Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Festival Dança em Trânsito ocupa espaços do Centro Cultural Banco do Brasil

Na programação, espetáculos de companhias nacionais e internacionais




Mais do que não limitar o fazer artístico a espaços comumente reservados à dança, o Dança em Trânsito 2019, XVII Festival Internacional de Dança Contemporânea, expande as potencialidades do corpo. O corpo em movimento, o corpo como narrativa e o corpo como comunicação. De amanhã até sábado, espetáculos e artistas do Brasil, além de companhias da Espanha e da França, se apresentam no teatro 1 e na área externa do Centro Cultural Banco do Brasil.

;O ser humano constrói narrativas o tempo inteiro. Só que a gente foca muito na linguagem falada e esquece que o corpo registra muitas linguagens, muitas emoções, muitas carcaças e capas. Na dança, mesmo que o trabalho não tenha uma narrativa, o corpo, quando conhece as potências que tem, constrói uma narrativa. Acho que é algo natural do humano, do artista, do artista da dança, do artista vivo. Faz parte do viver;, avalia a bailarina e sócia fundadora do Referência em Artes, Renata Versiani.

A partir da poesia de Manoel de Barros, ela e a coreógrafa Flávia Tápias apresentam um corpo intenso em O azul do céu me indetermina. ;Ele fala de várias bipolaridades. Percebo que fala do humano, principalmente nos tempos atuais. Como são arrebatadas por várias informações e questões, isso faz com que as pessoas fiquem mais dúbias;, explica Renata. Na narrativa coreográfica, os conflitos internos transformam-se em poesia. É imprecisa, fluida, aparentemente solta, mas que conta histórias em seu percurso. ;Algo revolucionário assim como o livro. Uma revolução interna. A partir de tudo o que você é, você se reconfigura, você dá novos nomes, novas relações. Desaprende para aprender outras coisas;, descreve a bailarina.

Um trabalho que afeta Renata tanto de forma empírica como poética que se traduz em dança. No palco, é apenas ela e as potencialidades de seu corpo. Apesar de a proposta lhe trazer o lado contemporâneo, a bailarina não abandona sua formação clássica, expressa em metodologia e sistematização. Durante sete anos, ela atuou como primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, onde dançou ao lado de nomes como Ana Botafogo. ;Isso tudo está intrínseco em mim, no meu ser, no meu corpo. Está presente em minha trajetória e preciso reconhecer o passado para abrir espaço para o futuro;, detalha.

Ao todo, são sete apresentações unidas, segundo a curadora Giselle Tápias, pelo ineditismo e, sobretudo pela resistência. ;De dança, de corpo e de tempo;, determina. Com propostas diferentes e criativas, cada espetáculo revela a virtualidade do movimento ; seja sozinho, em dupla, em conjunto ou em cima de uma bicicleta. ;A dança contemporânea é tão ampla. É liberdade de expressão, de conseguir falar, não tem regras, não é só o novo é liberdade de pensamento, de criação;, define Giselle.

Se o provérbio árabe alerta ;Só abra a boca se tiver certeza de que o que você vai dizer é mais bonito que o silêncio;, a Cie. À fleur de peau manifesta um hino ao silêncio repleto de significados. Fundada pela brasileira Denise Namura e pelo alemão Michael Bugdahn e instalada em Paris, a companhia traz para Brasília Un ange passe-passe ou entre les lignes il y a un monde, que significa ;passou um anjo ou nas entrelinhas tem um mundo;. Criado em 2002, para o duo, ele trata do tema do silêncio. ;Depois de muitos anos trabalhando com nosso grupo e para outras companhias internacionais, decidimos coreografar este verdadeiro hino ao silêncio, por meio de uma cascata de milhares de gestos sutis respeitando nosso estilo tão particular. Também é uma reflexão sobre a vida a dois;, adianta Denise.

Com uma dramaturgia teatral bem marcada e pitadas de humor e ironia, Denise e Bugdahn usam a dança para representar o que seria a estaca zero da comunicação. E, mesmo tendo sido criado há 17 anos, permanece atual:;Talvez não estejamos mais aproveitando da poesia que nos engloba e não vemos mais diante de tanto barulho e excesso de comunicação;, pontua o alemão. Para os bailarinos, é importante aprender a observar e escutar.

Ao abordar temas do cotidiano, os bailarinos estabelecem, quase de imediato, uma ligação e uma identificação com o público. ;A interação não será nunca física, mas emocional e por identificação. É uma dança menos abstrata e formal e mais narrativa. E o público participa inteiramente. É uma abordagem da dança tecnicamente muito elaborada, mas não demonstrativa;, conclui Bugdahn.

Com uma pulsação rítmica única, a composição do Dança em Trânsito 2019 foi pensada para presentear Brasília. Criado há cerca de 16 anos no Rio de Janeiro, o festival transita por diferentes cidades do país e também é levado para Paris compartilhando o palco com o público. ;A ideia é popularizar a dança, levá-la para onde o povo está. Dessa forma, contribuir para a formação de público e permitir que pessoas que não comprariam ingressos por falta de curiosidade tenham acesso à cultura;, comenta Giselle. Para cada localidade, a curadora faz uma programação específica. Este ano, o evento também percorreu cidades pequenas e palcos improváveis.



Serviço

Dança em Trânsito, Festival Internacional de Dança Contemporânea
Teatro e área externa do Centro Cultural Banco do Brasil. Programação até 7 de setembro. Verifique horários e preços dos espetáculos no site oficial do evento