Diversão e Arte

O verão traz a sonoridade da praia também para a capital do país

Saiba mais sobre esse gênero ligado aos surfistas: na onda da surf music

Alexandre de Paula, José Carlos Vieira
postado em 25/12/2016 07:45
O cantor Pablo Dominguez
Praia, onda, sol e música... Ingredientes para umas boas férias são também o que alimenta a surf music desde os anos 1960. Esses ecos da ensolarada Califórnia ganharam reverberação em nosso litoral e chegaram até o Lago Paranoá.

;O rótulo e o significado do que é surf music se expandiram. Nos anos 1960 era um nicho pequeno mesmo, sons bem característicos como Dick Dale e Beach Boys, mas, já nos anos 1970, ia desde rock clássico até reggae; nos anos 1980 a tribo do surf abraçou vários sons da Austrália, como Midnight Oil e Men at Work, até o rock mais pop do The Police;, destaca o guitarrista brasiliense Kiko Peres (Natiruts), que a pedido do Correio, traçou um breve histórico sobre a surf music.

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No final dos anos 1990, Kiko lembra do som de Ben Harper, que abriu caminho para, a partir dos anos 2000, surgir o fenômeno Jack Johnson, um ex-surfista profissional que caiu nas graças das rádios e grande mídia. ;Não só o esporte surf se popularizou e deixou de ser algo restrito a um grupo específico, mas a cultura e a música que vieram junto também abriram o leque e se tornaram multicultural.;

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Mas por que esse gênero ganhou força no Planalto Central? Para Kiko, isso vem lá dos anos 1960, quando muitas famílias chegaram à capital vindas originalmente de cidades litorâneas. ;Era muito comum para jovens da capital irem para praia nas férias. Talvez pela distância, esses momentos marcavam e o brasiliense até hoje carrega essa certa nostalgia do mar, saudades da praia!”

Curiosidade
Guitarrista da banda instrumental brasiliense Super Stereo Surf, Harrison Azevedo admite que parece inusitado tocar surf music na capital do país. ;Soa engraçado e estranho fazer surf music no meio do cerrado, mas achamos que iria no mínimo despertar uma curiosidade na galera de Brasília;, lembra.

Para o guitarrista, o clima do estilo vai além da música e evoca os sentimentos bons da beira do mar, do som das ondas quebrando na areia, ponto de fuga do cotidiano estressante da cidade de concreto. ;Aquela coisa relax, despojada, sempre de bem com a vida que o surf remete era nosso portal de fuga, para sair do estresse, tocar sem muito compromisso. Isso está presente na nossa forma de compor e tocar;, acredita.

Os brasileiros sabem, sim, fazer música de praia, acredita Harrison. Ele cita até, além das bandas Dead Rocks e Retrofoguetes, um outro grupo brasiliense. ;Sou fã de Os Gatunos, de Brasília. Eles fazem um som de primeira, tem timbres certeiros e composições pop total, o show é divertidíssimo;, elogia.

Nossa batida
Nas praias e barzinhos ensolarados brasileiros, a surf music ganhou um bronzeado especial, graças a letras e arranjos de figuras como o baiano Pablo Dominguez, que, entre uma prancha e um violão, criou dois refinados discos Som do mar (2012) e Despertar (2015). Esse amigo do campeão Gabriel Medina, e autor de trilhas sonoras ligadas a filmes sobre surf, revela uma relação muito especial com a natureza, inspiradora de suas canções. ;Tenho a impressão que a música já estava pronta em algum lugar antes de eu começar a cantarolar. Cresci ouvindo rock desde Beatles, Hendrix, Paralamas, Raimundos e Charlie Brown Jr. Essa diversidade sonora me ajudou muito;, diz em conversa com o Correio. Em ano de tanta sofrência, uma música calma e ensolarada refrigera o corpo e a alma...

"O brasiliense até hoje carrega essa certa nostalgia do mar, saudades da praia"
Kiko Peres, guitarista

ENTREVISTA / Pablo Dominguez

A foto da capa do disco Som do mar é do campeão mundial Gabriel Medina. Como foi essa parceria?
Conheci Gabriel quando estive em Maresias alguns anos atrás e depois passei a segui-lo no Instagram. Em junho de 2012, eu já estava quase finalizando o disco, mas ainda não tinha pensado numa capa. Quando vi a foto dele (nas ilhas Fiji, um lugar chamado Tavarua) no Insta, na mesma hora tive certeza que aquela era a capa! Encontrei com ele por acaso no aeroporto de São Paulo e falei: ;Rei, vou roubar uma foto sua e colocar na capa do meu disco novo.; Ele achou que era brincadeira, mas disse: ;Pô, fechado!”

Há muito, a surf music deixou o litoral e começou pegar as ondas sonoras das rádios do interior do país, você faz alguma concessão na hora de escrever as canções para tocar nas FMs? Busca o ;produto comercial;?
Quando estou criando me desconecto um pouco de tudo e resta mais a vontade de escrever algo que estou sentindo. Tento transbordar isso de alguma forma.

A Bahia tem um DNA roqueiro desde os tempos de Raul Seixas e Camisa de Vênus. Como a sua música se encaixa nesse espectro multi sonoro baiano?
Amo o rock baiano. Márcio Mello é um dos artistas que mais me influenciaram na música. Sou um pouco de tudo que vivi e ouvi aqui. A Bahia é massa por isso. Você pode sair de casa num sábado a tarde para ouvir um jazz no Solar do Unhão e acabar a noite na Borracharia ouvindo arrocha e tecnobrega!

Você surfa há muito tempo e agora está criando trilhas para filmes ligados ao esporte. Fale um pouco desse processo criativo.
Quando comecei a usar os programas de gravação em 2007, surtei! Fiquei quase um ano sem fazer show. Não queria mais sair de casa! Encontrei meu Atari (risos), meu joguinho perfeito. Sempre fui apaixonado pelos filmes e suas trilhas. Descobri a maioria dos sons que curto até hoje assim e vem sendo bom demais ver minhas músicas embalando imagens de amigos que também amam o mar e o que fazem!

Um pensador pop diz que o grande lance do surfista não é pegar uma onda para chegar à areia, mas a onda em si, a permanência... Nessa vibe, qual é o seu conceito de sucesso? Sexo, grana e roquenrou?
Sucesso é se manter em pé. As melhores ondas do mundo podem jogar você contra as pedras. Sucesso para mim é resistir ou deslizar.

De Beach Boys pra cá, a surf music anda carrega estereótipos, como o da alienação com o mundo além da praia. Isso mudou?
Acho que a música não tem limites e o mar talvez seja mais profundo do que pareça.

A canção Na paz é um verdadeiro mantra, uma reza... Como você enxerga as transformações do mundo moderno principalmente em relação ao homem e à natureza?
Vejo o mundo passando por um momento de desconstrução de conceitos. Às vezes parece caótico, mas é a roda mudando e girando diferente de novo. A natureza é o tempo. Se a gente quer permanecer aqui neste planeta um pouco mais, é melhor encontrarmos uma forma de desacelerar o trem e rever os ;planos; com carinho.

// Para entrar na vibe

Confira alguns artistas e bandas de surf music

Israel Kamakawiwo;ole
Muito conhecido pela versão praieira e com ukulele de Somehere over the rainbow, o músico havaiano, também chamado de Braddah IZ, gravou álbuns elogiados, como Facing future, e morreu em 1997 por causa de problemas respiratórios, associados à obesidade mórbida.

Beach Boys
Um dos principais grupos do estilo, os garotos da califórnia uniram o surf ao som pop e melódico. Eles se tornaram referência obrigatória quando o assunto é música e surf. O baterista da banda, Dennis Wilson, era, inclusive, um surfista de alto nível.

The Ventures
A banda foi uma das primeiras a trazer o rock pesado para o universo do surf. Com pegada mais radical, eles ficaram conhecidos como pioneiros do surf punk e influenciaram muitas bandas que vieram depois, inclusive grupos do underground brasileiro.

Jack Johnson
Fenômeno nas rádios e em toda indústria fonográfica, Jack Johnson foi um ex-surfista que levou para a música toda a filosofia do mar e do estilo. Do Havaí, Johnson foi, sem dúvida, um dos mais reconhecidos artistas a levar a pegada relax para as canções.

Retrofoguetes
Baiano, o grupo Retrofoguetes propõe uma mistura instrumental de surf music com tango, mambo, jazz, polca e bossa nova. Tudo isso com pano de fundo de cinema, quadrinhos e séries de tevê para formar uma surf music pop e cheia de bom humor. Depois de sete anos parada, a banda voltou aos palcos em 2016.

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