Elizeu Chaves Jr - Especial para o Correio
postado em 05/03/2019 07:00
Nova York ; O Guggenheim Museum de Nova York, referência internacional em arte moderna, abriga, até 23 de abril, a primeira grande mostra individual nos Estados Unidos dedicada à sueca Hilma af Klint. A artista, ainda pouco conhecida nas Américas, nasceu em Estocolmo em 1862 e estudou na Royal Academy of Fine Arts da cidade. Apesar de ter várias influências locais em seu trabalho, incluindo o folclore nórdico, a artista estabeleceu um trabalho original e é inconcebível que tenha sido pouco reconhecida em comparação a outros modernistas da mesma época.
Organizada por Tracey Bashkoff, diretora de coleções e curadora sênior, a exposição foca principalmente no período de 1906-1920, quando Hilma af Klint começou a produzir pinturas que instigam a imaginação e produzem uma reflexão sobre as verdadeiras origens e o desenvolvimento do modernismo.
Parsifal é um dos exemplos de referência mitológica da artista presente em seu trabalho. De acordo com uma das versões da lenda, o cavaleiro teria se unido à Távola Redonda e revelado seu valor ao encontrar o Santo Graal e curar o rei. A artista retrata a jornada e os desafios do cavaleiro de maneira não linear, usando formas abstratas em obras que instigam a imaginação dos visitantes.
Hilma af Klint se estabeleceu produzindo pinturas figurativas inspiradas em metafísica e na teosofia, com destaque para obras sobre o ciclo da vida. Essa abordagem coincide com o que ocorre no período, principalmente em alguns segmentos literários e artísticos na Europa e nos Estados Unidos. Na época, buscava-se conciliar antigas crenças com os avanços científicos e a promoção de uma nova consciência baseada no reconhecimento da pluralidade global de culturas.
Uma das séries mais importantes da exposição ; As pinturas para o templo ; produzidas entre 1906 e 1915, reflete um esforço para articular visões transcendentais da realidade. Estilisticamente, elas são bastante diversas, incorporando formas biomórficas e geométricas em escalas expansivas e, ao mesmo, tempo intimistas. Um dos principais projetos de vida da artista consistia em instalar essas obras em um templo espiral, embora esse plano nunca tenha se concretizado. É interessante que sua obra esteja exposta justamente em um museu famoso não apenas pelo acervo, mas por sua singular arquitetura cilíndrica, resultado de parceria da Fundação Gugghenheim com Frank Wright na década de 1930. Nos anos seguintes à conclusão de As pinturas para o templo, Hilma af Klint continuou a explorar os limites de seu repertório abstrato.
Abstração
Suas obras radicalmente abstratas, iniciadas em 1906, não encontravam paralelo com referências reconhecidas até então. O trabalho da artista ocorre, aliás, antes de colossos da arte abstrata como Kandinsky (1866-1944) e Mondrian (1872-1944), darem rumos semelhantes a suas carreiras.
É interessante notar que contemporâneos de Hilma af Klint mais conhecidos publicaram manifestos e exibiram amplamente seus trabalhos, mas ela manteve suas inovadoras pinturas, em grande parte, privadas. A artista raramente exibia suas obras e, convencida de que o mundo ainda não estava pronto para entender seu trabalho, estipulou que esse não fosse mostrado pelo prazo de 20 anos após sua morte. Seu trabalho foi praticamente invisível até 1986 e, somente nas três décadas seguintes, sua produção começou a receber séria atenção.
Trata-se, portanto, de rara oportunidade para os visitantes, uma vez que a mostra Hilma af Klint: pinturas para o futuro faz justiça à empreitada vanguardista da artista e ocorre em companhia de um acervo tão rico quanto o trabalho de Kandinsky, um dos maiores gênios e referências da arte abstrata.