Diversão e Arte

Obras clássicas estão de volta às prateleiras em novas edições

Grandes da literatura mundial, como Crime e castigo e Matadouro-Cinco, ganham edições comemorativas e novas traduções

Nahima Maciel
postado em 06/05/2019 06:20
Crime e castigo, Matadouro-Cinco e O apanhador no campo de centeio em novas traduções. Grande sertão: veredas com uma revisão que recupera palavras alteradas com os acordos ortográficos. Os dois volumes de O segundo sexo em capa dura, acompanhados de um caderno de textos de pesquisadoras e ativistas brasileiras e uma edição revisada de O jogo de amarelinha. O primeiro semestre de 2019 está generoso com os clássicos da literatura. Os tempos de crise podem não ser bons para o mercado editorial apostar em novos nomes, mas há uma leva de boas reedições aportando nas editoras. É um bom momento para avançar no desafio dos 100 livros para ler antes de morrer, porque todos estão nessa lista. Veja o que reservam essas reedições.

Capa dos livros

Matadouro Cinco
De Kurt Vonnegut. Tradução: Daniel Pellizzari. Intrínseca, 288 páginas. R$ 44,90
No prefácio da nova tradução de Daniel Pellizzari em comemoração aos 50 anos do romance, Antonio Xerxenesky avisa que Kurt Vonnegut é um autor acessível e de fácil leitura, mas que isso não implica em superficialidade ou banalidade. "Nesse livro, assim como na obra inteira dele, gosto muito da intersecção entre melancolia e humor, quase sempre com algum toque de absurdo ou fantástico. É um modo eficaz de falar sobre os temas que ele trata, muitas vezes bem pesados, e enganadoramente simples: o texto é fácil de ler, mas dificílimo de escrever com a mesma competência", diz Pellizzari, que leu o romance mais de uma vez ao longo da vida. Matadouro-Cinco se tornou um clássico por vários motivos. Não foi apenas o fato de nenhum autor alemão ter escrito sobre o massacre de Dresden, cujo saldo ultrapassa 100 mil mortos, mas o quão emblemático de uma época é o romance de Vonnegut. Alienígenas delirantes e memórias da guerra se mesclam para narrar uma ficção científica em que convivem várias dimensões. Para representar o que não pode ser representado, Vonnegut recorre ao fantástico. Sobrevivente do bombardeio de Dresden ; depois de capturado pelos alemães na Bélgica, ficou preso com companheiros em um matadouro enquanto as bombas destruíam a cidade alemã ;, o autor mergulha na própria experiência para depois embarcar em uma metáfora ancorada na ficção científica. Não é à toa que Matadouro-Cinco também é conhecido como ;a cruzada das crianças;. É o título que o narrador promete a uma personagem para o livro sobre Dresden que nunca consegue terminar. A guerra é feita por ;bebês;, homens muito jovens, e, acredita a personagem, se alimenta de estímulos alocados em livros e filmes. Os horrores dessa empreitada são pontuados pela frase ;É isso mesmo!”, cravada ao longo da narrativa para evidenciar a dificuldade de lidar com os fatos. O personagem Billy Pilgrim transita entre dimensões enquanto relembra a guerra. É sério, mas é também um delírio necessário para não enlouquecer.

Crime e castigo
De Fiódor Dostoievski. Tradução: Rubens Figueiredo. Todavia, 604 páginas. R$ 74,90
Em nova tradução de Rubens Figueiredo, a Todavia traz de volta o clássico de Fiódor Dostoievski sobre um estudante que se acha no direito de cometer um assassinato para solucionar uma dívida porque simplesmente acredita estar predestinado a uma vida especial. Raskolnikov, que passa boa parte do romance tentando convencer o leitor da razoabilidade de seus atos, é também um passeio proposto por Doistoievski pelos dramas das metrópoles do século 19. O livro foi escrito em São Petersburgo, em 1865, e por ele desfilam personagens recorrentes no universo de Dostoievski, que são também figuras típicas de uma época e de um momento histórico. Rubens Figueiredo leu o romance pela primeira vez na adolescência e, há 20 anos, leu novamente a tradução de Paulo Bezerra feita para a Editora 34, a primeira diretamente do russo publicada no Brasil. ;Há uma espécie de mitologia que envolve o romance e que se desenvolve ao longo do tempo. Agora, ao fazer a minha tradução, creio que vi o livro com outros olhos, mais ponderados e mais próximos da realidade histórica, espero;, diz o tradutor. A linguagem de Crime e castigo é muito próxima de obras como O jogador e O eterno marido, que Rubens também traduziu. Para ele, o grande desafio do trabalho foi a pressão da oralidade, da língua falada, muito evidente no original russo. ;Não me refiro propriamente a gírias ou à linguagem informal, mas, sim, ao esforço para reproduzir a fala concreta das pessoas. Mesmo quando se trata do pensamento puro, colhido em estado bruto. Nisso se manifesta o influxo do teatro no romance de Dostoiévski, um elemento até estrutural em sua obra, me parece;, explica.

Grande Sertão Veredas
De João Guimarães Rosa. Companhia das Letras, 558 páginas. R$ 84,90
Para comemorar os 63 anos do romance de João Guimarães Rosa, a Companhia das Letras lançou duas novas edições. Uma delas, de luxo e com a capa bordada, teve os 63 exemplares esgotados rapidamente. A outra vem acompanhada de textos críticos assinados por Walnice Nogueira Galvão, Roberto Schwarz, Fernando Sabino, Clarice Lispector, Benedito Nunes, Davi Arrigucci Jr. e Silviano Santiago. O texto também foi revisado e, segundo o editor Érico Melo, foram feitas 115 alterações para recuperar termos alterados por acordos ortográficos. ;Queríamos resgatar, principalmente, os acentos que as reformas ortográficas tinham eliminado. São importantes, porque são marcadores das mudanças de voz e da própria pesquisa de Guimarães Rosa, principalmente os neologismos que ele criou. As palavras pouco usuais ou inventadas entraram no nosso foco para terem a grafia original restituída. O Guimarães Rosa era radicalmente contrário ao acordo ortográfico, sentia que o trabalho dele estava sendo atacado nesse sentido;, conta Melo.

O segundo sexo
De Simone de Beauvoir. Tradução: Sérgio Milliet. Nova Fronteira. Box com 2 volumes, 936 páginas. R$ 169,90
A obra mais importante de Simone de Beauvoir chega aos 70 anos com um vigor que Sylvie Le Bon de Beauvoir, herdeira e editora da autora, acredita relevante para o feminismo no mundo. ;O segundo sexo ainda tem muito que dizer às mulheres. O fato de que não se para de traduzi-lo para as línguas mais variadas ao redor do mundo é uma prova indireta disso;, disse, em entrevista publicada em caderno anexo que acompanha a caixa com dois volumes em capa dura reeditados pela Nova Fronteira. No material, há textos de Mary del Priore, Djamila Ribeiro, Marcia Tiburi e Mirian Goldenberg sobre a atualidade da obra e o impacto da leitura em suas vidas.
Em Fatos e mitos, o primeiro volume de O segundo sexo, Beauvoir traz o tema da condição feminina analisada sob os aspectos histórico e biológico. No segundo, A experiência vivida, são as fases da vida que ela debulha ao falar da infância, da iniciação sexual, do casamento, da paixão e do envelhecimento. Esse volume traz a famosa frase ;Ninguém nasce mulher: torna-se mulher;, uma espécie de síntese de uma parte inteira dedicada à formação da mulher.

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