Diversão e Arte

De Motorhead à miséria humana: entrevista com o fotojornalista Pep Bonet

Na última quarta (3/10), Pep Bonet esteve na Galeria Olho de Águia para abertura da exposição que vai até 31 de outubro

Robson G. Rodrigues*
postado em 05/10/2018 17:30
'Procuro me renovar', diz sobre a estética registrada a cada tema em que aprofunda
;Batismos, casamentos, aniversários e animais copulando;, brinca o bem humorado Pep Bonet perguntado sobre o que não fotografa, já que quase tudo passa pelas lentes do premiado fotojornalista. Dois dentre os principais trabalhos do espanhol de Maiorca pertencem a mundos bem distintos. Na série Faith in chaos (Fé em meio ao caos), debruçou-se em registrar a sangrenta Guerra Civil de Serra Leoa que se estendeu por 11 anos e provocou o óbito de milhares de pessoas. Partindo para o campo do entretenimento, fotografou o grupo Motorhead de 2008 até os últimos momentos da banda desfeita com morte do vocalista e baixista Lemmy, em 2015.

Uma exposição de fotografias com registros da banda inglesa de heavy metal está instalada na Galeria Olho de Águia, em Brasília, até 31 de outubro. Bonet esteve para a abertura na última quarta-feira (3/10), ocasião em que também mostrou outros trabalhos voltados a relatar os horrores de zonas em crise humanitária.

Com pausas para cervejas, caipirinhas e perguntas do público que preencheu o espaço, Bonet apresentou vídeos dos trabalhos que passam pela cobertura de infectados por HIV/AIDS pelo mundo; do dilema de transexuais em Honduras; e da liga de futebol de amputados ; vítimas da Guerra ; em Serra Leoa.
O fotojornalista registrou vítimas das Guerra de Serra Leoa

Para encerrar, brindou os presentes com cenas e relatos dos anos que esteve ao lado do Motorhead, da qual não esconde profunda admiração. ;Não há nenhuma banda com aquela pureza e honestidade;, exalta.

Os planos do fotojornalista para o futuro são diversos como seu histórico. Será o cinegrafista oficial de uma competição de windsurf da qual também compete em Namíbia; está no processo de denunciar o turismo em massa que, segundo ele, aniquila a cultura de Maiorca; e pretende fotografar o heavy metal underground de Botswana.

Pep BonetCinco perguntas para Pep Bonet



Qual seu limite ético ao fotografar situações degradantes à dignidade humana ?
Creio que tudo dependa da relação que você tenha com a pessoa e para que você usa a fotografia. Se você usa a fotografia para mudar a realidade da pessoa, você tem de fazer. Se você usa a fotografia para benefício pessoal ou ofensivo, aí não tem nenhum sentido. Há também momentos que a fotografia pode pôr a pessoa em perigo. Mas, eticamente, se o sentimento e a razão é boa e é para denunciar e para mobilizar pessoas, é positivo.

Você já fotografou conflitos, pessoas com HIV/AIDS e bandas de rock. Busca alguma alguma visão específica para cada uma dessas situações numa fotografia? Como retrata cada tema?
Dependendo das emoções que vivo com cada história, conto-as de maneira diferente. É como escrever um poema. A estética é muito importante para cada história e cada história tem a própria aura. E eu tenho uma relação diferente para cada uma. Para mim, a fotografia é emocional. E, para ser emocional, tem de experienciar para poder contá-las. Emoções não são coisas que podemos planejar ou escrever. Então, não podemos repetir as emoções que sentimos. As emoções são coisas únicas que se manifestam de forma diferente em cada pessoa. Procuro me renovar. Quando tenho um feeling com algo, sigo meu instinto.

Já deixou de fotografar o Motorhead em alguma situação para não constranger a banda?
Não. Nunca firmei nenhum contrato com a banda. Eu era autorizado de fotografá-los e antes de as fotos serem publicadas, precisavam ser autorizadas pela banda.

E eles já desaprovaram alguma foto?
Muito poucas. Apenas quando sentiam-se gordos.

Que recordações guarda de Motorhead no Brasil?
Me recordo de momentos de loucura. Da banda me dizendo para buscar meninas bonitas para levá-las ao backstage. Se elas estavam acompanhadas, mandávamos embora. Viajando com a banda, via muito pouco de cada país. O único fora do comum foi ir para um lugar de tiro. Ficávamos em hotéis cinco estrelas, em grandes quartos, passávamos alguns dias entre fotografias e concertos e partíamos para outra cidade e já nem sabíamos mais onde estávamos. Com a banda, era só mais um concerto, mais uma cidade. Só seguia a turnê. Senti mais na pele o Brasil quando acompanhei travestis fotografando-as na rua, conheci histórias fortes, como a de uma travesti que, depois de ser expulsa de casa, começou a se prostituir aos 12 anos.

Serviço

Exposição Pep Bonet Projeto Imagem Sem fronteiras
Até 31 de outubro na Galeria Olho de Águia (CNF Ed. Praiamar, Taguatinga Norte; 99996-2575). Entrada franca. Classificação indicativa livre.

*Estagiário sob supervisão de Adriana Izel

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