Diversão e Arte

Galerias de Brasília investem em projetos para atrair novo público

Os espaços brasilienses começaram a investir em programas de formação de público e começam a ver o retorno do esforço

Nahima Maciel
postado em 02/03/2017 07:31
Conversa com a artista Adriana Vignoli no Centro Cultural Elefante
Formar público é um dos maiores desafios de qualquer galeria ou centro cultural. No entanto, para instituir programas educativos e atividades capazes de atrair visitantes que nunca pisaram em galerias, é preciso investimento a longo prazo, persistência e muita didática. Essa combinação encontra bons resultados em instituições grandes e com orçamentos previamente destinados à área, mas sempre foi uma dificuldade para galerias pequenas e independentes. Mesmo assim, vários espaços brasilienses começaram a investir em programas de formação de público e começam a ver o retorno do esforço.

Este ano, a Referência Galeria de Arte retomará o programa de oficinas gratuitas com artistas, visitas guiadas e encontros, suspensos desde o segundo semestre de 2016, e aposta na formação de público. A maior dificuldade em manter os programas está no lado financeiro do investimento. Mas quando as ações são colocadas em prática, fica difícil quantificar o bom retorno financeiro. ;Atualmente, com a diminuição de custos que a galeria se propôs a atingir, nossas despesas em uma exposição estão bem menores que as praticadas quando estávamos no CasaPark;, explica Onice Moraes, ao se referir à antiga localização da galeria, hoje em funcionamento na 205 Norte. Mesmo assim, ela chega a investir 40% do orçamento de uma exposição em programas de formação de público.

Em abril, o artista Christus Nóbrega realizará uma série de oficinas no próprio para complementar a exposição Brinquedos de criança, na qual apresenta a produção mais recente. Uma rodada de conversas para discutir as obras expostas e um pouco de história da arte vão fazer parte das oficinas. Professor do Instituto de Arte da Universidade de Brasília (IDA/UnB), Nóbrega acredita que as funções de artista e educador estão sempre ligadas. ;Nesse sentido, é importante que os pequenos espaços de agenciamento artístico da cidade continuem estimulando essas trocas e, principalmente, ampliando suas áreas de atuação incluindo sistemas de arte/educação para formação crítica de público;, diz.

No Elefante Centro Cultural, os primeiros passos foram dados com as residências artísticas. Durante um período pré-determinado, os artistas moraram e produziram na galeria. Durante o dia, recebiam a visita de interessados. A partir da experiência, os coordenadores do local ampliaram a residência para encontros e conversas com os artistas. O contato com o público, acredita a curadora Cinara Barbosa, uma das responsáveis pelo centro, é fundamental para atrair novos visitantes. ;Essa é uma tecla que eu, pessoalmente, tenho muito envolvimento;, avisa Cinara. ;Tenho falado muito da importância da formação de público e de agentes educativos.;

Cinara criou o Brasília Plano das Artes, um projeto ainda em fase de viabilização. A ideia é envolver todos os espaços independentes da cidade em um circuito conjunto de visitações. ;Além de um circuito de passeio, o projeto tem foco em agentes de educação que possam trabalhar em parceria com os espaços;, explica. Mas, para isso, é preciso desenvolver infraestrutura como pessoas para receber o público em tempo integral e eventual transporte.

Sustentabilidade

Atualmente, o Elefante abre apenas durante alguns dias da semana e costuma receber visitantes sob agendamento por falta de equipe que possa ficar permanentemente no espaço. ;Formação de público dá sustentabilidade lá na frente;, acredita Cinara. ;A gente nota no público que retorna. Além disso, você começa a ver a pessoa circulando em outros espaços.; Ela constatou que houve um aumento de 40% no público de 2016 em relação a 2014, quando o centro cultural começou a funcionar.

Dalton Camargos começou a promover os encontros com os artistas que fazem exposição na Alfinete Galeria desde o início, quando inaugurou o espaço, em 2013. Em janeiro de 2015, ele acrescentou a presença constante do curador e artista Renato Lins, responsável por orientar os visitantes e esclarecer dúvidas. ;A formação de público é a chave;, acredita Camargos. A Alfinete já recebeu turmas de escolas públicas e das faculdades de artes do Distrito Federal, mas como a infraestrutura da galeria é pequena, as visitas acontecem por iniciativas de professores e disposição dos alunos. Não há ônibus nem lanche para incentivar programas permanentes e parcerias com escolas.

Mesmo assim, Camargos calcula em 30% do orçamento de cada exposição o valor investido na formação de público. ;É uma forma de aproximar, de trazer as pessoas para perto para que não seja um estranhamento lidar diariamente com arte contemporânea. Para que as pessoas vejam que galeria não é algo que você tem que se preparar para ir;, diz. ;É a única forma de construir público para que, lá na frente, tenha uma cena.;

Prática constante e positiva


Em 2016, a Caixa Cultural recebeu um público 408.641 pessoas. Desses, 30.982 foram atendidos em algum dos três programas educativos do espaço. O número foi um pouco menor que em 2015, quando 43 mil pessoas passaram pelo educativo, mais de 10% do total dos 367.144 visitantes que passaram pela Caixa em 2015.

A redução, explica Ana Luiza Fraga, gerente do espaço, se deu por conta num pequeno atraso na licitação para contratar a empresa responsável pelo educativo. O retorno, no entanto, é enorme. ;Os programas educativos fazem com que as pessoas experimentem a Caixa , interajam. Eles refletem no acesso à cultura. Não queremos só mostrar que tem uma exposição e que é gratuito, mas fazer com que pessoas que nunca foram a uma exposição voltem;, avalia Ana Luiza.

A Caixa Cultural trabalha com quatro frentes de formação de público. Os atendimentos agendados estão abertos a pessoas de 3 a 70 anos. Como são feitos previamente, o espaço pode escolher a metodologia adequada de acordo com a demanda. ;E com especial atenção para estudantes da rede pública,; que são nosso foco, ; idosos e deficientes;, diz a gerente. As oficinas são destinadas a um público adulto e têm como objetivo familiarizar os participantes com técnicas e linguagens apresentadas nas exposições do espaço. Encontros e ações temáticas focadas em datas especiais são a terceira opção. Além disso, a Caixa também investe na formação de pessoal na área.

Exemplo


O Museu do Louvre, em Paris, é o mais visitado do mundo. Recebeu, em 2016, 8,6 milhões de visitantes. O programa educativo da instituição é um dos mais elaborados e longevos da museologia contemporânea. Vários programas importantes são tocados pelo museu. Em Perguntas de crianças, por exemplo, os jovens visitantes são estimulados a formular perguntas sobre determinadas obras apresentadas em sala de aula por um curador do museu. As sessões são gravadas e disponibilizadas online com a respectiva indicação da escola na qual aconteceu. É uma forma de levar o museu à sala de aula. Quando a criança se encontra, de fato, em frente à obra, já teve contato com os aspectos principais da peça.

Visitantes de todas as idades também podem participar de várias oficinas, inclusive em família. Há desde os ateliês para aprender a fazer os croquis diante das obras até aulas de fotografia de obras de arte para incorporar noções de composição, enquadramento e iluminação. Em 2015, o museu francês investiu 2 milhões de euros do seu orçamento de 105 milhões em atividades educativas.

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