Ricardo Daehn
postado em 24/05/2018 07:30
Pode parecer uma contradição, mas no filme futurista Han Solo: Uma história Star wars pesa, de fato, uma conjuntura formulada nos idos de 1970. Bem antes de vencer o Oscar de melhor filme e direção, há 16 anos, por Uma mente brilhante, o cineasta Ron Howard (agora, à frente de Han Solo) despontava como talento, atuando no segundo filme do criador da saga Star wars, George Lucas, Loucuras de verão (1973). E, para completar, lá estava Harrison Ford, num papel pequeno, mas fundamental. Tudo isso, bem antes de Ford ser eternizado nas telas como o galanteador de tigela cheia que aplicaria até bullying sentimental com a princesa Leia Organa, numa galáxia pra lá de distante.
Enquanto Han Solo se afirma como um filme de formação, pode ainda indicar as trilhas para o caráter discutível do protagonista que, neste spin-off, promete revelar os motivos pelos quais apregoa eterna insubordinação na franquia assinada pela Lucasfilm e pela Walt Disney. Talhar o destino das origens de Han Solo, pelo que diz o diretor Ron Howard, foi das maiores motivações para assumir as rédeas de um projeto, dado como problemático, e que consumiu mais de US$ 250 milhões na produção. Até o veredito dado pelo Han Solo original ; Ford teria assistido ao filme, e aprovado sua versão jovem feita, claro, por outro ator, com exclamações de que ;ele acertou em cheio: fez (o personagem), do modo dele!” ;, o ator Alden Ehrenreich (de Ave, César) se equilibrou numa corda bamba, ao estrelar um filme cujos diretores iniciais, Phil Lord e Chris Miller (de Uma aventura Lego), foram dispensados, em pleno processo de filmagem.
Antes de chegar às atuais mais de duas horas e vinte minutos de projeção, Han Solo, ainda nas mãos da dupla Lord e Miller, contava com a completa aprovação da performance de Alden Ehrenreich, uma vez que, à revista americana Esquire, eles reiteraram a capacidade dele de capturar o ;espírito da performance; clássica de Ford.
Trazer nuances novas e originais à personalidade de Solo equivaleria à escolha de Chris Pine para viver um renovado Capitão Kirk, em Star trek (2009), como chegaram a comparar os antigos diretores. Com cerca de 70% das imagens atribuídas a Ron Howard, que aceitou assumir o leme do projeto quase naufragado, dada ;a oportunidade; (como disse em entrevistas no exterior), a fita teve, claro, o aval da propaganda de Ehrenreich, capaz de confirmar que ;todos (na equipe) se sentiram rejuvenescidos e entusiasmados em trabalhar no filme;, sob o comando do cineasta de 63 anos.
O pré-lançamento do longa, nos últimos dias, tem aquecido especulações (do conteúdo) e momentos divertidos como o dos stormtroppers perfilados, no tapete vermelho da sessão no Festival de Cannes. Com um videoclipe barulhento para a música This is America, o ator Donald Glover (que, na trama, faz o trambiqueiro Lando Clarissian, personagem, outrora, reservado a Billy Dee Williams) também criou burburinho. Amplitude no ;espectro da sexualidade; de Lando, alinhado ao ressentimento de ;não se ter um personagem mais LGBT; na franquia, pelo que afirmou Jonathan Kasdan (corroteirista da fita, ao lado do pai Lawrence, sempre celebrado por O império contra-ataca) só contribuíram para a noção de pansexualidade impressa pelo coprotagonista. Aliás, já está corrente a ideia de um filme apenas de Lando, para uma futura derivação da série.
Sorte, no jogo...
Um senso de exclusão promete ser desfiado em Han Solo, com o planeta Corellia intermediando momentos opressores não apenas para Solo, mas igualmente para a amada dele, Qi;Ra (papel de Emilia Clarke). Marginalizados, ambos vão constatar a silhueta da formulação da resistência contra o Império tirano, situação que leva ao desejo de fuga. Em Cannes, durante entrevista à publicação Variety, a estrela Emilia Clarke (de Game of thrones), a Qi;Ra, retrucou a pecha de atrelar o currículo à papeis de ;mulheres fortes;: ;Estou apenas interpretando mulheres;, teria disparado.
Repassando a ideia de que ;nas traições sistemáticas, Han nunca será desapontado;, o personagem de Woody Harrelson, Beckett, promete ser uma ponte entre o mercenário Han Solo e um submundo da galáxia apresentada pelo mesmo diretor de Apollo 13 ; Do desastre ao triunfo (1995) e de O código Da Vinci (2006). Com saldo favorável de explosões, por enquanto, o longa tem tido questionada a ação ;sem grandiosidade visual; e o teor de malandragem dos personagens, um tanto ;fora do ponto;.
Homenagens indiretas à história da literatura estão citadas no roteiro que tem (Samuel) Beckett e (John) Dryden ; um crítico do século 17 ; como agentes à margem da lei. Dryden Vos (personagem de Paul Bettany) está líquido e certo como o novo vilão, mas, com breve aparição. Jogatinas, piratas espaciais e trapaceiros têm lugar assegurado na trama em que, nos moldes da paixão pelo primeiro automóvel (de um terráqueo), Han Solo experimentará o voo inaugural na gigantesca Millennium Falcon. Também já deu o que falar, na imprensa estrangeira a tacha de ;monstruosa criatura;, contornada por Chewbacca (Joonas Suotamo), o agigantado chapa de Han Solo, numa relação de amizade que será perpetuada por muitos filmes.