Diversão e Arte

Maestro Soberano da MPB, Tom Jobim faria 90 anos nesta quarta

Maestro autor de uma das músicas mais tocadas no mundo, Tom Jobim foi mestre da brasilidade

Severino Francisco, Irlam Rocha Lima
postado em 25/01/2017 07:30

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Foi Chico Buarque, no primeiro verso do clássico Paratodos ,quem o chamou de ;maestro soberano;. Justo reconhecimento para Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, um artista que ao longo de 67 anos de vida atuando como compositor, arranjador, pianista e violonista criou uma das mais ricas e sofisticadas obras da música popular brasileira, que se tornou notória internacionalmente.

Exemplo disso: Garota de Ipanema, um dos hinos da Bossa Nova, é a segunda canção mais tocada em todo o mundo, atrás apenas de Yesterday, dos Beatles. Mas é no Brasil que a arte de Tom Jobim teve maior relevância, e é mais cultuada ;, mesmo depois de sua morte, em 8 de dezembro de 1994, em Nova York.

Hoje, Tom, nascido em 1927, no bairro da Tijuca, e criado em Ipanema, faria 90 anos. Deixou como legado, além de uma história marcada por grandes momentos, álbuns memoráveis e músicas que fazem parte da memória afetiva de pessoas de diferentes gerações, tanto aqui quanto no exterior. Como não se lembrar de Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim, de 1967, um dos discos mais celebrados do século 20; Elis & Tom, lançado em 1974, que marca o encontro de dois gigantes da MPB, de onde saiu Águas de março, que está entre as mais belas composições do nosso cancioneiro; e Passarim (1987), no qual o maestro expôs toda sua brasilidade.

Tom, que se dizia influenciado por Claude Debussy e Maurice Ravel, fez muito mais pela nossa cultura. Com Vinicius de Moraes, o parceiro mais frequente, e João Gilberto, foi um dos criadores da bossa nova, movimento considerado divisor de águas na música brasileira, que a projetou universalmente.

Na Academia de Tênis

A relação do maestro com Brasília é ancestral. Antes da inauguração da nova capital, a convite do presidente Juscelino Kubitschek, em fevereiro de 1960, ele e Vinicius compuseram a Sinfonia da Alvorada, durante um período em que ficaram hospedados no Catetinho. A primeira audição da peça foi no piano bar do pioneiro Brasília Palace Hotel.

Desde então, Tom veio à cidade várias vezes para apresentações na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional Claudio Santoro e em outros locais. O último show aqui foi em 22 de outubro de 1993 ; portanto, um ano antes do falecimento ; , na extinta Academia de Tênis. Naquela noite, ele homenageou o eterno parceiro Vinicius, que completaria 80 anos se estivesse vivo na época. Quem esteve ali se deleitou ouvindo-o interpretar Chega de saudade, Eu sei que vou te amar, Garota de Ipanema.

Tom Jobim e Vinicius de Moraes só passaram 10 dias em Brasília, em 1960, para compor a Sinfonia da Alvorada, espécie de hino modernista para celebrar a criação da nova capital. Embora fugaz, a passagem pelo Planalto Central foi um acontecimento marcante na vida de ambos. Cariocas clássicos, frequentadores de boates da Zona Sul do Rio, vieram no fusquinha épico de Tom, vencendo 1.300 km de estradas esburacadas. Queriam experimentar a aventura da cidade modernista a partir de uma visão da poeira e da conquista do Oeste.

Em apenas 10 dias, Tom e Vinicius interagiram intensamente com as circunstâncias da cidade que nascia e, por isso, captaram aspectos reveladores do lugar. Tom vislumbrou no Planalto Central ;o lugar mais antigo da Terra;. E Vinicius percebeu que o altiplano tinha ;uma proximidade com o infinito;.

O Catetinho, com sua mata de galeria, parecia um pedaço desgarrado da Floresta da Tijuca no Planalto Central do país. Enquanto Vinicius não ultrapassava os limites do olho d;água do Catetinho, Tom se embrenhava pelo mato para ;conversar; com os pássaros, principalmente as perdizes e as jaós, aves rasteiras do cerrado, de voo abrupto e curto.

