Diversão e Arte

Entenda as diferenças entre as escolas russa e francesa de balé clássico

Duas apresentações de balés clássicos são oportunidades para entender um pouco mais sobre o gênero no passado e hoje

Nahima Maciel
postado em 11/05/2019 06:45

O Balé Imperial da Rússia traz Tchaikovsky para Brasília

Pelo menos três coisas se deve saber sobre a história do balé clássico para compreender esse universo. Primeiro, sua origem não é russa e, sim, francesa. Segundo, é sempre preciso lembrar que é uma arte efêmera, transmitida oralmente e, por isso, dependente da memória e habilidade de mestres e bailarinos. Terceiro, há escolas, e elas são diferentes.

Claro, nada como sentar na plateia e assistir a um balé para entender a particularidade de cada espetáculo, mas com essas ideias na cabeça, fica mais fácil. O mês de maio é um bom momento para quem quer mergulhar nesse universo. Neste sábado (11/5), o Balé Imperial da Rússia sobe ao palco do Centro de Convenções para um programa dominado por Piotr Ilich Tchaikovsky. No próximo dia 20, é a vez do Balé Nacional da China, cujas produções estabelecem um diálogo entre a dança clássica ocidental e as referências do teatro e da dança tradicional chinesa.

Herdeiras das técnicas desenvolvidas por séculos de prática dos integrantes da escola russa, as duas companhias são, no entanto, bem diferentes. Criado há 24 anos pelo bailarino e mestre Gediminas Taranda, o Balé Imperial da Rússia traz o espetáculo The best of Tchaikovsky com trechos de coreografias universais como O lago dos cisnes, A bela adormecida e O quebra-nozes.

O conjunto representa bem a escola russa, a mais influente no mundo, marcada, sobretudo, pela força e exuberância dos bailarinos. ;O balé russo é mais vigoroso, os bailarinos saltam mais, fazem coisas de maior virtuosismo. Os rapazes têm que dar mais piruetas e têm musculatura mais aparente, são mais fortes;, ensina a bailarina e professora Mônica Berardinelli, uma das criadoras do Balé da Cidade de Brasília.

O Balé Imperial da Rússia é uma das dezenas de corpos de baile formadas nos anos 1990 após o fim da União Soviética, quando as companhias estatais foram desmontadas e grandes empresários perceberam o potencial da dança russa como um investimento. Muitos dos integrantes vieram de instituições tradicionais como o Teatro Mariinsk e o Teatro Bolshoi, mas também há membros de outras casas importantes como a Ópera de Paris e o American Ballet Theatre.

No palco, o que prevalece é o método tradicional da escola russa que Gediminas Taranda faz questão de exaltar. ;A principal característica da escola de dança russa é a grande busca pela perfeição;, explica o coreógrafo, que foi integrante do Bolshoi.

Em Brasília, o Balé Imperial da Rússia também vai contar com a participação de bailarinos locais. A coreógrafa Noara Beltrami prepara 10 crianças entre 9 e 11 anos para participar de O quebra-nozes no papel dos anjos. Ela conta que, na cidade, o método mais popular nas escolas de dança clássica é o inglês, desenvolvido pelos mestres do Royal Ballet, de Londres. Para ela, uma das maiores diferenças entre as duas escolas está na movimentação e no posicionamento dos braços e pernas. Os passos são os mesmos, mas os direcionamentos e nomes de alguns movimentos são diferentes. Os ingleses, por exemplo, contam cinco posições de pés enquanto os russos fixam três, com variações. Cabeças também têm posicionamento mais fixo para os ingleses e, na linguagem de Noara, mais quadradas.

Oriente e Ocidente

Dança russa com toque oriental no Balé Nacional da China

Um encontro de civilizações é a marca do Balé Nacional da China, criado em 1959 e construído com base na metodologia russa da Academia Vaganova. Em Brasília, o grupo apresenta um gala com trechos de clássicos do repertório e, por questões de logística, não encena o Lanternas vermelhas, coreografado pelo diretor Zhang Yimou, um dos idealizadores da abertura dos Jogos Olímpicos de 2008.

A gênese do balé clássico chinês é a escola russa, cujos professores foram levados ao país por Mao Tsé-Tung durante a Revolução Cultural. Os corpos longilíneos são a marca física da companhia, mas as características interpretativas resultam de uma mistura. ;Eles se utilizam dessa base para trazer os elementos tradicionais, a história deles e a leitura contemporânea que eles também visitam. Muitos elementos da cultura chinesa estão presentes;, avisa Steffen Dauelsberg, diretor executivo da Dell;Arte e responsável por trazer a companhia ao Brasil.

