Diversão e Arte

Biografia de Sérgio Reis narra a vida do cantor que também é deputado

A história é contada em Sérgio Reis: Uma vida, um talento, biografia de Murilo Carvalho lançada pela editora Tinta Negra

Nahima Maciel
postado em 16/09/2018 07:15
Sergio Reis não concorda com a separação entre  música caipira de raiz e o sertanejo universitário:

Foi em um baile de debutantes em Tupiciguara, no Triângulo Mineiro, que Sérgio Reis se deu conta de que a carreira dele precisava mudar. Corriam os anos 1970 e o então cantor da Jovem Guarda foi se apresentar na festa. À época, fazia muito sucesso com Coração de papel, baladinha com backing vocal e letra melosa e romântica sobre sofrimento de amor. Depois de se apresentar, enquanto estava no camarim, ouviu outra banda tocar Menino da porteira, de Teddy Vieira e Luís Raimundo. Ao final, o público fez tanto barulho que Reis se impressionou com a empolgação. Voltou para o hotel e, tarde da noite, ligou para o produtor Tony Campello para avisar que queria gravar a música. Campello se assustou com um ;Jovem Guarda; querendo cantar sertanejo.

Reis seguiu em frente com a ideia. Foi assim que adentrou um universo no qual se tornou celebridade. A história é contada em Sérgio Reis: Uma vida, um talento, biografia de Murilo Carvalho lançada pela editora Tinta Negra. Quem conta a história de como Sérgio Reis debandou da Jovem Guarda para o sertanejo é Clayton ;Querido; Barbosa da Silva, com quem formava dupla e viajava Brasil afora.

Alguns dias depois do episódio, em um show em boate de Goiânia, viria a confirmação de que a mudança de lado seria um sucesso. Quando terminou de cantar, um fazendeiro pediu à dupla que tocasse João de barro, de Tonico e Tinoco. Reis, admirador da dupla desde menino, conhecia a música, mas não a letra. Avisou que, se o homem voltasse no dia seguinte, ouviria o pedido. E assim foi. Com uma canção que embalou sua infância, o cantor da Jovem Guarda bandeou de lado e foi fazer o que sabia desde menino.

Neto de imigrantes italianos e portugueses, Sérgio Reis nasceu e cresceu em São Paulo. Como lembra o amigo Eduardo Araújo, entrevistado para a biografia, era garoto da cidade, criado nas festas da Jovem Guarda e com nenhuma ligação com a roça. ;Mas a vida é assim, o destino de cada um vai sendo construído no balanço dos dias;, conta Eduardo. Para ele, Reis se tornou um divisor de águas na música sertaneja e deu uma cara nova ao gênero graças a arranjos sofisticados e introdução de novos instrumentos, como violino e, eventualmente, piano e guitarra.

Reis lembra que foi um caminho natural. O repertório, ele conhecia bem. Ouvia desde pequeno e tocava. Do pai, ganhou uma violinha que tem até hoje, mas, como não sabia afinar como viola, ia como violão mesmo. ;Aprendi a tocar violão na viola;, conta. ;E toquei na violinha como se fosse um violão. Eu conhecia todo o repertório. Não caí de paraquedas. Só que não sabia que a música Menino da porteira era tão forte.; Sair do rock-bobinho da Jovem Guarda para o interior dos causos e da viola, ele garante, não foi difícil. Até porque o movimento de Roberto Carlos e Wanderléa já estava mesmo no fim.

Hoje, quando olha para o gênero e pensa na separação entre a música caipira de raiz e o sertanejo universitário, acha as divergências uma bobagem. ;Hoje, falam de música sertaneja universitária. Isso não existe. Existe universitário que canta. E canta o que a gente cantava na Jovem Guarda. Agora, tem um detalhe importantíssimo. Esse pessoal do interior, eles cantam muito, viu? Tem cantores excepcionais nessa geração. Eles fazem sucesso porque são bons;, garante. ;Se der uma viola na mão deles, eles tocam morrendo de rir. Eles conhecem o repertório todo. Essa divisão é bobagem. Música é música. Eu fiz O filho adotivo, que não é sertanejo, não é nada, e faz sucesso até hoje.;

Discos inéditos

Com 60 anos de carreira, 124 discos lançados, Reis tem mais dois álbuns gravados: um com a mulher, Ângela, e outro solo. No entanto, ele ainda não tem data para lançar os discos. Quer esperar que passem os tempos conturbados. Na política e na vida pessoal. Eleito deputado pelo PRB/SP em 2015, ele não quer seguir na política. Diz que não tem saúde para se candidatar novamente. No último ano, passou por várias internações, fez duas cirurgias, teve um AVC e estava hospitalizado até semana passada. Agora, quer guardar as energias para a música.

Também desistiu da política por frustração. Um dos apoiadores do Hospital do Câncer de Barretos, Reis levanta a bandeira da saúde, na qual garante ter investido R$ 42 milhões de sua verba parlamentar. ;Eu gostei muito de ser deputado. Primeiro porque se adquire cultura. Fica conhecendo os problemas do país e como é dificultoso você administrar um país continental. O que atrapalha muito são esses xiitismos. Um é PMDB, outro é PT, outro PSol, outro não sei o quê. E pensar no povo mesmo, nada. Eles vivem muito mais pelo partido do que pelo que vai acontecer. Isso irrita profundamente porque a conversa sempre é a mesma;, diz.

Simpatizante de Jair Bolsonaro (PSL), ele olha com descrédito para o Brasil contemporâneo. ;Está tumultuado o país. A gente não sabe o que vai acontecer. Está muito triste a gente viver neste país;, lamenta, lembrando que o filho mais novo foi embora para Portugal com a mulher e dois filhos.

Fazer o livro, aliás, também fez o cantor visitar o Velho Mundo. Aos 78 anos, ele reviveu a própria trajetória, mas também a da família. Para falar sobre os avós, ambos imigrantes, foi à Itália e a Portugal visitar as cidades natais da família, coisa que nunca havia feito. ;Eles vieram embora, eram imigrantes, e nunca mais viram a família. Já pensou? Muito triste; Muitas famílias não tiveram mais condição de voltar;, conta.

Parte dessa história será contada no musical Coração sertanejo. Dirigido por Ricardo Fábio e Márcio Macena, o espetáculo terá Leo Chaves, da dupla Victor & Leo, no papel de Reis. ;O pessoal é muito legal, eles querem fazer direito, não querem fazer bobagem. Como meu livro. Meu livro é uma coisa honesta. O que está ali aconteceu na minha vida, graças a Deus;, garante o cantor.

Sérgio Reis: uma vida, um talento
De Murilo Carvalho. Tinta Negra, 256 páginas. R$ 34,90.


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