A Sinfonia nasceu de uma intensa interação com as alvoradas, os poentes, o silêncio espacial, os gritos de bichos, os cantos de pássaros, as cenas dos candangos na lida diária e as circunstâncias históricas da construção da cidade. As trapalhadas e a má-vontade de Jânio Quadros impediram que a Sinfonia fosse apresentada no primeiro aniversário da cidade, em 21 de abril de 1961. A peça só teve exibição pública em 1986, em Brasília, com a abertura política da Nova República.

Mas a passagem por Brasília deixou vários legados. Tom gostou tanto da cidade que chegou a comprar um lote nas Mansões Dom Bosco, no Lago Sul. Sempre que vinha a Brasília ficava extasiado com a paisagem no entardecer. No entanto, desistiu do projeto de construir uma casa no Planalto e vendeu o terreno. O outro legado é a canção clássica Água de beber, inspirada diretamente na fonte do Catetinho, que recebeu seis gravações só em 1961. Tom bebeu na fonte pura de Brasília.

Hoje, às 21h30, no Feitiço Mineiro, o cantor Salomão di Pádua presta tributo ao genial artista carioca e cidadão do mundo no show 90 Tons de Jobim. Acompanhado por Agilson Alcântara (violão e direção musical), José Cabrera (piano), Paulo Dantas (contrabaixo acústico) e Sandro Araújo (percussão), o cantor maranhense-brasiliense recria canções fundamentais da obra do compositor e parceiros, entre as quais Anos dourados, Estrada do sol, Luiza, além de Samba para Tom Jobim, de autoria de Carlos Elias, responsável pela direçãogeral do show.

Confira 10 aberturas de novela com músicas de Tom no blog Próximo capítulo.


Entrevista/ Paulo Jobim

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Nos passos do pai

; Alexandre de Paula

Especial para o Correio

Filho de Tom, Paulo Jobim seguiu a carreira na música e no piano, mesmo que o pai sempre o tivesse deixado livre para escolher o que fazer. Ao Correio, ele conta que Jobim foi muito influenciado pela tradição de compositores da música brasileira e que, apesar de ser visto como um gênio, sempre trabalhou exaustivamente para compor e produzir as canções que se transformaram em clássicos.

Qual foi a importância de Tom para a música brasileira?

Ele foi um grande compositor e era também muito inspirado pela música brasileira e por compositores anteriores, como Ary Barroso, Custódio Mesquita, Dorival Caymmi. Então, tem uma importância, sim, para a cultura brasileira.

Tom tinha um traço de modernidade e de inovação muito
fortes também. Como você vê essas características?

A modernidade vinha da cabeça dele e ele era um cara que trabalhava muito. Para terminar uma música, ele batalhava muito mesmo. E a inovação vinha principalmente na coisa da harmonia com a melodia, a forma como ele trabalhava as duas.

Qual a característica musical mais forte na obra dele?

O piano, a maneira como ele tocava.

Pode contar alguma lembrança com ele que tenha te marcado mais?
É difícil selecionar assim, porque é uma coisa de uma vida inteira que eu convivi com ele. Não tem uma história especial, algo como aquele dia foi assim etc.

Ele te influenciou a se tornar músico?
Não muito, ele me deixou fazer o que queria sempre.

Mas a obra dele influenciou na sua maneira de tocar, não?
Certamente, mas é algo que não sei explicar como, porque é uma coisa que vem desde sempre, desde que eu nasci.

Além da Bossa Nova, Tom flertou com
a música erudita e outros gêneros, certo?

Sim, tem esse lado também. Principalmente nos discos Matita perê e Urubu, ele explorou esse outro lado. Compôs também a Sinfonia da alvorada, que é muito bonita.

Como foi a passagem dele pelos Estados Unidos?

A música dele já estava fazendo sucesso lá quando ele se mudou, já tinham feito discos com o trabalho dele, que tiveram bastante sucesso. Ele ficou por lá batalhando para fazer esse mercado, porque se o cara fica daqui tentando a coisa não vai.

Apesar da aura de gênio, o trabalho dele tinha muito suor e esforço também?
Sim, tinha. Ele era um cara que trabalhava muito, que caprichava bastante no que fazia.