Origem francesa

Historiadores da dança costumam fixar o início do balé clássico na corte francesa de Henrique II. Quando o rei se casou com Catarina de Medicis, em 1533, uniram-se duas tradições de danças praticadas nas cortes francesa e italiana, práticas que envolviam desde bailes de mascarados até competições com cavalos. Era um símbolo de sofisticação que até hoje marca a escola francesa de balé. ;O bailarino francês é conhecido pelo refinamento, pela elegância, pela plasticidade;, aponta Mônica Berardinelli.

Foi vindo da França que o balé chegou à Rússia. Antes de Pedro, O Grande, no século 17, não havia dança clássica no país, muito menos os refinamentos habituais das grandes cortes europeias. A ligação profunda entre igreja, ortodoxa no caso russo, e estado tornava a corte russa um tanto atrasada e obscurantista. ;Enquanto a Europa ocidental passou pela Reforma, pela Renascença e por uma revolução científica, a Rússia permaneceu isolada e atada à liturgia da fé ortodoxa. Não havia universidades, nem uma tradição literária. Sua arte e sua música eram quase que exclusivamente confinadas aos ícones e músicas sagradas;, conta a bailarina e crítica Jennifer Homans, autora de Anjos de Apolo ; Uma história do balé.

Foi Pedro, O Grande quem decidiu mudar os rumos da corte e conferir aos russos a sofisticação experimentada no resto da Europa. Ele encontrou no balé um instrumento para iniciar a corte em noções de etiqueta. A prática só se tornou uma arte anos mais tarde, mas acabou por virar uma espécie de emblema cultural do país.

No século 19, muitos coreógrafos franceses passaram a integrar os grandes teatros russos e boa parte das coreografias hoje mais dançadas e conhecidas, como Giselle, Coppélia e La Sylphide, nasceram e estrearam na França. Até mesmo o mais famoso dos coreógrafos franceses, Marius Petipa, criou algumas de suas obras mais conhecidas, como O quebra-nozes e Lago dos cisnes, para os balés russos.

SERVIÇO

Balé Imperial da Rússia ; The best of Tchaikovsky

Neste sábado (11/5), às 17h e às 20h, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães ; Auditório Máster. Ingressos: R$ 270 (poltrona front gold), R$ 200 (poltrona gold), R$ 180 (poltrona lateral), R$ 160 (poltrona A), R$ 120 (poltrona B) e R$ 80 (poltrona superior). Valores referentes à meia entrada e sujeito a alteração sem prévio aviso. Os 200 primeiros assinantes do Correio têm 60% de desconto na inteira.

Balé Nacional da China

Dia 20 de maio, às 20h, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães - Auditório Master. Entrada Gratuita. Os ingressos gratuitos podem ser retirados no dia do evento a partir das 18h, na bilheteria do teatro. Até 2 ingressos por pessoa e sujeito à lotação.

TRÊS PERGUNTAS / Gediminas Taranda, coreógrafo do Balé Imperial da Rússia

O balé russo tem uma marca?

Sim. A principal característica da escola de dança russa é a grande busca pela perfeição. As crianças começam a praticar muito cedo, com 3, 4 anos de idade, e a partir daí há um trabalho contínuo. Querer fazer balé é muito pouco, porque para entrar na escola profissional é preciso que as proporções do corpo correspondam aos padrões. Tamanho das pernas, cabeça, força do tendão, abertura dos joelhos e pés, que são características genéticas.

O fim da União Soviética trouxe também uma mudança para o balé russo? Que mudança?

Acho que eram tempos de adaptação, sem grandes mudanças do passado para o presente. A principal delas é que muitas empresas privadas novas apareceram, com mais oportunidades de mostrar seu trabalho em outros países.

É possível modernizar a dança clássica?

Sim. É sempre possível e necessário. Estamos vivendo um período de transição, alguns coreógrafos buscaram uma maior identificação com o Ocidente, e até acho que isso é positivo, embora muitas vezes pareça confuso. Eu tenho como característica tentar aproveitar ao máximo cada dançarino, e se isso significa mudar um certo movimento, eu vou em frente. A ideia é sempre buscar o melhor resultado no palco, acho que conseguimos até agora.

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