Diversão e Arte

Prestes a completar 80 anos, Antonio Pitanga retorna à capital

Brasilia foi o local em que o ator filmou o clássico 'A idade da Terra (1980)', de Glauber Rocha. Dessa vez, é com a peça 'Filho do pai', de Mauricio Witczak

Adriana Izel
postado em 30/03/2019 07:45
Pitanga está em cartaz com Nando Cunha no espetáculo 'Filho do pai', que tem encenações hoje e amanhã em Brasília

Nas terras candangas, o baiano Antonio Pitanga foi o Cristo negro do filme A idade da Terra (1980), de Glauber Rocha, o dono de uma loja de discos no curta-metragem Riscados pela memória (2018) de Alex Vidigal e agora será o patriarca que inicia um diálogo com o filho após anos de afastamento em Filho do pai, espetáculo teatral produzido por Nando Cunha, com quem ele divide o palco, e texto de Mauricio Witczak, que estreia hoje, no Teatro Plínio Marcos, na Funarte.

Voltar a Brasília para o ator é sempre bom. No quadradinho, ele viveu momentos importantes da carreira, como a participação no último filme de Glauber Rocha. Inspirado em poema de Castro Alves, o longa retratava a situação política dos anos 1970 com quatro figuras de Cristo. Polêmica, a fita foi indicada ao Leão de Ouro no Festival de Veneza e dividiu opiniões da crítica. Pitanga tem uma cena emblemática no filme na Torre de TV. ;Fiz o último filme do Glauber em Brasília no final da década de 1970. Fiz também um curta-metragem com o Alex Vidigal, que ganhou prêmio no Festival de Brasília (do Cinema Brasileiro). É sempre bom voltar a Brasília, onde tenho grandes amigos e é um lugar em que tenho uma leitura muito forte da juventude;, afirma.

Além disso, na capital federal, ele acumulou presenças no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, onde retornou no ano passado por conta do curta-metragem Riscados pela memória exibido na 51; edição. ;(Brasília) Sempre foi uma referência nos festivais de cinema. É um pilar importante para o Brasil nos momentos mais difíceis. A juventude brasiliense nos deu muito orgulho, seja com os cineastas, seja com os próprios músicos, que mostraram em suas obras inteligência e criatividade nos momentos mais difíceis. Nos anos de chumbo, a juventude de Brasília foi incrível. Ela jamais jogou a toalha;, analisa.

História

Em 13 de junho, Pitanga completa 80 anos. Desses, 60 são dedicados à arte. O baiano participou de importantes movimentos artísticos do país, como o Cinema Novo e o Cinema Negro trabalhou com cineastas dos mais respeitados em uma filmografia de dar inveja a muita gente, ocupou espaços na tevê e até foi samba-enredo de escola de samba, a Unidos do Porto da Pedra neste ano, em ;Antonio Pitanga, um negro em movimento;.

;Pitanga tem uma importância na história da arte, do cinema e do teatro. Ele não é só um artista. Ele é um cara que movimenta essa arte toda. Ele é um articulador, um cara de luta. Ele é um cara engajado, um militante da arte, uma pessoa de uma inteligência sensacional e que partilha esse conhecimento o tempo todo. Pitanga tem essa importância grande no cenário do país. Na década de 1970, quando a ditadura e o racismo eram latentes, ele fez todos os filmes de todos os melhores diretores. E ele não tem um papel no currículo por ser negro. Todos os papéis que você vai ver dele, foram dele porque ele é um ator sensacional. Ele foi chamado por isso;, diz o ator Nando Cunha, que atua ao lado de Pitanga em Filho do pai.

Quebrar as barreiras da discriminação numa época em que ainda não se falava em diversidade foi um dos grandes feitos de Pitanga. ;Acho que sou um guerrilheiro da cultura. Acho que a gente (a juventude baiana) entendeu muito cedo que o país, culturalmente, vivia um domínio de uma colonização europeia e americana. Criamos um movimento que emocionou o Brasil, essa juventude baiana, com Glauber Rocha e tantos outros artistas. A gente não estava li só trazendo a discussão do negro, mas sim do povo brasileiro. Todos estávamos trabalhando contra todo o tipo de preconceito e pelos direitos, da mulher, do negro, do índio, do homossexual... Você vê isso nos filmes da década de 1960. A gente já estava muito cedo descortinando essas questões que estão tão em voga hoje. Estávamos colocando o dedo na ferida;, lembra.

Até por isso, para Pitanga, encenar a peça Filho do pai faz tanto sentido. A produção tem dois atores negros em lugar de destaque em um texto que faz um paralelo com o universo shakespeariano, já que a conversa entre pai e filho tem início durante um ensaio de Hamlet. ;Essa peça tem uma sensibilidade incrível que mergulha no universo de Shakespeare, que é o autor que melhor tratou o ser humano. Traz esse conflito que é universal, de pai e filho, com a linguagem dos dias de hoje. É uma peça universal e que discute as relações humanas que estamos evitando hoje. O mundo está tão violento que essa discussão se faz necessária. É uma peça incrível, que interage com as famílias e não tem bandeira. Essa é uma jogada magistral do Nando Cunha. São dois atores negros vivendo um universo shakespeariano;, completa.



Filho do pai
Teatro Plínio Marcos (Complexo Cultural Funarte ; Eixo Monumental). Hoje, às 19h30. Amanhã, às 19h. Espetáculo Filho do pai, com Antonio Pitanga e Nando Cunha. Autor: Maurício Witczak. Direção: Clarissa Kahane. Entrada a R$ 40 (meia) e R$ 80 (inteira). Não recomendado para menores de 14 anos.

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