Diversão e Arte

Autores de literatura erótica em Brasília fazem sucesso na internet

Obras de nomes como Janaína Rico já foram lidas por mais de 110 mil pessoas

Nahima Maciel
postado em 03/03/2018 07:00
Escritor Janaína Rico
A literatura erótica produzida em Brasília tem várias nuances. Há quem escreva para mulheres independentes, há quem se posicione a partir da perspectiva masculina, há quem colete histórias alheias para transformar em contos e há quem prefira algo mais sutil e menos, digamos, descritivo. Em todos os casos, há um público leitor cativo e atento para tudo que se publica na área. E nesse universo há vários tipos de fenômenos. O Diversão conversou com alguns autores brasilienses ou radicados em Brasília que se dedicam ao gênero. Em alguns casos, a cidade serve até de cenário para as histórias eróticas.

Janaína Rico
Janaína é um fenômeno nas plataformas digitais. Seu Apimentando, história de uma sexóloga frígida, contabiliza mais de 110 mil leituras e Ser Clara, um romance que se passa em Brasília, ultrapassou os 26 mil exemplares vendidos sem nunca ter frequentado estantes de livrarias. A autora, brasiliense de 38 anos e ex-servidora pública que largou o Direito e um emprego no executivo federal para se dedicar à literatura, acredita que o sucesso vem das temáticas abordadas.

As personagens de Janaína são mulheres independentes e autônomas, bem diferentes da mocinha frágil e submissa que povoa escritas como a de E. L. James em Cinquenta tons de cinza. Para Um doce de confeiteiro, romance mais recente, a autora criou uma personagem que consegue emprego em Londres e vai acompanhada do namorado. ;Livros como Cinquenta tons têm uma pegada meio machista, geralmente o homem é gostosão, rico, dominador, e a mocinha é mais pobre, insegura;, descreve. ;Tento fazer uma pegada diferente, desconstruir esses padrões, colocar mulheres empoderadas e, de forma alguma, aceitar esses relacionamentos abusivos.; Temas polêmicos como estupro e distúrbios alimentares também são tratados nos romances.

Janaína já publicou 11 livros, dos quais três são eróticos. Ela fez o caminho inverso ao de muitas autoras de chicklit: publicou primeiro a edição impressa para depois migrar para plataformas digitais como KDP e Wattpad. O romance erótico é um gênero que sempre fez sucesso. ;As mulheres ainda vivem um tabu muito grande em relação à sua sexualidade e, no momento em que a gente coloca esses livros à disposição, abre-se um mundo para o erotismo. Filmes eróticos e outras propostas são muito voltados para os homens, porque são muito visuais. No mundo do romance erótico, a mulher pode viajar, se soltar. Acredito que a literatura erótica tenha uma importância grande para a libertação da mulher;, diz.

Escritora Sinélia Peixoto

Sinélia Peixoto
Foi no consultório de um psicólogo que Sinélia Peixoto começou a esboçar a trilogia Por que eu?, Por que não eu? e Agora sim, sou eu. Depois de um divórcio, a brasiliense de 40 anos encontrou na escrita uma terapia para lidar com as dores de uma separação. Em 40 dias, escreveu as 1.600 páginas da trilogia. Publicou o primeiro volume com uma editora portuguesa, mas depois de um desentendimento, cancelou o contrato e publicou uma segunda edição de forma independente. O livro físico está esgotado, mas pode ser adquirido em e-book e Sinélia calcula em mais de 1.500 o número de exemplares vendidos.

Ela prefere a classificação de romance adulto para descrever a categoria. ;O erótico entra porque sexo faz parte do romance;, avisa. A narrativa, coletada de histórias pessoais e de outras contadas por amigos e conhecidos, é conduzida por um casal cujo casamento está em crise. Os conflitos surgidos da conciliação de papéis como ser mulher, esposa e mãe pontuam a história. ;E eles trabalham muito esses conflitos na cama;, garante Sinélia.

Por que eu? ficou guardado durante 1,5 ano antes de ser publicado. Funcionária da Secretaria de Educação, vice-diretora de escola pública, a autora tinha medo ser discriminada. ;Tem muito tabu ainda, tanto na sociedade quanto na família;, lamenta. Vez ou outra, ela é criticada por pais de alunos que acabam, por curiosidade, lendo o livro.

