Diversão e Arte

Distrito Federal ganha o Liceu de Artes e Ofícios em Taguatinga

Iniciativa é do artista plástico Anselmo Rodrigues, com curadoria de cursos de Wagner Hermusche

Severino Francisco
postado em 01/10/2019 06:15
Anselmo Rodrigues: Liceu de Artes e Ofícios é um presente para Brasília às vésperas do aniversário de 60 anos
Às vésperas das celebrações dos 60 anos, a capital modernista ganha o Liceu de Artes e Ofícios de Brasília, instalado em um galpão em Taguatinga. A iniciativa não é de nenhuma instituição oficial; é um sonho tornado realidade pela determinação do pintor e escultor Anselmo Rodrigues. A ideia inicial era criar um atelier coletivo com os artistas de Brasília. No entanto, em seguida, a proposta evoluiu para o projeto de um liceu de artes e ofícios, nos moldes dos que existem em São Paulo, em Salvador, em Belo Horizonte e no Recife.

A princípio, a instituição oferecerá cursos de desenho, pintura, escultura, estamparia e marcenaria artística. O movimento de concepção entre o sonho e a realidade foi simples. Anselmo devaneava com a utopia quando encontrou um galpão de 1.200 metros em Taguatinga que parecia ter sido projetado especialmente para o liceu.

Depois de alugar o prédio, iniciou as reformas, instalou equipamentos, decorou as paredes e fachadas com painéis de pinturas e esculturas. O ambiente ganhou ares de oficina de artes. Está dividido em três partes: desenho e pintura, marcenaria de artes e galeria para exposições: ;O que me parece importante é a possibilidade de os artistas compartilharem a sua experiência com a comunidade;, comenta Anselmo Rodrigues. ;Os professores são pessoas que têm 40 anos de estrada nas artes e essa é uma oportunidade preciosa. Muitas vezes, os artistas são mistificados. Com o liceu, eles podem dar a sua contribuição sem vínculo empregatício e isso facilita a colaboração e o trânsito dos artistas pela instituição. A receptividade deles foi muito positiva em relação ao projeto e ficamos motivados a organizar esse galpão;, acrescenta.

Anselmo trabalha com o conceito de amigos do liceu. Qualquer pessoa que estabelece algum vínculo com a instituição é recebido nesta condição. Ele aposta na capacidade de mobilização da arte: ;Ser amigo não é só para ajudar e ir embora;, enfatiza Anselmo. ;Quero que os alunos tenham muito orgulho de dizer: sou do Liceu. Não é uma escola comum. É para você aprender, conviver e festejar;.

O que o convívio com os artistas pode proporcionar ao iniciante? Aprender os atalhos da arte, responde Anselmo: ;Se você tem 30 ou 40 anos de estrada, pode ensinar muitas coisas simples que são fundamentais para a aprendizagem, com os jovens e com o pessoal da terceira idade. Isso acontece por meio da informação e do convívio. É algo precioso, que você não encontra nas escolas tradicionais. O mais bacana é que os artistas estão assimilando e abraçando a proposta;.

A curadoria das oficinas será coordenada pelo artista plástico Wagner Hermusche. Na fase inicial, o Liceu de Artes e Ofícios de Brasília terá os seguintes professores: Anselmo Rodrigues (escultura, pintura e xilogravura), Omar Franco (escultura em aço), Roberto Coelho (estamparia), Rosângela Carvalho (restauro): ;O liceu é um espaço de arte-educação;, comenta Anselmo. ;Estamos tentando atender a diversos segmentos, mas precisamos começar com os pés no chão. Se você quer fazer um móvel e não sabe como, venha para o liceu. Aqui, temos todos os equipamentos necessários. Temos sugestões para abrigar atividades de gastronomia, literatura e música. O espaço pode agregar muitas outras artes e ofícios, mas depende de como a gente vai conduzir essa história;, destaca.

Anselmo fez uma pesquisa sobre os liceus de artes e ofícios que existem pelo Brasil antes de tomar a decisão de criar o de Brasília. Ele constata que o de São Paulo é o mais ativo. Mas, na condição de capital, Brasília não poderia ficar sem uma instituição similar.

O Liceu está aberto para receber uma faixa ampla de público na vertente da arte-educação. É possível conquistar uma profissão ou reinventar a vida: ;Tem gente que passa a vida inteira em um emprego que não gosta;, pondera Anselmo. ;Ou tem gente que está ociosa. O Liceu oferece uma oportunidade de mudar de vida. A arte tem esse poder;.

Anselmo só trabalhava com desenho e pintura até 2003. No entanto, ele comprou uma fazenda em Tocantins, começou a conhecer as cavernas e estudou espeleologia. Com isso, iniciou uma produção de escultura: ;Quando eu entrava nas cavernas, descobria os reflexos e eles me inspiravam para a escultura. Sempre que entro em uma caverna eu faço uma peça. Você modela a cerâmica. Já a escultura está dentro da madeira. Você só tem de desvelar a figura. Fazer escultura é ver além da casa;.

Anselmo bancou inteiramente os investimentos iniciais para colocar o Liceu de Artes e Ofícios de Brasília no ar: ;Algumas pessoas dizem que fiz uma loucura;, explica Anselmo: ;Não é loucura, é um projeto de vida, de fé na arte. Até o momento,está dando certo;.
Mas a sustentabilidade econômica do projeto só se tornará viável com a participação dos amigos da instituição: os alunos, as pessoas físicas que quiserem fazer doações, as instituições e empresas que quiserem estabelecer convênios: ;Precisamos de material de trabalho. O Liceu está aberto a convênios e parcerias;.


Quatro perguntas / Wagner Hermusche, curador

Como pensa a criação do Liceu no contexto de Brasília?

A cidade ficou engessada, burocratizada, todo mundo pensa só em concurso, em repartição pública. E o Liceu está em Taguatinga. É um centro comercial rico, as pessoas não são funcionários públicos, mas têm lojas de autopeças, rede de padarias, classe média alta fortíssima. É gente que viaja e tem a cena underground fora do circuito. Ivaldo Cavalcante tem uma galeria underground que faz exposições importantes.


Qual será o público do Liceu?

Tem um público potencial enorme. Existem jovens que têm tendência para trabalhar com fundição em metais, escultura de madeira, de ferro, tapeçaria, estamparia. Aí, ele vai no Liceu e tem todo o equipamento. Tem um ambiente e profissionais para ensinar. Outro aspecto importante é ;faça você mesmo;. Se quero fazer uma mesa, vou ao Liceu e faço o objeto. No mundo inteiro, existe isso.


O que o Liceu poderá proporcionar a Brasília em termos de formação artística?

Tem muita gente que não está mais interessada em abstrações visuais. Mas, no Liceu, você pode aprender a desenhar uma figura humana, uma paisagem e uma árvore. A gente está falando de um lugar que dá possibilidade de uma pessoa ter suporte das artes tradicionais, a escultura, a estamparia. Hoje, as pessoas acham que podem resolver tudo no computador.


O pessoal do Plano Piloto também pode se beneficiar?

Uma pessoa que mora nas superquadras se matricula em curso de estamparia ou marcenaria. Vai a Taguatinga, passa um dia diferente, almoça em restaurante enorme, com comida boa e preços ótimos. Conhece uma cervejaria. Acho que isso é muito importante. Como curador, quero convidar outros professores, proporcionar o contato direto com os artistas de visões e métodos muito diferentes. Isso é muito rico na formação de um artista.

Parcerias

Quem se interessar em estabelecer convênios, parcerias ou ser amigo do Liceu, os telefones de contato são: 99999 7922 ou 397 3440.

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