Robson G. Rodrigues*
postado em 12/06/2018 07:40
No mês dos festejos juninos, é de se esperar que a presença na capital de um dos maiores talentos da música nordestina seja acompanhada de apresentação embalada por xote e baião. Alceu Valença, na verdade, vem para homenagear os 60 anos da bossa-nova entoando João Gilberto e Tom Jobim ; que, fora a brasilidade, são referências distantes daquelas que influenciaram diretamente sua música, tais como Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga.
Cantor, compositor, poeta e, mais recentemente, cineasta, Alceu percorre a estrada artística por mais de quatro décadas. Nesse tempo, produziu mais de 30 discos, um livro e um filme. Desta vez, junta-se ao projeto Prudential Concerts 2018, que passará também pelo Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte e São Paulo entre junho e outubro. Além dele, as cidades vão receber as atrações Maria Rita, Milton Nascimento, Maria Gadú e Rogério Flausino.
Brasília abre a segunda edição do evento com o pernambucano, figura recorrente na capital. Chegou a compor duas canções em homenagem à cidade: Plano Piloto e Te amo Brasília. O afeto com a cidade, sugere o músico, se dá pela semelhança com a própria região natal, de onde vieram milhares de pessoas a trabalho durante a construção de Brasília. ;A presença do Nordeste é muito forte em Brasília. Talvez seja por isso que eu me sinta tão em casa na cidade, que é uma referência pra mim;, conta.
;Minha relação com Brasília é puro amor;, declara, sem deixar de ser crítico à política na canção Te amo Brasília, gravada durante o governo Fernando Collor. ;Mas a canção é também uma promessa de reencontro e esperança;
Convulsão política
A esperança de melhora se mantém no atual contexto político. ;É sem dúvida um momento dos mais conturbados, mas talvez seja necessário passar por uma certa convulsão política e social para que determinados mecanismos sejam transformados;, avalia. O músico cita medidas que considera necessárias. ;É preciso moralizar as relações entre o Estado e o empresariado, mas também é preciso estar atento à geopolítica;, acrescenta.
Durante a ditadura militar, Alceu compunha com bastante simbolismo músicas em protesto ao regime. Hoje, condena pedidos de volta do período que se estendeu entre 1964 e 1985. ;Não acredito que pedidos de intervenção militar possam atender aos verdadeiros anseios do povo brasileiro. Minha geração sofreu bastante com a ditadura, com a censura, e não gostaria de ver aquela triste e truculenta história se repetir;.
Questionado sobre as eleições deste ano, Alceu não descarta candidatos. ;Há bons candidatos na disputa. Mas está tudo ainda muito indefinido, vamos aguardar um pouco mais. É bom lembrar que precisamos eleger também um novo congresso, renovar os quadros com pessoas sérias, honestas, verdadeiramente comprometidas. No mais, é como digo na música: ;Uma nação solidária /sem preconceitos, tomara / tomara, meu Deus!”, diz, citando trecho da canção de Tomara.
Músicas do pernambucano também fazem parte do set list recheado de bossa nova. Ele cantará músicas de Tom Jobim e de João Gilberto. Clássicos de Alceu, La belle de jour e Anunciação não ficam de fora.
Repertório
O encontro inusitado de referências é outro ponto marcante do show, que será regido pelo maestro Carlos Prazeres. Para o maestro, que está curioso sobre o resultado, o show será uma surpresa positiva. A troca de repertório não será problema para Alceu na visão do maestro. ;O gênero é uma bobagem, coisa pequena diante de um músico do quilate de Alceu Valença;.
;Ele vai cantar bossa com tempero de Olinda;, brinca Carlos Prazeres. Maestro há quase duas décadas, atualmente rege a Orquestra Sinfônica da Bahia. Prazeres não poupa elogios ao cantor nordestino e o vê como um dos expoentes da música popular brasileira. ;Acredito que ele seja um dos artistas mais completos da MPB. Ele domina timbres e harmonias muito sofisticadas;, observa. ;Ele vai nos presentear com timbres maravilhosos. E, quem sabe, dedicando um disco dele à bossa nova em algum momento;.
O maestro conta que Alceu não hesitou ao ser chamado para a edição do projeto. Aponta que o convite foi feito dentro conceito do espetáculo, que busca quebrar estereótipos de gêneros. O encontro das músicas populares e clássicas, além da oportunidade de artistas explorarem outros repertórios são algumas das propostas do concerto.
A rouquidão que o período de seca em Brasília pode provocar não deve atrapalhar a apresentação de Alceu Valença. Pelo contrário: ;Me sinto muito bem em Brasília. Inclusive, o ar seco me faz respirar melhor. Fico com a disposição redobrada!”.
Estagiário sob a supervisão do subeditor Severino Francisco
Prudential Concerts convida Alceu Valença
Show com participação de uma orquestra formada por músicos locais. Teatro UNIP (913 Sul). Hoje, às 21h. Ingresso: R$ 35. Valor referente à meia-entrada e sujeito a alteração. Verifique a classificação indicativa.