postado em 18/02/2019 10:03
Agressividade, raiva, comoção, indiferença e deboche são algumas das reações captadas pela artista pernambucana Ana Lira. A partir do registro de manifestações política, ela capta o nível de insatisfação que paira nas ruas. Seus objetos de estudos são pichações, cartazes de campanha eleitoral vandalizados, pinturas, santinhos e o que mais expressar sentimento de inconformidade. Ela exibe gratuitamente os registros na Casa da Cultura da América Latina da Universidade de Brasília (CAL/UnB) com a exposição Não-dito, em cartaz até 4 de abril.
A exposição reúne 39 fotografias, cinco obras e um mural. Ela também trouxe bilhetes de pessoas que pediam dinheiro em ônibus ; ela vê uma correlação positiva entre o acirramento da crise política e o número de pedintes. O nome, Não-dito, remete à ideia de políticos colocarem para debaixo dos panos os malfeitos dos colegas. A artista desenvolve o trabalho há 6 anos. Acompanhou ; e acompanha ; quase que anualmente as intervenções políticas que encontrou pelas ruas de Recife. As interferências rebeladas vão desde frases simples, como ;vote nulo;, a fortes demonstrações de ódio.
;Eu tive experiências das mais diversas. As pessoas depositam a raiva nos cartazes de campanha eleitoral. Elas escrevem nos cartazes coisas que elas gostariam de dizer aos políticos. Muitas rasgam os rostos. São rasgos de muita violência. E aí você vai desenvolvendo um processo de leitura crítica de imagem para também entender a diferença entre um cartaz que tem só uma brincadeira e um que efetivamente recebe uma intervenção em que se vê uma forte resposta política;, explica Ana Lira, que classificou tipos de rasgos em seu trabalho.
Ela observou que muitos cartazes permaneciam nas paredes mesmo depois de as eleições terem acabado. Tornaram-se ;espectros das promessas de campanha;. Quando interrogou um rapaz responsável por pintar os olhos dos candidatos, ouviu que era como ele percebia os governantes: estão virando zumbis. ;Sempre que eu conhecia alguém responsável por uma intervenção, eu entrevistava. Se não dava, eu continuava fotografando e acompanhando, na medida do possível, a desintegração no ambiente urbano;, explica.
A artista, que assume não ter pesquisado Brasília a fundo, as manifestações em Brasília são menos eficazes pela frequência com que ocorrem. ;A sensação que eu tenho, é que, como Brasília é a capital federal, o centro do poder, o fato de haver muitas manifestações, o sistema de poder quase anestesiado, é como se os processos daqui precisassem de muitos mais esforço para que provoque alguma transformação;.
Ela lembra como foi ;chocante; entrar na Câmara dos Deputados e observar a indiferença e deboche lançados a grevistas que há 10 dias estavam sem comer. ;As pessoas passavam como se fosse uma cena normal. Tinha gente que passava rindo.;
Serviço
Exposição Não-dito
CAL/UnB (SCS Q.4,Sala 103; Asa Sul). Visitação: Até 4 de abril. De segunda a sexta, das 9h às 20h. Entrada franca. Classificação indicativa livre