***
Simplicidade moderna
Em vez de sintetizadores e camadas eletrônicas entremeadas a cada faixa, Silva canta Marisa é mais orgânico e minimalista ; um contraste com o início da carreira de Silva, que tinha um pé nos anos 1980 no EP de estreia, de 2011. Há menos ousadia nos arranjos, de maneira que o vocal se sobressai. Vez ou outra, uma pegada de reggae aparece aqui, um arranjo mais hightech acolá. Numa atmosfera linear, as faixas soam simples. O tempo e o reconhecimento popular deram ao tímido capixaba a confiança para sentir-se mais à vontade em se expor. É preciso, aliás, bastante coragem para representar músicas que perduram no tempo, a exemplo de Eu sei, Beija eu, Não vá embora e Verdade, uma ilusão. A escolha do repertório mescla faixas mais antigas, que explodiram na década de 1990, a outras mais recentes. O recorte é pessoal, portanto, elimina julgamentos de que faltou essa ou aquela canção, principalmente se tratando de Marisa Monte, com obra vasta, múltipla e que ; para o bem ou para o mal ;, marca a memória afetiva de quem a escuta.