Diversão e Arte

Exposição de Tim Burton mexe com o imaginário dos visitantes

A mostra fica em cartaz na cidade até 11 de agosto

Ricardo Daehn
postado em 28/07/2019 06:15

Roberto Alves, ao lado de Josilene:

Em formato de ímãs, as partes estão definidas em baias: há cabeças, pernas e braços. E é neste ambiente, numa das duas galerias do CCBB dedicadas à exposição Tim Burton ; A beleza sombria dos monstros: 10 anos que passeava, tranquilamente, a menina Angelina Lambert, 8 anos. Uma semana antes da visita, mãe dela, a servidora pública Érica Lambert, 42 anos, esteve no local, com o marido Fernando. Resolveu voltar, trazendo a filha. ;Quis incentivar nela aspectos de arte e cultura. Tim Burton é um ícone, mesmo: sombrio e sagaz. Todo mundo tem um lado meio louco, de monstro. Ele sabe captar isso; é um gênio, e, em excesso, eles ficam pirados;, brinca Érica.

Os desenhos de Tim, espalhados por uma das 13 salas montadas a partir de propostas de artistas brasileiros, num ajuste de quase quatro anos até a montagem da exposição, por enquanto, restrita a Brasília, representam cachorro, sapos, gatos, pinguins, e, sim, ;cachorro gracioso, com uma faca nas costas; (como descrito). ;Achei bem legal e meio assustador. A gente não imagina o que esperar, aparece algo inacreditável. Lá no começo, teve um boneco de madeira, num triciclo, com mãos de tesoura!”, espantava-se a pequena Angelina.

;As obras dele mexem com seu imaginário; então não tem idade para apreciar. É como na matemática que, teoricamente, dá margem ao abstrato ; nas artes, você também sente;, comentou a professora de matemática, de 33 anos, Heloísa Oliveira. Na visita ao CCBB, entre as atividades nas galerias, Heloísa relaxou, por mais de cinco minutos, diante de uma das distrações: acomodado em pufe, o público observa projeções de desenhos no teto. Antes de se arriscar nos desenhos à mão-livre, o amigo de Heloísa que fazia companhia, o servidor público Luiz Ribeiro, 30 anos, listava os filmes de Burton que cultiva, entre os quais Dumbo, Edward mãos de tesoura e Frankenweenie. Disposto a retornar ao evento e a recomendá-lo para amigos, Luiz elegeu a segunda das 13 salas como a melhor: ;Ela mostra aparatos e o emprego da tecnologia antiga;.

Inédita no mundo (à exceção de Brasília, claro), a exposição A beleza sombria dos monstros tem perspectivas de chegar até o eixo Rio-São Paulo e, tendo mobilizado visitantes coreanos com contatos no exterior, pode até mesmo desembocar em Nova York. A proposta fundamental foi de dar mais vida, com elementos até teatrais, ao conteúdo do livro The Art of Tim Burton, sob prisma interativo, possibilitando uso de novas texturas, artifícios, hologramas até realidade virtual. Em média, oitenta minutos de visitação contentam os visitantes. Ajustada, com ideias costuradas junto à curadora Jenny He, a mostra trouxe Burton para a capital, em que, por dois dias, supervisionou a montagem. Empolgado, rabiscou setas nas paredes e fez questão de pagar cervejada para todos os envolvidos na produção. Dispensou, entretanto, a imprensa.

Para além da interatividade proposta nas pranchetas de desenhos em que, a gosto particular, cada visitante pode fazer seu monstro, a mostra contemplou os namorados Carol Jones, estudante de arquitetura, e Caio Arruda, aluno de gestão pública, com um indicativo do romance que pode ser inconstante, na visão do artista. Na sala intitulada Amor, veio a prova dos nove, numa roleta lúdica: girando a roleta, Carol viu seu amor identificado como ;perigoso;, enquanto, para Caio, veio a tarja ;estranho;. Isso tudo, em meio à representação de vistosos girassóis, com caules feitos de arame farpado e que ocupam o ambiente. Pouco antes de passar pela sala, Caio deixou as marcas em desenhos criados: repetiu os rabiscos de ursos retalhados, que o acompanham desde a fase escolar e também estampou uma caneca de cerveja numa das criações à mão-livre.

