Diversão e Arte

Primeiro romance de Fred Di Giacomo mergulha na história de Penápolis

Fred Di Giacomo conta história de região paulista e lança livro sobre a felicidade escrito com a mulher, Karin Hueck

Nahima Maciel
postado em 17/07/2018 07:19
Glüeck foi o projeto de Fred e Karin Hueck sobre a felicidade
O início de Desamparo pode confundir um pouco o leitor. A cada página, o narrador introduz um ou dois personagens. Ao final das primeiras 100 páginas, há uma quantidade enorme de nomes, mas são duas as famílias realmente protagonistas responsáveis pelo desenrolar do enredo. O primeiro romance de Fred Di Giacomo mergulha no universo histórico que deu origem à cidade de Penápolis, no oeste de São Paulo, cidade natal do autor e pequeno espelho da formação dos aglomerados urbanos do estado. O livro chega às prateleiras ao mesmo tempo que Glück ; O que um ano sabático nos ensinou sobre felicidade, resultado de uma experiência empreendida por Giacomo e a mulher, a jornalista Karin Hueck, entre 2013 e 2014.

São dois livros bem diferentes, mas que só foram possíveis por conta de uma mesma iniciativa. Em 2013, Fred e Karin decidiram desacelerar a vida, colocar um pé no freio da carreira jornalística em redações, que vinha se desenvolvendo muito bem há alguns anos, e tirar um ano sabático. O casal queria tocar projetos que acabavam engolidos pela rotina de mais de 10 horas de trabalho diário. Na ponta de tudo estava uma investigação sobre a felicidade.

Berlim foi a cidade escolhida para o ano sabático. É a terra natal da família de Karin e há muito ela desejava passar um tempo por lá. E Glück ; felicidade em alemão ; foi o nome dado ao projeto, que começou como um blog, seguiu por uma pesquisa sobre o tema e entrevistas com especialistas e desembocou no livro. O casal voltou ao Brasil no segundo semestre de 2014 e, em pouco tempo, embarcou novamente na rotina. Karin e Fred voltaram para a empresa na qual trabalhavam antes, tiveram um filho e precisaram, novamente, dedicar menos tempo a projetos paralelos com os quais sonhavam trabalhar. Criador de newsgames, Fred chegou ainda a ser roteirista do programa Conversa com Bial, deu aulas de jornalismo de dados e desenvolveu um programa com uma ONG para formação de jovens da periferia.

No entanto, um problema de saúde do filho fez o jornalista parar um pouco para se dedicar ao garoto. Quando a criança melhorou, ele se viu com um certo tempo livre e submergiu na história de Penápolis para escrever um livro com o qual sempre sonhou. ;Eu já tinha a ideia de fazer um livro que recontasse a história da minha região, de colonização recente, porque ela foi fundada no começo do século 20, e eu tinha feito uma pesquisa histórica e jornalística, lido livros raros, ouvido fitas cassetes com primeiros pioneiros dando depoimentos. Comecei a transformar isso numa ficção;, conta.

Inspiração

Fred brinca que seguiu o conselho dado por Drauzio Varella, certa vez, durante entrevista concedida a Pedro Bial: ;Ele falou que, se você não é Tolstói ou Dostoiévsky, que são gênios e podem escrever bem sobre qualquer coisa, escreva sobre uma coisa que só você pode saber. E pensei: acho que uma coisa que só eu sei é sobre Penápolis, um lugar pelo qual ninguém se interessa e uma história que só eu posso contar;, lembra.

Desamparo parte da realidade e acompanha a vida de duas famílias fundamentais para a fixação do povoado mais tarde transformado em Penápolis. É uma ficção histórica cheia de realismo fantástico, mas o autor avisa: ;As histórias mais absurdas são verdadeiras, o resto é ficção;. A região do noroeste paulista se assemelha à das entradas e bandeiras do século 16, mas com quase quatro séculos de diferença. ;Ninguém conhece a história da região, a gente conhece aquela história geral, meio padronizada e não tinha ideia de que a mesma coisa que o bandeirante fez no século 16 foi feita lá: em 20 anos, exterminaram duas etnias indígenas. São histórias interessantes que ninguém sabia;, garante Fred, que partiu de duas personagens reais, Maria Capa Negra e Maria Chica, paratraçar a narrativa.

A viúva Maria Capa Negra veio de Portugal e foi ama de leite de Dom Pedro II. Como recompensa, ganhou um punhado de terras do imperador Pedro I e seguiu para o interior de São Paulo para tocar o negócio. Usava sempre uma mantilha negra, presente do monarca, e por isso o sobrenome Capa Negra. Massacre de população indígena, um único negro proprietário de terras, questões agrárias, sempre fonte de violência, e mulheres fortes, um acaso na descoberta histórica do autor, marcam a narrativa povoada por figuras reais e tão curiosas que mais parecem ficção. ;Não foi uma coisa que eu pensei vou` fazer um livro com mulheres fortes;, conta Giacomo. ;Mas quando comecei a pesquisar a história da região, duas personagens importantes eram a Maria Capa Negra e Maria Chica. Elas existiram de verdade e tocaram as fazendas sozinhas. Isso me chamou muito a atenção, tinha que aparecer no livro.;

No início, Desamparo contava com cerca de 200 personagens. Depois de uma revisão, o número baixou para 93. Inspirado em clássicos como Cem anos de solidão e sua intrincada rede de personagens e no realismo mágico de Pedro Páramo, no qual Juan Rulfo reconta a revolução mexicana, Fred construiu um romance que reconstitui uma história muito particular e desconhecida.




Desamparo
De Fred Di Giacomo. Editora Reformatorio, 248 páginas. R$ 40



Glück - O que um ano sabático nos ensinou sobre a felicidade
De Karin Hueck e Fred di Giacomo. Editora BestSeller, 144 páginas. R$ 29,90

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação