Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Conheça condomínios no DF que estão sendo invadidos por atividades de arte

Galerias e espetáculos teatrais fazem parte da rotina dos moradores desse tipo de área residencial


Um mundo à parte surge pelo amor à cultura e pela vontade de compartilhar. Distante dos prédios e dos pilotis, típicos das superquadras brasilienses, condomínios da cidade vão além das residências e respiram dança, artes visuais, teatro, gastronomia, música e poesia. Seja em atividades voltadas única e exclusivamente para a vizinhança, seja nas abertas ao público, artistas resistem e levam opções culturais para fora do Plano Piloto.

Localizado no Jardim Botânico, o Condomínio Verde poderia ser chamado de ;condomínio dos artistas;. Ali, vivem poetas, músicos, atores e chefs de cozinha. Sabores, cores e texturas que atraíram a bonequeira e professora de artes cênicas da Universidade de Brasília (UnB) Izabela Brochado. Com o companheiro Marcos Pena, ela toca o grupo Trapusteros Teatro e transformou a garagem de casa em um teatro de bolso para 50 pessoas. No lugar do automóvel, entraram cortinas, holofotes, som e os bonecos para promover espetáculos de formas animadas.

;É um lugar muito especial, tão agradável, em um espaço tão bonito. Pensamos logo: vamos fazer alguma coisa que seja mais comunitária. Buscamos outro tipo de relação. Pensamos na formação de novas plateias, porque a quantidade de crianças no condomínio é grande. Esse projeto faz parte de um ideal de mundo, de uma geração mais sensível que possa contrapor a essa avalanche de tecnologias e valores que não trabalham a sensibilidade;, explica Izabela.

Além da programação infantil, bastante intensa e, inclusive, com convidados de fora da capital, o grupo oferece peças para o público adulto. No condomínio, também ocorre recital de piano e um dia inteiro de atividades culturais com bandas autorais e poetas locais, por exemplo. A programação é financiada por um fundo cultural próprio. ;Não é voluntário. Dentro do valor do condomínio está embutido isso. É público e financiado. Propusemos a criação do fundo em assembleia a partir de projetos específicos e foi aceito;, conta a bonequeira.

Apesar da proposta caseira, Izabela quer ampliar os horizontes de alcance. Hoje, para assistir a uma peça é necessário reservar um lugar. ;Quem sabe não conseguimos trazer as crianças de São Sebastião que têm menos acesso ainda;, deseja. ;São iniciativas que precisam se tornar mais comum. São nesses lugares que florescem novos artistas, pois se formam do contato com os outros e com a arte. É uma missão de continuidade;, acrescenta.

Galerias



A vida artística que pulsa no Condomínio Verde também chamou a atenção de Rogério Carvalho, crítico, curador, colecionador e proprietário da galeria XXX Arte Contemporânea. Há três anos, ele buscava uma casa que tivesse cara de galeria. Pé direito alto, cômodo para residência artística e metragem de parede para acolher exposições, mas também uma parte da sua coleção. Carvalho é dono de um acervo de cerca de 600 obras de arte.

Na galeria, ele expõe uma curadoria do acervo e foca no mercado primário de artes visuais, ligado diretamente aos artistas em fase de produção. ;Das 11 exposições que fizemos ano passado, 10 eram a primeira individual. Destacamos artistas e damos visibilidade para trabalhos de qualidade;, define. Apesar do nome ; uma referência à classificação indicativa de filmes adultos no século 20 ;, Carvalho esclarece que a galeria é um espaço aberto a todas as possibilidades. O principal critério é a produção artística.

Para o curador, a distância do centro de Brasília é uma questão de referência. ;O deslocamento das pessoas para galerias e lugares mais distantes deveria ser uma prática. Vivemos em uma megalópole e três milhões de habitantes não podem se concentrar só na Asa Sul e Asa Norte. É um território grande e deve ser visto íntegro;, comenta. Ele atende o público com hora marcada. ;O que me interessa não é o público passante, ocasional. Meu interesse é um olhar mais específico de lidar com artistas profissionais e com trabalho de qualidade e com clientes que também sejam profissionais no sentido de verem a arte com papel social definido;, explica.

Muitas ideias e inquietações criativas. Para isso, o artista plástico Luis Jungmann Girafa abriu, no quintal da sua casa no Altiplano Leste, a Matéria Plástica ; Galeria de Arte Atemporânea. Um espaço que contempla todas as contemporaneidades. Do jardim com esculturas de Luiz Gallina à sala expositiva com obras de artistas que admira, ele construiu um refúgio para múltiplas criações.



Por ali, além de exposições, Girafa já promoveu encontros gastronômicos, produziu filme e fotonovela e editou publicações. ;Tem que estar se reinventando o tempo inteiro para não sair da memória das pessoas;, conta aos risos. Aberta desde 2013, aos poucos, a galeria tem despertado o interesse do público consumidor de artes visuais, como também dos vizinhos. ;Está aberta para as pessoas virem conhecer e saber que ali, mais do que uma moradia, tem uma galeria;, convida Girafa.

O trabalho é solitário e de formiguinha, descreve o artista plástico. ;Aqui é o bloco do eu sozinho;, brinca. Para Girafa, as iniciativas que surgem em condomínios são uma resposta ao momento difícil que a cultura vive. ;Com poucas possibilidades, cria-se um incentivo para que surja mais espaços como a Matéria Plástica, de planos alternativos com pegada cultural;, afirma.



Vinda de uma família de produtores culturais, Poema Mühlenberg estabeleceu oficialmente, em 2013, o Galpão Bambu Espaço de Criação em uma região localizada em área de preservação ambiental Serrinha do Paranoá. Além dos ensaios do grupo Nós no Bambu, o local já acolheu residência artística, promoveu oficina de bambuzeria e sarau. ;A ideia é compartilhar com outras pessoas e dar oportunidade de trocas artísticos-culturais. Aos poucos, fomos unindo forças e utilizando os recursos que já estão disponíveis, recursos humanos, inclusive;, comenta Poema.

O local tem como proposta gerar eventos de arte, cultura, meio ambiente, sustentabilidade e cura. Também, não deixa de ser iniciativa para conhecer as pessoas que moram na região. ;É uma maravilha trabalhar em processos criativos na natureza e que a realização de eventos abertos ao público tem também a motivação de proporcionar a integração das pessoas entre si e com a natureza;, afirma.