Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Sávia Dumont lança romance inspirado nas histórias do diário de tia-avó

Incesto, prostituição, violência, união e coletividade são assuntos do livro 'Correndo trecho pelo rio São Francisco'

Há algum tempo, uma tia-avó procurou Sávia Dumont para pedir que lesse e guardasse seus dois diários escritos entre 1922 e 1946. Nas páginas amareladas, a tia falava sobre memórias sexuais. Sávia achou tudo muito forte e, inspirada pela história, decidiu escrever o primeiro romance. Correndo trecho pelo rio São Francisco, que será lançado hoje no Carpe Diem, não chega a ser a história da tia, mas trata de um universo parecido.

Sávia achou que os diários poderiam ser constrangedores para a família e decidiu criar uma ficção baseada nos relatos que ouviu entre a adolescência na região do São Francisco e o trabalho de capacitação que realiza com o Grupo Matizes Dumont, do qual é uma das integrantes. ;Quando li os diários, vi o tanto que era importante para as mulheres do século passado contar suas histórias porque elas viveram sob o jugo dos homens, viveram muita violência e não conseguiam sair disso;, conta.

No livro, uma mulher vai em busca da história da própria família e encontra Elisa, uma prima da mãe responsável por contar as memórias que devem abastecer um livro. Incesto, prostituição, violência, mas também união e coletividade povoam o universo da personagem inspirada em pessoas que Sávia cruzou inúmeras vezes às margens do São Francisco. ;Eu quis mostrar como uma mulher que viveu tudo isso ainda ajudou outras mulheres;, avisa. ;Queria mostrar a luta da mulher por sua liberdade, pelo amor, pelo sexo.;

Sávia é uma das integrantes do Grupo Matizes Dumont, que reúne três gerações de artistas de uma mesma família de ilustradores que têm no bordado o suporte para criar. Juntos, eles já produziram 25 livros, incluindo ilustrações para textos de Rubem Alves, Thiago de Mello, Marina Colasanti, Ziraldo e Jorge Amado. Sávia participou de 10. Correndo trecho pelo rio São Francisco é seu 11; livro e primeiro romance.

As andanças de Sávia ajudaram a construir a história de Elisa. Por meio do Instituto de Promoção Cultural de Pirapora, criado pela própria família, a autora viaja a pela região do São Francisco para capacitar mulheres para a geração de emprego por meio do bordado. ;Parte da história do livro é verídica;, avisa. ;Muitas mulheres que se reuniam na margem do São Francisco eram doceiras, cozinheiras, lavadeiras de dia e, à noite, eram prostitutas para complementar a renda. E muitas mulheres que acabavam em prostíbulos eram vítimas de violência familiar, abandono.; Para lutar contra os maus-tratos tanto domésticos quanto no cotidiano da profissão, elas se juntavam em coletivos e se protegiam umas às outras. ;E o livro tem toda essa questão da mulher de se juntar coletivamente para se fortalecer. Eu quis mostrar a importância do empoderamento feminino para fugir do seu destino;, explica Sávia.

Correndo trecho pelo rio São Francisco
De Sávia Dumont. Edição Matizes Dumont, 200 páginas. R$ 60. Lançamento hoje, às 19h, no Carpe Diem (SCLS 104)