Escritora Elaine Elesbão

Elaine Elesbão
Quando começou a escrever, em 2012, Elaine Elesbão nem imaginava que a história de Eva enveredaria pelo caminho da literatura erótica. A autora, servidora pública que nasceu no Rio de Janeiro e veio para Brasília com 5 anos, queria contar a história de uma mulher cujo casamento não chegou a acontecer porque o noivo morreu. O sexo entrou na narrativa como forma de falar da intimidade da personagem e acabou por ocupar um lugar importante na trilogia A escalada de Eva.

O livro fez tanto sucesso que chegou a ocupar o primeiro lugar na lista dos mais vendidos da Amazon, e Elaine, 45 anos, é acompanhada por mais de 88 mil pessoas nas redes sociais. Risco calculado, publicado em 2015 pela brasiliense Tagore, narra uma história de abuso e violência doméstica. ;É um tapa na cara;, avisa a autora. ;Um alerta para as pessoas sobre o que é esse tipo de relacionamento. No livro, sexo é uma forma de controle exercido sobre a protagonista. Não faço apologia da violência, nos meus livros vilão é vilão;, esclarece a autora.

Elaine não havia lido Cinquenta tons de cinza quando começou a escrever a trilogia. ;Eu nunca tinha lido nada de literatura erótica;, conta. Ela acredita que os livros de E. L. James são válidos porque levaram para a leitura muita gente que não tem esse hábito. Mesmo assim, ela enxerga na história de Christian Grey e Anastácia uma certa romantização da violência, embora a personagem feminina evolua para algo menos frágil ao longo da saga. ;Toda literatura é válida;, acredita Elaine. ;E esse livro foi um marco para que as mulheres começassem a ler literatura erótica sem preconceito, porque até então todo mundo tinha vergonha.;

Escritora Carla Andrade

Carla Andrade
Para Carla Andrade, escrever prosa erótica começou como uma brincadeira em um blog, com duas amigas. Ela ouvia histórias de amigos e transformava em narrativas curtas e descompromissadas, publicadas sempre sob pseudônimos inusitados, como ;Saia rodada; ou ;Saia de rendinha;. Autora de quatro livros de poesia, Carla vai agora publicar os contos em uma coletânea com o título de EntreSaia (Patuá).

;São textos bem engraçadinhos, soltos, não têm uma pretensão literária tão grande quanto eu tenho com a poesia;, avisa. Entre escrever poesia erótica, uma das marcas de seus versos, e ficção, há uma diferença de postura do sujeito. ;Parece que na prosa há uma exposição menor, o erótico é disperso em vários eus-líricos;, explica. Na poesia erótica, Carla acredita que não podem faltar construção de imagens sutis e cadências que apenas sugerem o erotismo. Já a motivação pode vir de várias fontes: ;Da paixão pela vida. Quando estou apaixonada, do frescor de um relacionamento. De um novo relacionamento;.

Publicar sob um pseudônimo, para Carla, foi uma forma de driblar a discriminação. ;O machismo...na época queríamos ver as reações das pessoas, mas sem exposição. Acho que o machismo será sempre a resposta, infelizmente;, diz a autora.

Oliver Rei
O brasiliense de ;30 e poucos; anos encontrou no noticiário a trama de Um segredo vulgar, livro publicado em capítulos no Google Play e que passou alguns dias entre os sete mais baixados do aplicativo. No jornal, Rei leu sobre um triângulo amoroso que acabou mal depois de um vídeo viralizar na internet e enxergou ali a possibilidade de um livro.

Escreveu os dois primeiros capítulos e está publicando o material aos poucos, como uma maneira de sentir se está no rumo certo. É a primeira vez que o autor publica algo e, para ficar anônimo, decidiu fazê-lo sob um pseudônimo. Ele não revela a identidade nem a idade, muito menos a profissão, mas garante que trabalha em Brasília e na iniciativa privada. A história, ele escolheu porque achou atual e, de certa forma, comum. Queria que os leitores se identificassem com facilidade.

;Nos meus livros, os personagens se preocupam com o que a outra pessoa está sentindo, se está sentindo prazer, se está legal. Porque na maioria dos livros que vejo por aí, parece que o homem é fodão, que não sente nada;, garante. ;Nos meus livros, coloco pessoas mais humanas, mais reais, como se você conhecesse a pessoa do seu ambiente de trabalho.; Um segredo vulgar está dividido em cinco partes e, até agora, Rei disponibilizou duas delas.

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