Irlam Rocha Lima
postado em 27/06/2018 07:35
No começo da adolescência, Oswaldo Montenegro, ao lado dos pais, costumava acompanhar os boêmios que, nas madrugadas saiam em cortejo fazendo serenata pelas ruas da então pacata cidade mineira de São João Del Rey. Por vezes, os músicos eram acolhidos no interior de algumas residências, que os recebiam com carinho, café e pão de queijo.
Aqueles acordes marcaram para sempre Montenegro, e foram decisivos na definição dele de se tornar cantor e compositor. Isso ocorreu quando, aos 15 anos, veio morar em Brasília com família. Aqui iniciou uma vitoriosa carreira que dura quatro décadas e fez dele um artista multimídia, com impressionante produção voltada para disco, teatro, televisão e cinema.
Nada, porém, o impede de estar frequentemente na estrada, a bordo de sucessivas turnês, que sempre passam pela cidade. A mais recente, não por acaso, é a do show Serenata, atração da próxima sexta-feira, às 21h, no auditório master do Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Acompanhado por Madalena Salles (flauta), Alexandre Meu Rei (violões), e Sérgio Chiavazzoli (bandolim e violão), ele explora a sonoridade acústica na interpretação de consagradas canções de sua obra como A lista, Bandolins, Eu quero ser feliz agora, Léo e Bia e Lua e flor, entre outras.
Que importância as serenatas que, no começo da adolescência, você assistia em São João Del Rey tiveram para sua formação musical?
Acho que me tornei músico pelo que vivi nessa época. Meus pais saíam com os boêmios da cidade, madrugada adentro e às vezes me deixavam acompanhar aquele cortejo de amigos cantando e tocando pelas ruelas da cidade. Nenhuma sensação, até hoje, me bateu mais forte. Isso acontecia de madrugada. Durante o dia, nas igrejas de Minas Gerais, a música barroca me emocionava. Eu, criança, não entendia que sentimento era aquele. Com certeza, as músicas que compus durante a minha carreira são uma mistura dessa primeira vivência com o choque de ter me mudado pra Brasília, aos quinze anos.
Em sua obra, Bandolins pode ser vista como a canção mais representativa dessa vertente da MPB?
Sim, acho que Bandolins, Travessuras, Lua e Flor e Estrelas são as que mais resumem esse tipo de influência. Em Léo e Bia, a melodia é filha do barroco mineiro, mas a letra já traz um pouco da aridez fria do Planalto.
Tem algo de saudosismo o fato de criar um show que remete a essa tradicional manifestação cultural brasileira?
Talvez tenha um pouco, sim, porque revivo no palco a sensação que as serenatas me provocavam. A sonoridade do instrumental ajuda. É um show totalmente acústico, em que misturamos a viola de 12 cordas, o bandolim, a flauta e o violão de 6. Às vezes, os músicos tocam no meio da plateia, e isso reforça o sentimento que a serenata provoca. É um show informal, bato papo, atendo a pedidos e conto algumas histórias daquela época.
Além de Bandolins, que outras músicas compostas por você foram incluídas no repertório do show?
A Lista, Sim (do filme O perfume da memória), Em tempo (parceria com Raique Macau e trilha da peça Mayã), Sem mandamentos, A lógica da criação (do filme Solidões), Mel do sol, Intuição (parceria com Ulysses Machado), e outras que surgem por meio do papo com o público.
Há composições de outros autores?
Sim, canto Agonia, composta por Mongol, que acho uma típica serenata.
Há outros projetos para 2018?
Estamos no ar com a segunda temporada da série De sonhos e segredos, no Canal Brasil, e nos preparando para o lançamento de O vale encantando, meu quarto longa-metragem.
Você lançou vários artistas que hoje brilham na música, no teatro e na televisão, entre os quais o Emílio Dantas. Como vê a ascensão desse ator que, depois de se destacar no musical Pro dia nascer feliz, dando vida a Cazuza, atualmente é protagonista na novela Segundo sol, como Beto Falcão?
Vejo como muita alegria e com a sensação de que ele realmente merece. Trabalhei com Emilio muitos anos e, acima de tudo, nos tornamos amigos. Torço muito por ele.
Como é voltar a Brasília ; a chamada Capital do Poder ; no momento em que o país vive um período conturbado nos mais diferentes segmentos?
Brasília não é apenas a capital do poder, é a cidade onde moram meus melhores amigos, em que vivi grande parte da minha família e da qual tenho recordações muito bacanas da adolescência. Por onde passo, tento desfazer na cabeça das pessoas a ideia de que a capital é unicamente sua imagem de noticiários. Ali, mora o garoto que vai com o pai ao futebol, a avó que prepara bolo pra neta, os namorados que passeiam pelo Eixo no pôr do sol, enfim, gente como de qualquer outro lugar.
Tem acompanhado a Seleção Brasileira na Copa? Qual é a sua avaliação?
Tenho acompanhado pra valer. Sou um apaixonado pelo futebol arte. Gosto dos grandes dribles, das jogadas imaginativas, adoro ver os craques jogando. Não tenho muita paciência para os chamados esforçados sem qualidade, ou para grandes teorias que tentam roubar do futebol a mágica que o governa. Para mim, Nelson Rodrigues acertou na mosca quando disse que pra se entender a vida é preciso olhar com atenção pro futebol. Está tudo ali. Pra mim fica claro que sem espírito de conjunto não se vence, mas que, ao mesmo tempo, é o talento que decide. Fica evidente que o talento não dispensa uma estrutura emocional forte e que é preciso relaxar e manter a calma nos momentos mais decisivos. E aí é que a parada fica dura. Tanto no futebol quanto na vida a conotação de esforço tem que ser desligada da tensão. Ficar atento sem ficar tenso. Aí é que está o segredo.
Serenata
Show de Oswaldo Montenegro. Sexta-feira, às 21h, no auditório master do Centro de Convenções Ulysses Guimarães (Eixo Monumental). Os ingressos vão de R$ 75 a R$ 150 ; valores referentes à meia-entrada, à venda pelo site www.bilheteriadigital.com. Assinantes do Correio têm 55% de desconto no valor da inteira. Não recomendado para menores de 12 anos.