Diversão e Arte

Músicas sociais de Kendrick Lamar chegam ao topo da Bilboard

Novo disco do cantor está entre os mais ouvidos das listas de sucessos

Ronayre Nunes
postado em 03/05/2017 07:30
Kendrick Lamar fez disco com letras de contexto social e político
Menos de 24 horas. Esse foi o tempo necessário para que o novo trabalho de Kendrick Lamar quebrasse o recorde de streaming do Spotify para álbum mais tocado em apenas um dia, com mais de 4 milhões de reproduções. Quatro dias. Esse foi o tempo necessário para que Damn chegasse a o topo da Bilboard 200, a lista dos 200 álbuns mais vendidos em solo norte-americano. Os números de Kendrick Lamar impressionam por si só, porém, entender as razões para esses números estratosféricos acontecerem é o mais importante.

;O sentimento, o sentimento de falsa liberdade. Parece que sou só eu. Olha, eu sinto como se não conseguisse respirar;. O trecho da música FEEL ; uma das faixas de Damn; pode ser uma das representações dessa razão. As 10 músicas mais ouvidas na América do Norte ; de acordo com o Instituto Nielsen, divulgadas na revista Bilboard ; versavam, basicamente, sobre relacionamentos, festas ou viagens. Kendrick está mudando esse parâmetro das paradas de sucesso para uma perspectiva mais político-social.

Contexto histórico

O rappper não está fazendo uma estreia de críticas sociais em músicas, como lembra o professor do departamento de música da Universidade de Brasília, Hugo Leonardo Ribeiro. Segundo o especialista, o próprio hip-hop nasceu com o objetivo de expor o que muitos sofriam diariamente: ;O hip-hop fez história com essa característica de questionamento, mesmo, às vezes, não estando no mainstream, é algo que existe, sempre existiu;, aponta.

O professor Roberto Santos, especialista da escola de música BsB musical, concorda plenamente com as palavras de Ribeiro: ;A música é muito cíclica, é importante perceber que o hip-hop sempre teve características sociais, mas eventualmente com mais ou menos atenção da mídia;. Seguindo a linha dos especialistas, desde os anos 1990, artistas como Lauryn Hill, Tupac, Notorious B.I.G., Nas e tantos outros levaram músicas de resistência ao topo das paradas. Mas então, qual a importância político-social que o novo álbum de Kendrick Lamar traz?

A política atual

Tamir Rice, Sam Dubose, Freddie Gray, Eric Garner, Phillip White. Esses são os nomes de alguns dos mortos por violência policial nos Estados Unidos nos últimos meses, os cinco eram negros. Em consequência, o país passou por uma onda de protestos que evocavam o quanto o preconceito racial ainda é uma ferida aberta nessa nação.

De acordo com pesquisa do jornal Washington Post, a taxa de norte-americanos que consideravam o racismo um ;grande problema; era quase de 50% em 1995. A taxa caiu para 26% em 2009, para retornar à posição de 50% em 2015. A grande importância de Lamar é trazer essa discussão aos olhos do mundo.

Segundo o professor Ribeiro, Damn está mostrando uma questão que precisa ser discutida. ;Existe um problema de conflitos raciais no mundo, e isso, claro, tem repercussões nas artes. A música, como qualquer meio de expressão, é um reflexo do que a gente está vivendo;, explica. O professor ainda completa: ;Essas canções já estiveram aí, em algum contexto, o que o Kendrick faz é levar a mídia a perceber esse movimento, é uma exposição do sucesso dele. A partir do momento de maior destaque, outros artistas verão que é uma coisa que pode dar certo. Acho que artistas de um contexto questionador se sentirão mais representados;.

Em entrevista ao jornal norte-americano The New York Times, Kandrick sintetizou o sentimento em relação a Damn: ;Eu penso agora sobre o quão retrógrado as coisas ficaram nos últimos meses. Meu foco agora é, essencialmente, me voltar para a minha comunidade e às outras comunidades ao redor do mundo que fazem um trabalho de base;.

Novo cenário

Kendrick Lamar não está sozinho neste novo panorama. Nomes como Run The Jewels, M.I.A., Vince Staples, Janelle Monae e Chance The Rapper, são alguns que estão conseguindo cada vez mais expressão no topo das paradas mundiais, o último, inclusive, está cotado para concorrer à prefeitura da cidade de Chicago em 2018, tamanha a expressão político-social.

Estagiário sob a supervisão de Severino Francisco

Em Lemonade, Beyoncé também tem  abordagem social
Lançamentos
No último domingo, o álbum Lemonade, da cantora Beyoncé (foto) completou 1 ano de lançamento. O trabalho é um exemplo de como na frente mais pop a música que aborda questões raciais também ganhou espaço. De acordo com o professor Roberto Santos: ;Nos anos 1990, essa música pairava em um contexto político-social forte, mas de uns anos para cá, tem acontecido uma espécie de retorno;, defende.


Criolo é outro que imprime perspectiva social às letras
No Brasil, o movimento também se mostra forte. O cantor Criolo (foto) lançará o novo álbum de trabalho ; Espiral de ilusão ; no dia 28, o primeiro single, Menino mimado, já pode ser conferido pelo público, e a resistência na letra é clara: ;Meninos mimados não podem reger a nação, eu não quero viver assim, mastigar desilusão, este abismo social requer atenção;, canta Criolo. Já o rapper Projota pretende lançar o novo álbum A milenar arte de meter o louco até o meio do ano. O novo single Antes do meu fim, divulgado no começo de abril, deixa evidente o desejo de tocar em temas sociais: ;Todos estão cheios de opinião sobre assuntos banais. Eu sei que vocês querem a revolução, mas só são Che Guevara nas redes sociais;, versa.

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