Como está a questão dos direitos autorais dele hoje?
A gente tem uma editora que tem o direito de muitas das músicas, mas outras canções pertencem a outras editores, o que às vezes é um mal. Essa é sempre uma complicação, uma questão chata.


Clássicos de Tom

Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim (1967)

O disco clássico de Tom Jobim e Frank Sinatra, cultuado por muita gente, foi gravado em um mês. Com todas as canções em inglês, o álbum trazia versões no idioma para composições de Jobim, como Dindi e Garota de Ipanema.

Wave (1967)
Jobim já havia lançado alguns discos nos Estados Unidos, mas foi este que rendeu sucesso mais popular e chegou ao quinto lugar das paradas de jazz. O álbum apresentava as inéditas Wave, Triste e Batidinha, escritas em Los Angeles.

Matita perê (1973)
Um dos discos em que o compositor mostra que não era só um músico de Bossa Nova. A junção entre a cultura brasileira e a erudição, com forte influência de Villa-Lobos e outros nomes, revela uma das facetas mais maduras de Jobim.

Elis & Tom (1974)

Lembrado sempre como um dos melhores discos tanto de Tom quanto de Elis, o álbum traz a versão definitiva de Águas de março. Uma curiosidade é que, durante as gravações do LP, em Los Angeles, Elis e Tom discutiram e discordaram muito.

Passarim (1987)
Depois de um longo período focado no mercado norte-americano, este álbum é uma tentativa de Tom de se reaproximar do público brasileiro. É o primeiro disco gravado com a Banda Nova e tem uma sonoridade mais leve e alegre.


Entrevista/ Paulo Jobim

Nos passos do pai


; Alexandre de Paula
Especial para o Correio

Filho de Tom, Paulo Jobim seguiu a carreira na música e no piano, mesmo que o pai sempre o tivesse deixado livre para escolher o que fazer. Ao Correio, ele conta que Jobim foi muito influenciado pela tradição de compositores da música brasileira e que, apesar de ser visto como um gênio, sempre trabalhou exaustivamente para compor e produzir as canções que se transformaram em clássicos.

Qual foi a importância de Tom para a música brasileira?

Ele foi um grande compositor e era também muito inspirado pela música brasileira e por compositores anteriores, como Ary Barroso, Custódio Mesquita, Dorival Caymmi. Então, tem uma importância, sim, para a cultura brasileira.

Tom tinha um traço de modernidade e de inovação muito fortes também. Como você vê essas características?
A modernidade vinha da cabeça dele e ele era um cara que trabalhava muito. Para terminar uma música, ele batalhava muito mesmo. E a inovação vinha principalmente na coisa da harmonia com a melodia, a forma como ele trabalhava as duas.

Qual a característica musical mais forte na obra dele?
O piano, a maneira como ele tocava.

Pode contar alguma lembrança com ele que tenha te marcado mais?
É difícil selecionar assim, porque é uma coisa de uma vida inteira que eu convivi com ele. Não tem uma história especial, algo como aquele dia foi assim etc.

Ele te influenciou a se tornar músico?
Não muito, ele me deixou fazer o que queria sempre.

Mas a obra dele influenciou na sua maneira de tocar, não?
Certamente, mas é algo que não sei explicar como, porque é uma coisa que vem desde sempre, desde que eu nasci.

Além da Bossa Nova, Tom flertou com
a música erudita e outros gêneros, certo?

Sim, tem esse lado também. Principalmente nos discos Matita perê e Urubu, ele explorou esse outro lado. Compôs também a Sinfonia da alvorada, que é muito bonita.

Como foi a passagem dele pelos Estados Unidos?
A música dele já estava fazendo sucesso lá quando ele se mudou, já tinham feito discos com o trabalho dele, que tiveram bastante sucesso. Ele ficou por lá batalhando para fazer esse mercado, porque se o cara fica daqui tentando a coisa não vai.

Apesar da aura de gênio, o trabalho dele tinha muito suor e esforço também?
Sim, tinha. Ele era um cara que trabalhava muito, que caprichava bastante no que fazia.

Como está a questão dos direitos autorais dele hoje?
A gente tem uma editora que tem o direito de muitas das músicas, mas outras canções pertencem a outras editores, o que às vezes é um mal. Essa é sempre uma complicação, uma questão chata.

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