Elas enfrentam, constantemente, diferentes tipos de agressões, nos mais diversos âmbitos. Como forma de sentirem mais segurança e acolhimento, as mulheres têm buscado apoio em projetos sociais feministas. As iniciativas brasileiras têm unido ainda mais quem já teve direitos primordiais negados.
;É um trabalho a longo prazo, mas, sem dúvida, fundamental para promover pequenas e grandes mudanças. Pequenas em nosso cotidiano; grandes por trazerem à luz questões que estão invisibilizadas e que são de responsabilidade de todos, da sociedade ao poder público;, analisa Soraia Mendes, professora de direito penal da Universidade de Brasília.
Cartas de apoio
Visando a melhora da autoestima feminina e o fomento de redes de apoio entre mulheres, teve início o projeto Eu vejo flores em você. Ele consiste no recebimento e envio gratuito de cartas feitas por mulheres para outras mulheres ; mães, filhas, avós, namoradas, amigas etc. Cada mensagem é ilustrada de acordo com o conteúdo, impressa (ou datilografada, caso a remetente prefira) e enviada via Correios para as destinatárias.
Durante um período turbulento na vida da cientista política e idealizadora Daniela Duarte, ela viu na internet uma ilustração que a comoveu. Então, a imprimiu e datilografou uma carta para uma amiga que também passava por um mau momento. ;Foi uma coisa que fez muito sentido e bem para ela. Fez ela se enxergar de uma outra forma, o que é uma coisa muito interessante, quando você está passando por um momento de se duvidar e não ter muita confiança em si mesma;, expõe.
A partir disso, o projeto surgiu por completo na mente de Daniela. Para colocá-lo em prática, ela publicou a ideia em dois grupos de ilustradoras no Facebook. O retorno foi positivo e, em novembro de 2014, o Eu vejo flores em você já estava no ar. ;Amamos o fato de que trabalharíamos efetivamente com algo que juntasse a arte que fazíamos ao feminismo e o incentivo à sororidade;, declara Andréia Ribeiro, que se prontificou a participar logo no início. A iniciativa já conta uma equipe com cerca de 60 voluntárias ; ilustradoras, datilógrafas e organizadoras ; e recebeu mais de 500 cartas.
O Eu vejo flores em você causa impacto não só em quem enviou e recebeu uma carta, mas também nas integrantes da equipe. ;O projeto entrou na minha vida em um momento em que eu estava fragilizada e super desacreditada desse mundo egoísta. Ele me fez ver que ainda há motivo para acreditar. Isso mudou muito a minha perspectiva de mundo, fortaleceu demais a minha militância feminista e me fez ter muito mais empatia e cuidado nas minhas relações com outras mulheres;, conta a organizadora e ilustradora Daniele Paiva.
Além da plataforma de cartas, a equipe também já participou de rodas de conversa e realizou campanhas. Uma delas foi a Cartas para Cristiane, feita em abril de 2015 para a jornalista Cristiane Damacena, que ficou fragilizada após sofrer ataques de cunho racista no próprio Facebook. O projeto abriu um canal para o recebimento de mensagens positivas para ela e, após o término, confeccionou um livro de capa dura e o entregou à jornalista.
Para participar, basta acessar www.euvejofloresemvoce.com e preencher o formulário. Nele, é possível enviar a flor preferida e fotos de referência, para deixar a ilustração ainda mais exclusiva. Quem tiver interesse em fazer parte da equipe deve enviar um e-mail para projvejoflores@gmail.com.
Todas juntas
Na escuridão de uma noite, a jornalista Babi Souza sentiu receio e insegurança ao andar sozinha por Porto Alegre (RS). Com eles, surgiu o pensamento de que as mulheres se sentiriam mais seguras, caso se juntassem nas ruas. E da reflexão nasceu o movimento Vamos juntas.? Seis dias após criar a página no Facebook, 50 mil curtidas já tinham sido atingidas, e, atualmente, são mais de 436 mil. Na rede social, a idealizadora criou grupos divididos pelas regiões do país, nos quais as participantes se comunicam para colocarem a iniciativa em prática.