Cores influentes

Fosse em frente a telão com imagens de Marte ataca! ou a uma série de periscópios espalhados em algumas das salas, os sorrisos das amigas Renata Tomé e Maria Vitória Lima eram amplos. ;Sempre vou ao cinema dele, por causa das referências notadas na animação. Em algumas partes da mostra, a gente percebe que ele faz das pessoas, caricaturas, capta as emoções, estando mais interessado em expressões;, comentou Maria Vitória, 23 anos, estudante de pós em gestão de pessoas. Numa mesma parede, de grande dimensão, Maria se admirava com jogos de luzes verdes, azuis, amarelas e vermelhas, capazes de fazerem mudar a configuração de desenhos.

;Gosto do jeito que Burton lida com luzes sombras e, nos desenhos, surgem expressão usadas num modo ;meio viajado;. Ele começou a carreira bem mais dark, no terror, e se afastou, com uma temática não tão convencional de hoje. Ele expressa o extraordinário: não liga tanto para o formato, é intrigante o jeito com o qual lida com a representação da diversidade;, observou Renata Tomé, 22 anos, estudante de cerimonial para eventos.

O casal Josilene Lopes e Roberto Alves aproveitou a primeira ida ao CCBB, brindando a descoberta do ;programa diferente;, indicado por um primo, com personagem de obra de Burton chamada Garota azul, com vinho (1997), e disposta no corredor externo do CCBB. ;É muito legal: um programa gratuito, cultural; coisa diferente de ir para bar ou restaurante. Achei algumas imagens meio mórbidas. A etapa chamada Fim é bastante mórbida ; ele expressa muita tristeza;, opinou a mensageira Josilene, 35 anos. Já o autônomo Roberto, 32 anos, aproveitou para reconsiderar o Burton que conhecia, cineasta. ;Acho que ele é mais desenhista, mais artista. Ele consegue ser alegre, divertido e colorido, revelando monstros! A experiência da exposição foi magnífica. Como gosto muito de jogos de realidade virtual, me senti em casa;, concluiu.

Depoimentos

;Me identifiquei com a automação dos processos da mostra e com a realidade virtual. Brincando, acho que vejo Burton como perturbado, com maneira diferente de ver as coisas ; vê monstros raros, no nosso cotidiano. É um dom que ele soube aproveitar, com estilo gótico. Ainda voltarei, para ver a segunda galeria. Gostei muito da sala Animais, com imãs para o exercício da criatividade;
Matheus Menezes, 25 anos, engenheiro mecatrônico

;Acabei de montar A noiva cadáver, com alunos da Cia. da Ilusão! Assisti à maioria dos filmes, por gostar muito do Johnny Depp, e ele está em muitos dos filmes de Burton. Gostei da interatividade; de poder ver a obra por outros ângulos e notar que dão margem a conceitos e filosofias;
Letícia Reis, 26 anos, estudante de artes cênicas


;Descobri o livro do Tim Burton, hoje. Acho até que ele é mais desenhista; um artista que consegue transportar esta linguagem para o cinema. Fiquei impressionado com a projeção das imagens, logo no começo: traz sensações táteis, auditivas e visuais. Acho até que voltaria para a mostra: é um programa baseado na complementariedade. A arte de Burton se completa, com sessões de cinema.
Pablo Gomes, professor universitário, 31 anos


Tim Burton ; A beleza sombria dos monstros: 10 anos
CCBB (SCES, Tc. 2, cj 22; 3108-7600). Até 11 de agosto. De terça a domingo, das 9h às 20h. Compilação de 40 anos das obras de Burton, em comemoração aos 10 anos do livro The Art of Tim Burton. Conta com conceitos visuais de filmes, centenas de ilustrações do arquivo pessoal do artista editadas sob orientação do realizador. Entrada franca. Classificação indicativa livre.

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Identificando Burton
Aos 60 anos, Tim Burton, além de estabelecido diretor e produtor de cinema, desdobra o talento na associação de respeitado criador visual. O humor e a esquisitice imperam na concepção do também desenhista. Fisgado pelas fitas de aventura dos anos de 1950 e por emblemáticos astros do terror, ele fixou estética ímpar em obras populares como Os fantasmas se divertem, A lenda do cavaleiro sem cabeça, Ed Wood e Alice no País das Maravilhas.



111 mil pessoas já visitaram a exposição

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