Diversão e Arte

Mistura de rap e punk marca trabalho de Jhamau

Punk rapper da Ceilândia lança single-manifesto 'Crossover hardcore hip-hop'

Devana Babu*
postado em 05/06/2019 04:09
JhamauSant'anna: ele tem 22 anos e sobrevive de poesia


Jhamau Sant;anna, vulgo Kaninez, é um punk rapper da Ceilândia que lançou recentemente uma pedra fundamental na música brasileira. O single-manifesto Crossover hardcore hip-hop já diz no título a que veio. Não é a primeira vez na história da música brasileira que se mistura rap e punk rock, e a própria letra da música reverencia o pioneirismo de grupos como Pavilhão 9 e, principalmente, os conterrâneos do Câmbio Negro.

Entretanto, o autor acredita ter chegado a uma síntese mais pura, uma simbiose perfeita entre o boom-bap e o ;tum-pá;, ou seja, entre o beat do subgênero mais contestador do rap e a batida do punk rock. ;Se tirar o vocal de uma música do Faces do subúrbio, por exemplo, poderia se dizer que é um rock. No caso da minha música, a mistura está no próprio som, 50/50;, explica o compositor, que não encontrou nada parecido em suas pesquisas.

Sua inserção no hip-hop se deu aos 12 anos, quando começou a dançar krump, um estilo de dança de rua. Aos 15, se encontrou também no punk rock. ;Não migrei de um movimento pra outro;, conta. ;Me descobri punk, mas continuei no rap;. Chegou a lançar alguns sons com samplers achados na internet, gravando a voz no estúdio formigueiro.

Desde então, passou a cultivar o sonho de unir os dois estilos como unha e carne. ;Muita gente do punk tem banda, mas eu sempre quis fazer essa mistura, porque eu sou essa mistura. Desde essa época eu era um crossover ambulante;.

Em fevereiro, surgiu a oportunidade. Se inscreveu em uma oficina de produção musical do projeto Jovem de Expressão e foi tomar lições com o rapper AfroRagga, do Movni, que, ao saber das ambições do aluno, lhe disse: ;Você vai aprender na prática fazendo esse som aí;. Trabalharam juntos nos rudimentos, samplearam a introdução de California ;bber Alles ; hino básico do punk rock de autoria dos Dead Kennedys ; e mixaram com uma base de boom-bap.

Em casa, o aprendiz acelerou o andamento e encontrou o ponto exato da mistura. ;Entre 100 e 110 bpm foi o ideal. Dá para os punks poderem pogar e os b-boys poderem dançar;. O resultado foi tão marcante que a letra surgiu de uma só canetada, rimando ícones do punk rock e do hip-hop e celebrando a herança genética da música. Obteve autorização para usar uma ilustração do grafiteiro Magri, importou o nome Kaninez, com que assina os próprios grafites, e lançou o single.

Poeta e slammer desde os primórdios, aos 22 anos a poesia é sua única fonte de renda. Todos os dias, ele percorre três vagões, 10 vezes por dia, recita cerca de 10 poemas do seu repertório para quase mil pessoas e passa o chapéu, criticando a violência contra a mulher, a alienação tecnológica e a escravidão causada pelas drogas. ;Não é um discurso moralista, é uma questão política;, explica o adepto do movimento streight edge e vegano por questões éticas, políticas e ambientais.

Antes, ele vendia jujubas, mas levava prejuízo por causa da fiscalização e do preconceito por ser modificado, uma pessoa que fez alterações drásticas no corpo como usar grandes alargadores e ter a língua bifurcada. Ele conta que, depois que passou a recitar poesia, a visão dos passageiros mudou. ;Com peita de rap e colete de rebite, moicano pra cima e apavorando nos grafite;, Jhamau, vulgo Kaninez, segue levando sua mensagem e quebrando paradigmas.

* Estagiário sob a supervisão de Severino Francisco

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