Diversão e Arte

Cineasta brasileira busca memória da ditadura na "pornochanchada"

Durante a ditadura no Brasil, este gênero se tornou uma forma de expressão da crítica ao regime

Agência France-Presse
postado em 22/03/2017 19:18
A cineasta brasileira Fernanda Pessoa disputa este ano o prêmio de melhor documentário no Festival Cinelatino de Toulouse com "Histórias que nosso cinema (não) contava", uma imersão na pornochanchada, gênero popular durante a ditadura, que esconde traços da memória histórica.

As populares comédias com forte teor sexual que encheram os cinemas brasileiros na década de 1970, durante a ditadura, podem ajudar a entender a história atual? Para Pessoa, a cultura de massas é um diálogo com a memória.
"Com meu filme, o que proponho é repensar a história do Brasil. Pois acredito que há coisas que, embora não concorde, devo conhecer", contou Pessoa à AFP.

O Festival Cinelatino explicou em sua programação que a pornochanchada é um neologismo que mistura o pornô com a "chanchada", termo com o qual ficou conhecida a comédia picaresca. Durante a ditadura no Brasil, este gênero se tornou uma forma de expressão da crítica ao regime.

"Por meio das comédias eróticas que escapavam da censura, as cruéis relações empresariais, a misoginia forçada, o racismo e a violência política passavam pelo filtro como um humor obsceno", explicaram os organizadores do Cinelatino, que acontece em Toulouse de 17 a 26 de março.

Violência sexual como entretenimento

Para Fernanda Pessoa, de 30 anos, este filme permitiu que entrasse em um período da história que não viveu, já que nasceu depois da volta à democracia.

"Há todos os tipos de filme que você possa imaginar. Velho Oeste, policiais, e até filmes políticos categorizados como comédias", explicou.

"Cerca de 10% destes filmes são políticos, havia intelectuais que tentavam introduzir conteúdos escondidos", indicou.

Para Pessoa, o mais difícil foi a violência sexual contra as mulheres, em que as mulheres que participavam dos filmes eram submetidas a assédios e estupros como parte de um produto de entretenimento.

"Muitas dessas cenas não consegui ver depois da montagem. É muito duro", contou.

"Há uma coisa que eu gostaria muito que as pessoas entendessem: sempre há traços da história nos produtos culturais. Acredito que ninguém pense que produtos de massa como os ;blockbusters;, como ;Transformers;, possam nos ensinar alguma coisa. É político", explicou.

Pessoa acredita que no Brasil a memória histórica não é preservada.

"E como não se olha para a história, a história se repete. Cometemos os mesmos erros e isso é o que está acontecendo agora no Brasil", disse.

"É muito importante recordar esta história tão dura que vivemos para tentar compreender como isso aconteceu, para que não se repita nunca", concluiu.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação