Diversão e Arte

'O cinema ajudou a construir a ausência da travesti', diz Linn da Quebrada

Em entrevista, a estrela do premiado 'Bixa travesty' Linn da Quebrada conta como o documentário desconstrói imagem negativa atribuída a travestis, segundo ela, corroborada pelo próprio cinema

Robson G. Rodrigues*
postado em 30/09/2018 07:00
Linn protagoniza documentário dirigido por  documentário dirigido por Kiko Goifman e Claudia Priscilla
Linn da Quebrada foi uma das grandes estrelas do 51; Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Ela foi aplaudida de pé por Bixa travesty, longa que saiu do Cine Brasília com os Candangos de melhor filme pelo júri popular e de melhor trilha sonora, além de ser reconhecido com uma menção honrosa do júri oficial e com o Saruê, prêmio do Correio ao melhor momento do Festival.

O documentário dirigido por Kiko Goifman e Claudia Priscilla levanta discurso de representatividade transexual ao acompanhar Linn da Quebrada e a parceira de palco Jup do Bairro em momentos cotidianos e em performances subversivas. Não é ficção ; ;é friccional;, provoca Linn em entrevista ao Correio. ;É sobre a nossa realidade, sobre nossas relações;, continua.

Em fevereiro, Bixa travesty ganhou o prêmio Teddy, destinado a produções LGBT no Festival de Berlim. O Festival de Brasília marcou a estreia do filme no Brasil. ;É mais do que propício que o filme estreie em Brasília neste momento político e neste festival que tem uma importância muito política no país;, diz.

Ela vê a participação dela e de outras transsexuais nas artes ; e no mercado de trabalho em geral ; como exceções, mas que estão abrindo passagem. ;Estamos invadindo e ocupando esses espaços. Não é uma concessão de outras pessoas. Tem sido uma conquista nossa. Isso já é muito importante. Não queremos servir apenas como ícone. Minha disputa agora é por linguagem, por território afetivo, além do social e político;, aponta.
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Três perguntas/ Linn da Quebrada


Como se deu o convite para o filme?
Surge como proposta a partir da Cláudia (Priscilla) e do Kiko (Goifman), que já acompanhavam algumas ramificações do meu trabalho, de minhas performances há algum tempo. Partiu da ideia de fazermos algo juntos para depois descobrir que forma isso teria, sem ideia rígida e por onde iríamos caminhar. Percebi que não teria uma visão clichê sobre a comunidade trans, como abjetos e pude confiar nessas pessoas. Eu contribui com ideias, com roteiro, então é um filme meu também. É um filme nosso. Eu queria que não fosse sobre mim, mas que fosse feito comigo e que, principalmente, fosse feito junto comigo partindo de um viés afetivo. Pensamos na delicadeza e na efetividade do filme nesse momento político.


De que forma o cinema pode contribuir para a militância em favor de transexuais?
O cinema tem um papel muito forte na construção de nossas identidades. As novelas e filmes criaram um imaginário social sobre travestis. Por tanto tempo, o cinema e outras artes fazem o desserviço de nos desumanizar. Filmes como Bixa travesty têm a possibilidade de criar fissuras no imaginário social construído sobre trans e travestis. De tirar as trans e travestis de um campo tão unilateral do retrato de nossas identidades. Bixa travesty consegue, de certa forma, aproximar e humanizar a identidade trans, criar complexidade. Traz o meu olhar sobre mim mesma. É um olhar friccional sobre nossa realidade. Da fricção de nossos corpos. Da fricção das minhas ideias, das ideias do Kiko e da Claudinha.

Poderia dar exemplos de como o cinema contribuiu para criar uma imagem negativa da trans?
Bom, eu pergunto para você: quais são as imagens que vêm à sua cabeça quando se fala a palavra travesti? Que espaços as travestis ocupam socialmente e afetivamente? O cinema ajudou a construir a ausência da travesti. São pouquíssimos os filmes que nos naturalizam. Que filmes fazem com que olhemos para nossos corpos?

*Estagiário sob supervisão de Vinicius Nader

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