Irlam Rocha Lima
postado em 07/06/2017 06:00
Em 2012, ao ser perguntada quando se aposentaria, Bibi Ferreira respondeu: ;Eu me aposentar? Não. Por três razões: Estou bem, ia ficar triste e preciso trabalhar;. Aos 95 anos recém-completados, a grande diva das artes brasileiras mantém-se em plena atividade e faz planos para o futuro.
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No momento, a atriz e cantora cumpre turnê com o espetáculo 4XBibi, no qual interpreta clássicos da obra de Amália Rodrigues, Carlos Gardel, Frank Sinatra e Edith Piaf ; ícones da canção de Portugal, Argentina, Estados Unidos e França, respectivamente. Todos eles, anteriormente, foram reverenciados por ela em musicais que marcaram a trajetória dela.
Preparado especialmente para a comemoração dos 95 anos da intérprete, 4XBibi conta com a participação de um sexteto, sob a regência do maestro Flávio Mendes, responsável também pelos arranjos e pela direção musical. Há, ainda, a intervenção de Nilson Raman ; que assina o roteiro com Bibi ; ao narrar fatos e curiosidades relacionados aos homenageados. Ele lembra, por exemplo, que Amalia Rodrigues assistiu à artista brasileira cantando Piaf nada menos que 14 vezes, em Lisboa.
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Bibi teve momentos marcantes em 75 anos de carreira, como protagonista dos musicais My fair lady, O homem de La Mancha (em que contracenou com Paulo Gracindo), Brasileiro, profissão esperança e Gota D;Agua. Ela aponta esse último como o mais importante. Mas Piaf, foi o de mais longevidade e de maior sucesso.
A Brasília tem vindo com vários dos seus espetáculos. No ano passado trouxe o Bibi canta Sinatra, apresentado no auditório master do Centro de Convenções Ulysses Guimarãres, para onde volta na sexta-feira com o 4XBibi ; já visto em Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Nova York. Em todos os locais foi aclamada pelo público.
A influência do mestre Procópio Ferreira (pai de Bibi) foi determinante para que você seguisse a carreira artística?
A história com meu pai tem duas vertentes. A primeira é que ele precisava de uma novidade para estrear a nova temporada em 1941. O conselho veio de um amigo, o grande intelectual Gastão Pereira da Silva: ;Procópio, lança tua filha!”. Papai foi até a casa da minha mãe e pediu autorização. Mamãe deixou. Na época não pensaram em me perguntar. (risos). E assim foi. Estreei ao lado dele. Por outra vertente, logo percebi a dimensão do meu pai enquanto artista. Ele era muito culto, muito admirado, fazia muito sucesso. Arrastava multidões na época que não existia a televisão.
De La Locandiera, de Goldoni, em que interpretou Marandolina até agora, são passados 75 anos da sua estreia nos palcos. Que avaliação faz dessa trajetória?
Sou uma mulher do palco. Gosto do que faço. Sempre dou o meu melhor. Sempre. Quando entro em cena o mundo muda, tudo muda. Sei que estou ali para fazer o meu melhor. Sei que não vou ser interrompida. A sensação que tenho, já falei isso outras vezes, é que nessa comunhão entre palco e plateia no palco, me encontro com Deus. Sou muito orgulhosa da minha carreira. Tenho consciência de como é difícil ter uma carreira. Mas também sei do que me entreguei e entrego até hoje para estar aqui.
Manter-se em cena aos 95 anos representa o que para a grande diva das artes brasileiras?
Não gosto muito de números, mas, sim, são 95. Eu me sinto muito feliz pela minha lucidez, por ainda estar nos palcos, viajando com meus shows. Adoro cantar. O repertório desse meu show é lindo. É muito bom cantar canções tão bonitas. Meu pai sempre dizia que definitivo mesmo é a velhice porque a juventude é passageira. E é isso mesmo. O importante é ter saúde.
A sua decantada versatilidade a levou a focalizar a obra de Amália Rodrigues. Edith Piaf, Carlos Gardel e Frank Sinatra, cantando em português, francês, espanhol e inglês. Em qual desses espetáculos se deparou com maior dificuldade, mesmo tendo o domínio da língua?
Foi com a Amalia Rodrigues pela proximidade com o português falado no Brasil. Foi um trabalho muito minucioso. Palavra a palavra. Tive a direção do poeta Tiago Torres da Silva, que fez esse trabalho comigo.
Qual foi o critério para escolher as canções desses espetáculos e reuni-los num só musical?
Partimos do melhor de cada um, do que mais gostava de cantar. É um repertório lindo. De todos o que mais gosto de cantar é o Sinatra. Old man river, Night and day, That s life... são grandes canções.
Fala-se que há um espetáculo sendo preparado para sua despedida dos palcos. O que vem por aí?
Estou pensando muito. Meu empresário me disse que está conversando para eu voltar a ter um programa na tevê, um musical recebendo convidados, cantando muita coisa bonita. Gosto muito dessa ideia, por conseguir atingir todo o país. Se isso sair, sim, irei diminuir as turnês, viajarei menos, bem menos. Se não, continuarei minhas viagens do mesmo jeito. A palavra ;parar;, ou ;se aposentar; não fazem parte do meu dicionário.
Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg são raras contemporâneas suas que se mantêm em atividade. Quais foram os outros que, no seu entendimento, deram importante colaboração à cultura brasileira?
São muitos nomes. Muitas gerações, desde a do meu pai, claro. Madame Morineau, Gianni Ratto, Flavio Rangel, Dulcina de Moraes, Dercy Gonçalves, Eva Todor, a família da Marilia Pera toda. É muita gente. O teatro é feito por muita gente, por cada homem que abre a cortina de cada teatro em todo o país.
Quem são os artistas das novas gerações que têm a sua admiração?
Olho com grande satisfação o amadurecimento que nossa arte passa e tem passado. São muitas pessoas criando, escrevendo, compondo, fazendo. O nosso teatro musical cresceu muito, temos grandes talentos, uma nova geração, ótima, pronta para novos desafios. Tenho preocupação com a falta de escritores. Sei que tem muita gente escrevendo, mas pouca coisa boa. A música brasileira é sensacional. Diversa. Nossos artistas são de extremo talento. Acho que poucos países têm uma classe artística tão talentosa.
Tem acompanhado de que forma o momento conturbado da vida nacional?
Com muita tristeza e decepção.
Que saída aponta para que o país volte à normalidade?
Pensar no momento do voto. Outro dia me falaram de uma campanha de não reeleger ninguém. Mas ninguém mesmo. Fazer uma limpa na vida pública do país. Fiquei com muitas dúvidas, mas talvez seja mais sensato para um novo momento que precisamos.
SERVIÇO
4XBibi
Musical com a atriz e cantora, acompanhada por sexteto, sob a regência do maestro Flávio Mendes e participação e Nilson Raman, sexta-feira, às 21h, no auditório master do Centro de Convenções Ulysses Guimarães (Eixo Monumental). Ingressos: R$ 70 (poltrona superior), R$ 90 (poltrona B), R$ 100 (poltrona A), R$ 120 (poltrona lateral), R$ 180 (poltrona gold) e R$ 250 (poltrona front gold) ; valores referentes à meia entrada. Não recomendado para menores de 12 anos. Informações: 3554-4005.