Não demorou para o movimento falar não só sobre a importância das mulheres andarem juntas, mas também sobre estarem juntas como um todo, sempre prezando pela sororidade. O Vamos juntas? foi conquistando cada vez mais pessoas, à medida que relatos de garotas que tiveram um dia mais seguro, após participar do movimento, passaram a ser compartilhados com frequência.
O alcance alto fez com que a idealizadora decidisse abandonar o emprego e viver de modo autônomo, para se dedicar ainda mais ao movimento. Sobre o futuro do projeto, Babi conta que o aplicativo Vamos juntas? já está em fase de desenvolvimento e será lançado ainda neste ano.
Mais espaço
O Arquitetas Invisíveis é um coletivo que tem como principal objetivo o aumento da representatividade feminina no campo da arquitetura, urbanismo e áreas relacionadas. Na ativa desde março de 2014, as integrantes desenvolvem trabalhos com foco em dar voz e espaço para mulheres ; estudantes e arquitetas ; e já até foram convidadas para dar palestras em faculdades pelo país.
;Quando estávamos na graduação, começamos a debater feminismo na faculdade, e surgiu em uma das conversas a constatação de que no nosso curso, mesmo tendo maioria de estudantes mulheres, nossas referências em sala de aula eram sempre masculinas;, afirma a cofundadora Gabriela Cascelli.
Tudo começou com a criação de uma página do Facebook, que já alcançou mais de 25 mil curtidas, com conteúdo de questionamento sobre o papel da mulher na arquitetura, no urbanismo e na sociedade, além da exposição de exemplos de mulheres talentosas e bem-sucedidas. Depois foi inaugurado o site, que disponibiliza parte do conteúdo levantado nas pesquisas do coletivo.
Também foi lançada a versão impressa da revista Arquitetas invisíveis, cujo conteúdo é selecionado por meio de edital. ;Nós entendemos que arquitetura e urbanismo é muito mais do que ;fazer casinhas;. Nossa área de atuação envolve dinâmicas urbanas, exclusão socioespacial, paisagismo, sustentabilidade, engenharia, design, antropologia, sociologia, história, artes. Por conta disso, tentamos dar essa cara para a nossa revista, abordando questões que não são importantes somente para arquitetas e urbanistas, mas para a sociedade como um todo;, conclui. A primeira edição conta com trabalhos de cinco países, e a segunda já está em fase de organização.
Relatos anônimos
A organização não governamental Temos que falar sobre isso dá voz a mães. Ela oferece uma plataforma de relatos anônimos para mulheres que enfrentaram dificuldades no parto, gravidez e período posterior ; como depressão pós-parto e problemas com amamentação. Após o recebimento do desabafo, uma profissional fica disponível para saber mais detalhes e conversar.
Na plataforma, os desabafos recebem comentários de apoio e também ajudam a fortalecer outras mães que tenham passado por situações semelhantes. ;Diante desse cenário contemporâneo que exclui e desvalida a natureza afetiva das ações humanas e cotidianas, muitas mulheres têm medo de expor os seus sentimentos. Elas sentem vergonha, insegurança, receio e medo de ser julgadas, rotuladas e/ou medicalizadas;, afirma a fundadora Thais Cimino.
;O retorno maior é a rede de apoio que se formou. As mulheres que foram ajudadas por nós ou por outras mulheres que participam da nossa rede se tornam ativas em acolher e apoiar outras mulheres sem julgamento. Não existe uma hierarquia, quem é mais ou menos importante. Todas importamos, merecemos ser ouvidas e podemos ajudar umas às outras;, conclui Thais. Qualquer pessoa disposta a se solidarizar e acolher outras mulheres, além de não julgá-las, pode ser voluntária da ONG.
*Estagiária sob a supervisão de Igor Silveira