Diversão e Arte

"Indígenas são os maiores ambientalistas", diz diretor de filme

O longa Ex-Pagé traz reflexões sobre sustentabilidade e religiosidade

postado em 06/06/2018 15:39
Vigézima edição do Fica traz reflexão sobre indígenas e sustentabilidade
A temática indígena foi destaque no primeiro dia da 20; edição do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica), na cidade de Goiás (GO). O Ex-Pagé, longa do cineasta Luiz Bolognesi, abriu a Mostra de Cinema do Fica, na noite de terça-feira (5/6), e colocou os indígenas no centro de uma discussão sobre sustentabilidade e religiosidade.

Para o diretor, os grandes ambientalistas do Brasil são os povos nativos. ;A gente esquece que tinham entre 20 e 40 milhões de pessoas vivendo aqui quando os europeus chegaram. E essa gente toda precisava comer e viver, e viviam com uma qualidade de vida interessante. Eles tinham fartura, e seu modelo econômico era um modelo altamente ecológico, que é a agrofloresta;, disse Bolognesi à Agência Brasil.

Assim, o Fica trouxe para o centro da discussão a reflexão sobre a importância do conhecimento indígenas para o pensamento ambiental, de como conseguir produzir alimentos preservando a biodiversidade genética de um bioma. ;As árvores de araucárias foram eles que plantaram. Das matas de açaí, eram eles que disseminavam as sementes. Até a Mata Atlântica foi muito modificada pelos tupis-guaranis que plantavam tudo o que eles precisavam para comer;, exemplificou.

O diretor do filme afirma que o país precisa de novos paradigmas que considerem o conhecimento profundo dos povos nativos da América têm sobre como viver aqui. ;Você pensa que um córrego em uma cidade como São Paulo, Recife ou Salvador, é um lugar onde se joga lixo, urina e fezes. Córrego em um território indígenas é um lugar no meio do mato onde as pessoas tomam banho no final do dia, dando risada e contando causos. Há uma maneira de viver que está em volta dessa produção ecológica;, explicou. ;Nós somos escravos do tempo, eles são senhores do tempo;.

Bolognesi vislumbra que nas próximas décadas haverá esse movimento de troca de saberes e de valorização dos conhecimentos tradicionais. Segundo o diretor, já existem, inclusive, projetos de universidade indígenas, para que os ;brancos; aprendam os saberes indígenas. ;E tem coisas que a gente sabe que são úteis para eles. Eles usam muito a tecnologia, têm trocas interessantes para se fazer;.

Intolerância religiosa

O filme acompanha a história do Pajé Perpera Suruí em meio à crescente evangelização dos indígenas de seu povo. O diretor conta que o pajé só conseguiu se relacionar novamente com a comunidade depois de aceitar participar das atividades da igreja evangélica.

;O pajé está sob ataque, sendo acusado de ser um enviado do demônio. Mas ele resiste. Há uma resistência meio escondida, apesar de o pastor dizer que eles não podem ter aquelas crenças, ainda persiste uma maneira mágica de olhar o mundo, ligada à tradição;, explicou o cineasta.

É um filme de resistência, segundo o diretor, que retrata o processo de aculturação dos indígenas no Brasil e as contradições entre a transformação e a resistência da cultura e dos conhecimentos ancestrais.

O longa já ganhou dois prêmios, no Festival de Berlim e no Festival Internacional de Documentários. Hoje (6), Bolognesi viaja para a Inglaterra, onde o filme compete na mostra ambiental do Sheffield Doc Fest, um dos maiores festivais de documentários do mundo.

Para Bolognesi, as culturas indígenas estão sob um "segundo ataque". O primeiro foi com a chegada dos portugueses e do catolicismo. ;Quando parecia que tínhamos superado esse momento, desde as décadas de 1970 e 80, há uma incursão de igrejas evangélicas;, disse.

O Fica é uma realização da Secretaria de Educação, Cultura e Esporte do governo de Goiás.

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