O Brasil perdeu, na madrugada de ontem, a verve crítica, ácida e extremamente contemporânea de Fernanda Young. A atriz, escritora, apresentadora e roteirista teve uma crise de asma no sítio da família, no interior de Minas Gerais, e foi levada para o hospital em Paraisópolis, onde teve paradas respiratória e cardíaca e não resistiu. Fernanda Young tinha 49 anos de idade e deixa o marido e parceiro em muitas obras, Alexandre Machado, com quem teve quatro filhos. O corpo de Fernanda Young foi enterrado, ontem, em São Paulo.
Nascida em Niterói (RJ), Fernanda Young logo mostrou que tinha talento para as letras. O primeiro livro foi escrito aos 17 anos, mas nunca foi publicado. A escritora se preparava para, finalmente, lançar a obra como parte das comemorações pelos 50 anos, em agosto do ano que vem. Atualmente, Fernanda trabalhava em O livro, obra que deixa inacabada e que deve ser lançada postumamente, e nos ensaios da peça Ainda nada de novo, que estrearia em setembro em São Paulo.
Muito ativa, Fernanda nunca foi de fazer uma coisa só. Palavras como multifacetada e multimídia são comumente ligadas a ela, o que deixa claro o quanto a escritora era contemporânea. Essa característica aparecia e até mesmo definia a obra literária iniciada com Vergonha dos pés (1996) e que, extensa, ultrapassou os 10 títulos, entre os quais Tudo o que você não soube (2007) e A mão esquerda de vênus (2016). Temas como feminismo, globalização, relacionamentos ganhavam, na escrita de Fernanda, acidez e ironia.
Televisão
O humor corrosivo e corajoso de Fernanda logo ganhou as telas. Primeiro, como uma das colaboradoras de A comédia da vida privada (1995). Mas, ali, a série era baseada em outro autor (Luis Fernando Veríssimo) e Fernanda não pôde se mostrar por completo.
O telespectador conheceu e se apaixonou de vez por ela com Os normais, série escrita ao lado do marido, Alexandre Machado. Fernanda Torres e Luiz Fernando Guimarães davam vida a Vani e Rui, casal que nos divertia e nos levava à reflexão por meio de situações cotidianas. Foram três temporadas ; de 2001 a 2003 ; de muito sucesso. Tanto que deram origem a dois filmes, também roteirizados pela dupla.
Depois vieram outras comédias, a maioria com êxito e todas com a crítica social embutida. Entre elas, Os aspones (2004) fazia piada com o funcionalismo público, Macho Man (2011) brincava com o novo homem e com empoderamento feminino, e Vade retro (2017), que subvertia ao trazer Tony Ramos como o diabo. Em 2013, Fernanda e Alexandre foram indicados ao Emmy internacional pelo roteiro da comédia Como aproveitar o fim do ano. Recentemente, ela escreveu o seriado Shippados, estrelado por Tatá Werneck e Eduardo Sterblitch e disponibilizado no catálogo do Globo Play, serviço sob demanda da Globo.
Cara a tapa
Falar o que pensa nunca foi um problema para Fernanda Young, o que fazia com que o público, muitas vezes, tivesse a impressão de que estava diante de uma mulher amarga. Mas bastava prestar mais atenção ao sofá do Saia justa ; a escritora participou da formação inicial do programa, em 2002 e 2003, ao lado de Marisa Orth, Rita Lee e Mônica Waldvogel ; que estava ali o lado doce, tão destacado em depoimentos de amigos e colegas, ainda chocados com a repentina morte de Fernanda ontem.
Na mesma emissora, o GNT, Fernanda comandou talk shows provocadores e engraçados, como Irritando Fernanda Young, no qual ela brincava com a fama de mal-humorada ; Fernanda não era de se levar a sério ; e Confissões do apocalipse. As atrações foram ao ar entre 2006 e 2010 e em 2012, respectivamente.
Sem medo de se expor e com uma necessária análise crítica apresentada de uma forma sem ser chata ou massante, Fernanda vai fazer falta na televisão e na literatura. ;Sou uma mulher de 50 anos que sonhou alto e realizou muito. E estou longe de encerrar a minha jornada nessa orbe! Aos que se interessam: bom proveito. Para os outros: estou pouco me lixando!”, escreveu no sábado em uma rede social.
Repercussão
Colegas e amigos se despediram de Fernanda Young nas redes sociais
"Como eu fui privilegiado em dizer o texto de Fernanda em Vade Retro, seriado que me deu tantas alegrias. Ela era escritora primorosa e pessoa adorável;
Tony Ramos
;Era uma pessoa maravilhosa. Devo boa parte dos melhores anos da minha vida a ela. É uma perda muito grande para o mundo artístico. Vou sentir muita falta;
Luiz Fernando Guimarães
;Fernanda foi uma mulher importante para as artes e para a sociedade. Conseguia fazer rir e pensar com a mesma intensidade;
Fábio Porchat
;O que vai fazer mais falta é a mente inquieta. Ela olhava para tudo que estava acontecendo ao lado e colocava isso no trabalho dela;
Zeca Camargo
;Sua jornada está longe de terminar e vai continuar. Suas palavras são fortes;
Tatá Werneck
;Triste notícia recebi hoje com a morte precoce da Fernanda Young, essa menina talentosa, de humor ácido e de tantos trabalhos excepcionais como escritora, roteirista, atriz, apresentadora, entre outros. Descanse em paz!”
Walcyr Carrasco
;Chocado com essa notícia. Fernanda Young, escritora talentosa, polêmica, divertida, autora (com seu marido Alexandre Machado) da melhor série brasileira até hoje, Os Normais, entre outros trabalhos. Uma pessoa bacana a menos no Brasil.
Hélio de La Peña