Diversão e Arte

Tema em voga no momento, Amazônia influencia projetos literários

Pesquisador de literatura infantil, Volnei Canônica lança plataforma para agregar artistas em defesa da floresta. Em livro, lendas indígenas levam as crianças para conhecer os mitos e personagens de uma cultura pouco valorizada

Nahima Maciel
postado em 23/09/2019 06:00
Imagens do projeto Amazônia Chama, de Volnei Canônica, do Instituto de Leitura Quindim. Revista Bookbird, Roger Mello.Foi quando se deparou com as imagens da Amazônia em chamas que o pesquisador Volnei Canônica começou a sentir que precisava fazer algo de concreto. Sem conseguir dormir, preocupado e se sentindo impotente, ele comentou com o marido, o escritor e ilustrador Roger Mello, a necessidade de reagir à tragédia. Boa parte da produção de Mello tem a flora e a fauna como personagens e o próprio Canônica já esteve envolvido na promoção de encontros entre autores indígenas e jovens leitores.

Como presidente do Instituto Quindim, do qual Mello é vice-presidente, ele achou que estava na hora de convocar a classe dos autores e ilustradores para criar um projeto em prol da floresta. Um poema de Roseana Murray deu o empurrão que a dupla precisava. ;O poema inédito que chegou pra gente fala sobre essa questão do planeta e dos animais. Roseana ofereceu o poema para ver se a gente queria fazer alguma coisa, uma camiseta, qualquer coisa. Pensei: ;é isso, a gente tem que mobilizar os artistas do mundo todo em prol da Amazônia e dos povos originários, mas num processo de educação e valorização dessa biodiversidade;, explica Canônica. ;As queimadas não começaram hoje e não vão terminar amanhã. Então, acho que nossa função é essa. Trilhar no caminho que a gente sabe andar, como diz o Daniel Munduruku.;

[SAIBAMAIS]Assim nasceu a plataforma Amazônia Chama (https://amazonshouts.com/), no ar há três semanas para receber ilustrações e textos de autores do mundo inteiro que queiram se manifestar sobre a floresta brasileira mais famosa do planeta. Até agora, a plataforma conta com mais de 90 artistas engajados, gente espalhada pelo mundo, de Brasil e Argentina a Espanha e África do Sul. A ideia é que os artistas enviem obras que ficarão disponíveis on-line para serem baixadas por qualquer pessoa.

Assim, imagina Canônica, alguém lá no Acre poderá imprimir as ilustrações e fazer uma exposição sobre a Amazônia. Ou então, poderá levar os textos para a sala de aula para trabalhar com os alunos. É uma maneira de chamar a atenção, mas também de ensinar. ;Existe muita desinformação na sociedade como um todo sobre a Amazônia e o que está acontecendo. A gente tem esse papel de criticar, ampliar os olhares, mobilizar. Então eu disse ;vamos no viés da imagem e da palavra;;, conta. ;Pretendemos criar um grande acervo artístico e de informação sobre a Amazônia e isso vai ser disponibilizado, a gente vai tratar esse material e montar diferentes tipos de acervo.;

Na lista de colaboradores estão nomes como o da argentina Isol, do sul-africano Pite Grobler, do uruguaio Sebastián Santana Camargo, do espanhol Javier Zabala e da peruana Issa Watanabe, além dos brasileiros Daniel Kondo, André Neves, Daniel Munduruku e Eliane Potiguara. Entre escritores e poetas estão Roseana Murray, Natalia Borges Polesso e Walcyr Carrasco, que está escrevendo a novela A dona do pedaço e prometeu enviar um texto para o Amazônia chama. ;A gente quer uma mobilização da sociedade e os trabalhos podem ser foto, ilustração, conto, crônica, poema, histórias no sentido de valorizar a Amazônia. É uma ação que não é política nem partidária, a gente quer uma crítica ao Estado, não ao governo;, avisa Canônica.

Direto da fonte


Filhos de palmeiras, namoros entre o Sol e a Lua, encontros entre rios e florestas que geram rebentos, os mitos indígenas nascem de uma noção que o homem branco há muito perdeu: a visão cosmogônica da origem do Universo e da total integração entre o ser humano e seu meio. Com isso em mente, a leitura de Nós ; Uma antologia de literatura indígena se torna, também, uma viagem por um mundo povoado de mitos e figuras encantadas.

Organizado pelo ilustrador Mauricio Negro, que já havia coordenado a coleção Muiraquitãs (Global) com quatro volumes assinados por escritores indígenas, o livro reúne histórias de 10 etnias escritas por autores que bebem na fonte desde a infância. No total, Negro recebeu mais de 40 textos, uma amostragem ampla da literatura indígena produzida no Brasil, e contou com os editores para fazer uma seleção. O livro sai pela Companhia das Letrinhas, focada no público infantojuvenil. ;Não chega a ser infantil, embora algumas histórias a gente possa encarar como tal. Não que não exista história infantil para crianças indígenas, mas nossa intenção não era fazer uma divisão. Não teve uma linha norteadora, a não ser serem histórias de prosa. Literatura indígena não é um gênero, é um recorte;, avisa o ilustrador.

Mitos de origem de etnias específicas, como os kurâ-bakairi, dividem o livro com histórias mais pueris, como a narrativa guarani sobre o relacionamento entre uma anta e um jabuti, focada em costumes e convenções.

Dois outros livros recém-lançados têm a região da floresta como tema e cenário. Em História da Amazônia: do período pré-colombiano aos desafios do século 21 é resultado de uma pesquisa robusta de Marcio Souza, cujas narrativas, ficcionais ou não, sempre tiveram a região como tema. Autor de Mad Maria, o jornalista mergulha na história da para trazer um relato acessível e informativo sobre a Amazônia. Em Boa noite, Amazona, é a ficção que domina. O escritor paulista Manoel Herzog narra a trajetória de um personagem que resolve se isolar e escolhe, para isso, o estado mais ao norte do Brasil.

Nós ; Uma antologia de literatura indígena
Organização e ilustrações: Mauricio Negro. Companhia
das Letrinhas, 128 páginas. R$ 44,90.

História da Amazônia: do período pré-colombiano aos desafios do século 21
De Marcio Souza. Record, 392 páginas. R$ 54,90.

Boa noite, amazona
De Manoel Herzog. Alfaguara, 128 páginas. R$ 44,90.

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