Nahima Maciel
postado em 28/05/2019 07:16
Já pensou em comparecer ao jantar maluco de Os fantasmas se divertem ou passear pelas salas misteriosas de Alice no país das maravilhas? Ou então interagir com algum personagem de A fantástica fábrica de chocolate e poder remontar o cachorrinho Sparky, de Frankenweennie com variados pedacinhos de corpos em peças magnéticas? A curadora norte-americana Jenny He, em parceria com a produtora brasileira Rua 34 Produções Artísticas, se assegurou que o público pudesse ter essa experiência. A exposição A beleza sombria dos monstros: dez anos de ;A arte de Tim Burton;, em cartaz a partir de hoje no Centro Cultural Banco do Brasil, é um passeio imersivo no mundo do cineasta mais expressionista da contemporaneidade.
Idealizada para o CCBB de Brasília e ainda sem perspectiva de itinerância, a mostra celebra os 10 anos da publicação do livro A arte de Tim Burton com uma montagem na qual a tecnologia serve de suporte para levar o público ao universo do cineasta. A intimidade de Jenny com a obra de Burton é antiga. Em 2009, ela realizou Tim Burton para o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA). Em 2014, foi a vez de O mundo de Tim Burton, que rodou o planeta e foi exposta no Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo, em 2016. ;Essa nova exposição, definitivamente, nasceu no Brasil porque todos que estão trabalhando nela são brasileiros;, avisa Jenny. ;Na exposição do MIS, havia pinturas originais, esculturas, instalações e a ideia era realmente para criar uma conexão entre os filmes as obras de arte. Foi ali que fizemos as conexões com a produtora para realizar essa exposição em Brasília.;
Artistas brasileiros foram convidados a participar do projeto e a criar os ambientes da mostra. Jenny manteve a divisão do livro e criou 14 galerias, cada uma destinada a um capítulo de Arte de Tim Burton e construída com base em diferentes linguagens e tecnologias. ;As obras de arte têm tempo de exposição limitado e não podíamos mostrar durante muitos meses, mas, ao mesmo tempo, queríamos dar ao público e aos fãs mais acesso ao trabalhos de Tim. Tivemos então essa ideia de criar uma experiência nova, imersiva e interativa. Encomendamos trabalhos para artistas brasileiros, técnicos, designers e cenógrafos para traduzir a arte de Tim Burton em uma experiência física;, avisa a curadora.
O cenógrafo Gabriel Niemitz, o artista multimídia Rodrigo Gontijo, o compositor Paulo Beto e a dupla de designers Mirella Brandi e Muep ficaram responsáveis por criar os ambientes, virtuais ou não, pelos quais o público vai circular. Para fazer as ambientações das primeiras salas os artistas utilizaram, basicamente, o que a curadora chama de tecnologias pré-cinema, como o teatro de sombras, o folioscópio e o cinescópio. Antes de chegar à tecnologia 3D, com óculos que reproduzem os ambientes dos filmes e dos desenhos do diretor, o visitante vai passar por experiências que fascinaram o cineasta. Burton é apaixonado por filmes de monstros e de ficção científica das décadas de 1950 e 1960, o que fica claro no capítulo Monstros incompreendidos, também título de uma das salas.
;Queríamos fazer uma conexão entre essa paixão pelos filmes sci-fi tipo B, os livros que celebra em Ed Wood e o fato de que ele cresceu inspirado por filmes de monstros;, explica Jenny. Na sala dedicada ao capítulo Alienação, os desenhos de Marte ataca fornecem os elementos para o ambiente, uma celebração do amor de Burton pelos filmes em 3D dos anos 1960 e 1970. Ali, óculos antigos de celofane é que proporcionam a experiência. ;Queríamos abrir o livro de uma maneira bem física de modo que as pessoas pudessem entrar em cada capítulo, como se você entrasse no mundo dele;, garante a curadora.
Nos ambientes de realidade virtual, o mundo de Burton ganha vida e movimento. Pinturas pessoais, desenhos de projetos não realizados e
de filmes que nunca foram feitos serviram de base para os artistas. Há também uma sala dedicada aos animais, outra paixão do cineasta. Quem quiser poderá desconstruir as pequenas criaturas e recriá-las com peças magnéticas de partes do corpo. ;Ele desenha as pessoas de uma maneira muito expressionista de modo que você nem sabe se é um homem, uma mulher ou uma criatura. Mas animais, você pode dizer que é um macaco, um cão, um cachorro e isso simboliza bem o amor dele pelos animais, talvez até mais do que por pessoas;, observa a curadora. Há ainda uma sala educativa chamada de Muito tempo livre, na qual os visitantes vão receber guardanapos para desenhar, um hábito recorrente para Burton, e o resultado vai integrar um mural ao lado dos desenhos do próprio cineasta.
Cada sala é uma interpretação dos capítulos do livro e passou pela aprovação da Tim Burton Produções. ;Nossa proposta foi fazer a transposição das obras originais e cada sala tem um artista responsável por dar vida à linguagem de Burton;, avisa Naum Simão, sócio-
proprietário da Rua 34 Produções Artísticas. Para ele, o universo de Burton é extremamente propício à ambientação proposta pela mostra e as temáticas agradam a todas as idades.
A estranheza dos personagens espalhados por mais de 20 longa-metragens é também motivo de empatia com o público. Burton joga com a bizarrice para falar de temas como morte, carência, afetividade e amor. Difícil não tomar o lado da noiva cadáver do filme homônimo ou do pequeno Sparky de Frankenweennie. É legítima a vontade do pequeno Jack de ser lembrado no Natal e não apenas no Dia dos Mortos, mote de O estranho mundo de Jack, e compreende-se perfeitamente a cartela de maldades de Willie Wonka em A fantástica fábrica de
chocolate. Até o açougueiro demoníaco Sweeney Todd tinha lá suas razões para degolar suas vítimas. Todos eles, ou suas evocações, aparecem aqui e ali na exposição que, por enquanto, só poderá ser vista em Brasília.
A Beleza Sombria dos Monstros: 10 anos de A Arte de Tim Burton
Curadoria: Jenny He. Visitação até 11 de agosto, de terça a domingo, das 9h às 21h, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB, SCES Tr. 2, conj. 22). Classificação indicativa livre.