Nahima Maciel
postado em 12/08/2018 06:33
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Julián Fuks achou interessante o convite feito por Paulliny Gualberto Tort e Beatriz Leal para participar de um festival de literatura e direitos humanos. Seria uma maneira de pensar amplamente sobre uma questão cara ao autor de A resistência, ganhador do Jabuti de 2016 e do José Saramago de 2017.
;Achei muito atípico que, num evento literário, a gente pudesse discutir mais do que literatura e que houvesse coesão entre as mesas;, diz. ;Num contexto como esse, no presente que a gente tem vivido, poder tratar as aproximações entre literatura, política, direitos humanos e a própria noção de liberdade me pareceu de pertinência enorme;.
Fuks participa hoje do Livre! Festival Internacional de Literatura e Direitos Humanos, em uma mesa na qual tem a companhia de Beatriz Leal. O encontro será no Parque Ecológico dos Jequitibás, em Sobradinho, e terá como abertura um recital de poesia com Memei Bastos. Curiosamente, há muitas coincidências entre A resistência e Mulheres que mordem, romance de Beatriz finalista do Jabuti. Uma Argentina da ditadura, exílio no Brasil, crianças separadas de seus pais biológicos. São livros diferentes, mas que fazem o leitor mergulhar numa confusão entre memórias, narradores e autores.
É a história de uma adoção aquela contada em A resistência. Da adoção do próprio irmão de Fuks, cujos pais chegaram ao Brasil nos anos 1980 em um exílio forçado. O irmão adotado nasceu na Argentina e Fuks, no Brasil. Cresceu com um pé em cada identidade e a busca desesperada por aquela que o define está no livro, que é também a história de um reencontro em vários sentidos. É autoficção assumida, embora hoje Fuks prefira a expressão pós-ficção para falar desse gênero literário.
O autor acredita que a autoficção já é algo instalado na literatura brasileira, talvez até mesmo prestes a entrar em fase de desgaste, embora alguns escritores sejam resistentes à classificação. Mas o gênero é também um sinal dos tempos na literatura.
;A autoficção era algo minoritário por um tempo, mas já tem se tornado hegemônico. É uma coisa que ganhou tanto espaço que começa também a provocar resistência. As pessoas sofrem que a literatura possa se tornar exclusivamente isso, ou que os escritores estejam repetindo uns aos outros, ou que tenha desaparecido a possibilidade de falar do outro. Surgem vários medos um pouco disparatados, porque a literatura sempre vai ter como uma de suas marcas a pluralidade, a diversidade;, garante o autor.
SERVIÇO
Livre! Festival Internacional de Literatura e Direitos Humanos
Mesa Democracia em tempos sombrios: O romance como resistência. Com Julián Fuks e Beatriz Leal. Domingo, às 16h, no Parque Ecológico dos Jequitibás. Esquete poética: POEMARIO ; com Meimei Bastos, às 15h15. Entrada franca.
Duas perguntas / Julián Fucks
Você está em um festival de literatura e direitos humanos. Qual o papel da literatura nessa cena?
Tenho uma compreensão de que a literatura participa desse mundo. Ela não retrata nem se propõe simplesmente a pensar a si mesma ou se pensar como arte, ou se pensar como forma. Há uma literatura que se propõe a falar do outro, a fazer uma aproximação à alteridade e essas noções se rupturas e sofrimentos de quebras de direitos alheios. A literatura pode muito bem se inserir nesse contexto, ser mais um discurso a pensar os rumos de um país, as questões mais urgentes que a gente tem visto;, acredita.
Quais são as questões urgentes para você hoje?
Acho que a gente vive num país com uma situação de ruptura democrática muito forte. Nosso sistema político entrou em xeque, e o país tem vivido também um crescimento da xenofobia, do preconceito, de perseguição de minorias, de perseguição de pensamentos discordantes, isso tudo está muito forte, muito presente, e acho que é preciso, em alguma medida, encontrar respostas, encontrar maneiras de diálogo e aproximações que nos tirem dessa situação.